EI, VOCÊS AÍ!… por Frutuoso Chaves

Imagem copiada do Youtube (episódio ‘O Natal do Capitão’, de ‘Os sobrinhos do Capitão’)

Muitíssimo mal explicado o caso da Mama Chucrutz com o Capitão. Calma, falo de outro e não deste agora prestes a sair do Palácio. Falo daquele muito mais velho porquanto nascido em 1897. Daquele que, além do mais, sentou praça na Marinha e não no Exército. Fez isso quando o nazifascismo não era sequer imaginado por quaisquer das mentes mais perversas deste mundão de Deus.

Caso mal explicado, sim. Senão, como justificar cuidados tão grandes de uma dona de pensão com seu hóspede, ao ponto do remendo das calças? Aquela senhora gorda somente se enfezava com o gotoso – não faltou o “s”, o moço sofria de gota – quando implicava este com seus dois anjinhos, duas criaturinhas puras e inocentes, pelo menos, aos seus olhos e sentidos maternais.

Falo aos das gerações dos gibis, em sua fase de ouro. Dirijo-me aos que se lembram dos “Sobrinhos do Capitão”, termo equivocado porque sobrinhos não eram. Trato dos dois pestinhas que infernizavam a existência daquele gordo de barba negra, marinheiro aposentado e, repito, gotoso, acometido dessa doença dolorosa que ataca as articulações.

Atiço a memória dos que se divertiam com as desventuras do Coronel, o inspetor escolar, o cara baixinho de barba branca e comprida sempre na cola dos dois moleques. Também, com a aversão dessa dupla infernal aos bons modos de Lilico, o guri certinho, bem arrumado, o preferido de Dona Josefina, a professora magrela. Afinal, ambos vieram ao mundo, no mesmo parto, para quebrar elos e amarras, para contrariar o controle sistêmico e o politicamente correto.

Nós, mais adentrados, formamos legiões de fãs dessas revistinhas compradas em todas as bancas instaladas em praças e calçadas de cada grande ou média cidade deste Brasil continental. Na verdade, compradas em quase todos os pontos do Ocidente. Por aqui, vendiam tanto quanto Zorro (não o de capa e espada, mas o cowboy mascarado, amigo do índio Tonto), Capitão Marvel, Fantasma, Batman e outros ícones dos quadrinhos.

Divertidíssimos, esses dois personagens nasceram da mente e dos traços do alemão Rudolph Dirks, naturalizado norte-americano. Esse camarada foi o primeiro desenhista a inscrever em balões os diálogos dos gibis. Fez isso, antes do término do Século 19, no suplemento domingueiro do New York Journal.

Fala-se de uma disputa judicial entre William Hearst (dono da empresa) e do criador que, depois disso, deixaria o jornal para imprimir seus desenhos com o selo da distribuidora United Features. Primeiramente, com o título “Katzenjammer Kids”, seguido de “Hans und Fritz” e, por fim, “The Captain and the Kids”. O mercado brasileiro dos gibis é que estabeleceu, indevidamente, o parentesco do velho marinheiro com os meninos.

Aos mais novos, esclareço que as histórias de Hans e Fritz se passavam em colônia alemã, numa ilha tropical. E que o sucesso de público fez com que a impressão não fosse interrompida mesmo no transcurso da Segunda Grande Guerra. Os dois pirralhos, maiores, então, do que o sentimento antigermânico, foram inspirados em “Max und Moritz”, criação, décadas antes, de Wilhelm Busch, poeta, pintor e caricaturista alemão que muitos têm, de fato, como precursor dos quadrinhos.

Leitura recente me deu conta de que, em 1938, “Os sobrinhos do Capitão” – vamos tratá-los assim – tornaram-se a primeira série animada produzida pela Metro-Goldwin-Mayer. Também, da pouca receptividade dos desenhos cancelados um ano em meio depois do lançamento, ao cabo de uns 15 filmes. Não importa, pois melhor do que nas telas era tê-los no bolso. Ou não era?