UM ENCONTRO NAS BAHAMAS, por José Mário Espínola

Médicos da turma de 1977 reunidos no Bahamas

E eis que Marinaldo voltou. Após passar cinco anos agitando a nossa turma à distância, finalmente ele chegou à cidade, trazendo consigo a sua habilidade de conciliar as opiniões irreconciliáveis.

Pois foi o que aconteceu. Em torno de si, alguns rapazes da nossa Turma Professor Genival Veloso – Médicos de 1977, voltaram a se reunir com a espontaneidade que sempre foi a nossa característica, nas priscas eras do curso médico.

Se não foram todos, alguns dos mais expressivos lá estiveram presentes. O encontro foi no Bar e Restaurante Bahamas. E foi como nos velhos tempos.

***

A princípio, houve um mal-entendido na escolha do local. Como fazia muito tempo que ele não nos dava as caras, nem na cidade, alguém, com a mente paralisada cinco décadas atrás, sugeriu que nós o levássemos para o cabaré.

Como estava organizando o Grande Encontro, fui até a Rua Maciel Pinheiro fazer uma reserva. Voltei de lá decepcionado: todos os cabarés foram extintos! Só faltou construírem lá um templo evangélico. Um daqueles bingões do Edir Macedo, como aquele da Epitácio Pessoa.

Só então me lembrei de uma célebre entrevista dada ao semanário A Carta, do falecido jornalista Josélio Gondim, dada por Hosana, também já falecida, a maior cafetina da cidade no passado e proprietária do melhor cabaré da Maciel Pinheiro.

Pois bem: Hosana atribuiu às alunas da Área 3 da UFPB, especialmente do curso de Arquitetura, como as grandes responsáveis pela extinção dos rendez-vous de João Pessoa.

Assim ela explicou: a maioria dessas alunas era de fora, boa parte do Rio de Janeiro, portanto muito evoluídas. Nos anos 70, elas passaram a prestigiar os poucos motéis da cidade, estimulando a geração de mais casas de hospedagem rápida. Em consequência, veio o declínio dos cabarés. Mas isso é outra história.

O fato é que tínhamos que levar o Grande Marina para algum lugar da cidade onde pudéssemos nos encontrar em torno dele. E foi ele quem decidiu.

Eu o havia chamado para jantarmos um nhoque de batata doce com carne de sol no Café São Braz do Manaíra Xópin. Mas xópin center é o que não falta em Brasília, e Marinaldo estava farto deles. Então, a seu pedido marquei o encontro na Sorveteria Friberg, pois ele queria praia, sentir o cheiro do mar! E para lá fomos cada um de nós.

Só que não dava para levar quatro horas de papo na base do sorvete. Então, atravessamos a avenida e fomos para o Bahamas, à beira-mar, onde pudemos comer do melhor camarão, regado a cervejas, uísque, coquetel com gin, água de coco e água com gás.

***

O papo não podia ter sido melhor. Juntamos nove dos piores, digo, nove dos melhores rapazes da Turma Genival Veloso de 1977.

Além de Marinaldo, Diá, Everaldo Belmont (êpa!), Lupicínio, Marcílio, Pedro Félix, Delfim e este cronista que vos fala, a grande surpresa foi a presença de Raldes, após tantas décadas longe da turma. Mas foi bem-vindo e teve uma boa participação.

Até Humberto Espínola, meu irmão, esteve presente, a pedido de Marinaldo, de quem é muito amigo desde quando Humberto morou em Brasília, onde jogavam futebol-de-botão.

Os assuntos variaram muito. Conversou-se de tudo, a maioria impublicável. OPS!: eu quis dizer publicável.

A alegria era geral. Relembramos os colegas, as colegas, os mestres, as melhores (e as piores!) histórias (Lupicínio estava com a memória afiada! Everaldo também).

Puxa, quantas histórias! E que histórias! Lembranças de figuras inesquecíveis, alguns que já se foram, como Marconi Popeiro, Fernando Ôinho, Chico C.A.

Senti muito a falta de Elias, que junto comigo descobriu, estudou e classificou a Raldose, uma dermatozoonose que atacou alguns colegas de nossa turma. É, portanto, coautor.

***

Algumas das melhores histórias de nossa turma tiveram Chico C.A. como protagonista. Duas vieram à baila no papo do Bahamas.
Uma explicação: Chico ganhou o apelido “C.A.” porque as suas hipóteses de diagnóstico eram sempre “câncer”. Até em Psiquiatria!

A primeira história. Chico C.A. comparecia às aulas, mas não assistia, pois ele não prestava atenção: só fazia copiar. A disciplina de Gastroenterologia foi dada no futuro auditório do Hospital Universitário, ainda em final de construção.

Foram juntadas duas turmas numa só: 77.1 e 77.2. Para evitar que algum aluno respondesse à chamada e fugisse da aula, os professores só faziam a chamada no fim, logo após a aula.

Nessa manhã, o professor José Eymard Medeiros deu todo o assunto; e logo que terminou ele iniciou a chamada. Pois Chico C.A. não percebeu o fim da matéria e copiou a chamada até o número 24, quando alguém lhe disse: “Pára, bicho! É chamada!”.

A outra foi numa aula de Neurologia. O professor José Alberto Gonçalves, figura muito séria, austera até, estava versando sobre Crise Convulsiva. E Chico copiando. Súbito, Zé Alberto interrompeu a aula para fazer um apelo aos futuros médicos, no sentido de desmistificar a Crise Convulsiva, pois muitos pacientes se agravam e complicam pela falta de socorro. Pois entre a população existe o falso medo de contaminação com a hipercialorréia, pois acham que “a baba pega”. E Chico copiando.

Feito o apelo, Zé Alberto perguntou para a turma: “Alguma pergunta?”
Chico parou de escrever e levantou a mão: “Professor, a baba pega?”.
Zé Alberto quase bate nele…

***

Foi esse o ambiente do nosso encontro, ao longo da noite. Cada um que contasse a sua história. Como aquela de Lupicínio, que chegou atrasado e perdeu a chamada da aula de Medicina Tropical. Ao final, pediu ao professor Mororó para tirar a falta dele. Mas este não tirou a falta. E justificou: “Se fosse a Velúsia ou a Maguy, perfumadinhas… Mas é o Lupicínio, suado, cheirando a gasolina de motocicleta…”

Essa foi APENAS uma das muitas histórias. Principalmente as de Belmont, que de tão verdadeiras, verdades afirmadas por ele com tanta veemência, que não podem ser publicadas.

***

Senti-me rejuvenescido, como se tivesse voltado aos anos 70, às noites de estudo na casa de Raldes, às tardes de farra ao final do período, quando depois da prova final nós nos reuníamos num bar para escolher a frase mais idiota do semestre.

Encontros assim só me fazem bem. Espero que Marinaldo volte mais vezes. Ou, melhor ainda, que não esperemos por Marinaldo, para nos encontrarmos outras vezes. E de preferência com as meninas presentes, pois elas não ficaram quietas ao longo do curso médico! Devem ter também as suas histórias. Talvez mais (im)publicáveis do que as nossas e, portanto, mais deliciosas!

Vamos pedir a Maria Clara que organize com Quintino, Marise e Walter outros encontros, tão inesquecíveis quanto a nossa festa dos 45 anos.

Que venham as meninas. Não consigo esconder a minha ansiedade por esses futuros encontros!