Defesa cita normas do CNJ que vedam expressamente acolhimento de denúncia anônima contra magistrados
No entendimento dos advogados da desembargadora Maria das Neves do Egito, covardia e ilegalidade são os principais elementos definidores do processo aberto em abril deste ano para verificar a invalidez e antecipar a aposentadoria da magistrada, caso fique comprovada a sua incapacidade de cumprir as atividades próprias do cargo no Tribunal de Justiça da Paraíba.
A menção aos ‘fundamentos’ do processo destaca-se na defesa apresentada no dia 12 de maio último ao desembargador Marcos Cavalcanti, presidente do TJPB. A covardia é atribuída à pessoa que denunciou anonimamente a desembargadora ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), relatando que há dois anos ela não trabalha e compareceu por apenas 50 dias ao Tribunal em todo o período. Tudo por conta de sucessivas férias e licenças médicas para tratamento de saúde que o próprio TJPB autorizou.
Quanto à pretensa ilegalidade do processo, essa decorreria do fato de a lei vedar expressamente à administração pública em geral e à Justiça em particular acolher acusações contra magistrados formuladas por alguém que se esconde no anonimato. O vício de origem estaria, portanto, caracterizado desde quando o CNJ recebeu e encaminhou ao TJPB, “para providências”, a carta anônima escrita “por um covarde travestido de advogado”.
De fato, tanto o Regimento Interno como a Resolução nº 103/2010 do CNJ proíbem terminantemente “o prosseguimento de denúncia anônima para qualquer fim”. A norma regimental determina que denúncias do tipo deverão ser arquivadas sumariamente pela Corregedoria Nacional de Justiça, quando as receber, enquanto a resolução mencionada pela defesa estabelece que os expedientes do gênero jamais serão admitidos pela Ouvidoria do órgão.
Outra resolução do CNJ (a de nº 135/2011) reza que magistrados podem ser denunciados por toda e qualquer pessoa, desde que a denúncia seja formulada por escrito, “com confirmação de autenticidade, a identificação e o endereço do denunciante”. No caso da Doutora Nevita, como também é conhecida a desembargadora, o denunciante identifica-se com o nome de Epitácio Pessoa, o paraibano que foi Presidente da República de 1919 e 1922.
Por atitudes como essa, os advogados da desembargadora resgatam em sua peça de defesa a lição do venerado Sobral Pinto, advogado de presos políticos durante a ditadura que se instalou no Brasil com o Golpe de 64. “Advocacia não é para covardes”, ensinava o mais célebre dos defensores de pessoas perseguidas pelo regime de exceção imposto por militares e civis que depuseram o presidente João Goulart. Doutora Nevita é defendida pela equipe do Escritório Coriolano Dias de Sá, de João Pessoa.
A defesa da desembargadora alerta ainda que as decisões tomadas por CNJ e TJPB no caso dela colocam em risco a segurança de todos os magistrados. “Ao continuar desta forma, com o envio ao Tribunal Pleno de cartas anônimas e seus pares assim procederem com as instaurações de processos em desfavor dos seus integrantes, flagrante são os riscos iminentes, além de grave repercussão, pois aviltará direito de todos, indistintamente”, advertem.
Por último, os advogados acentuam que em vez de tentar aposentar precocemente a desembargadora, o Tribunal deveria cumprir fielmente o que dispõe a Resolução nº 207/2015 do CNJ, que instituiu a Política de Atenção Integral à Saúde dos Magistrados e servidores do Poder Judiciário. Nos termos dessa Resolução, tal política deve se basear numa assistência que priorize “a prevenção, a detecção precoce, o tratamento de doenças e a reabilitação da saúde”.
“Será que não é um dever desta Corte, caso constatado que a defendente precisa ou não de tratamento de saúde, zelar pela sua recuperação, preservando sua saúde física e mental?”, questionam os advogados, afirmando ainda que o processo a que responde submete a desembargadora “a um vexame jamais visto”.
A SEGUIR
O repórter que assina esta matéria trará nessa quarta-feira (8) um resumo dos debates no Pleno do Tribunal de Justiça da Paraíba sobre a situação da desembargadora Maria das Neves do Egito. Com essa publicação, o leitor conhecerá com mais detalhes o outro lado da história, exposto nos argumentos dos desembargadores que defenderam a abertura do processo para verificar se Doutora Nevita tem ou não condições de voltar a exercer sua magistratura ou deve ser aposentada, mesmo contra a sua vontade.
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