UM BOM CAFÉ NO PONTO DE CEM RÉIS, por José Mário Espínola

Ponto de Cem Réis na primeira metade dos anos 1960 (Foto: acervo Mirabeau Dias)

Lendo a coluna do bem-afamado jornalista Sérgio Botelho, tomei conhecimento de que o 15 de abril é o Dia Mundial do Café. A tradicional e deliciosa bebida, de origem certamente árabe, porém encontrada no mundo inteiro, trouxe-me outras recordações. No meu caso, dos cafés do Ponto de Cem Réis (Praça Vidal de Negreiros), que no século passado era o centro vivo de João Pessoa.

Para quem viveu naqueles tempos e que como eu teve o prazer de frequentar aquele lugar mágico, sabe que aquela ao Ponto de Cem Réis afluíam tentáculos que se espalhavam pelas adjacências, como as ruas Duque de Caxias, Visconde de Pelotas e Padre Meira, além da Praça 1817.

Num tempo em que o centro de João Pessoa tinha vida pulsátil, a cidade vivia em torno dele. Era o centro nevrálgico, lugar onde era possível, até, fechar bons (ou maus) negócios. Para lá convergiam os habitantes da urbe (êita! Cá estou eu falando igual a um jornalista!), todas as tardes.

Pois é, todas as tardes, após as aulas, íamos nos encontrar no Ponto de Cem Réis: alunos do Liceu, do Lins de Vasconcelos, do Pio XII… Também acadêmicos de Medicina, Direito, Filosofia, Odontologia. Lá convivíamos pacificamente, reencontrando-nos nos cafés espalhados pela praça.

Ali também praticávamos atividades políticas contra a ditadura militar, na distribuição de panfletos ou em comícios relâmpagos de Washington Rocha, de Marcos Paiva ou do grande tribuno Mocidade!

Lá, no Café Alvear, no Café Santa Rosa e mais tarde no Café São Braz, sempre se ouvia uma boa notícia. Ou alguns boatos, geralmente oriundos do Palácio da Redenção, sede do Governo, ou da Assembleia Legislativa, que à época situava-se na Cidade Baixa, entre as praças Pedro Américo e Aristides Lobo.

Mesmo quem somente ia assistir a um filme no Cine Plaza ou no Rex, ao chegar ou ao sair passava por um desses cafés, para tomar um ou para saber “as novidades” e seguir caminho.

O Ponto de Cem Réis também tinha outras grandes atrações. Havia duas sorveterias: a Sorveteria Canadá, que segundo Petrônio Souto também servia um bom chope. Quando eu era menino, meu pai, Chico Espínola, nos levava para tomar sorvete de ameixa com creme de baunilha. Uau!

No lado da Rua Visconde de Pelotas havia a padaria de Seu Edson, pai do grande enxadrista Major, de saudosa memória. Vizinho à padaria, a uma farmácia, seguida do Cine Plaza, de uma loja, e do Edifício Ypiranga, onde ficava o ponto do ônibus do Roger e de Tambiá, que era o nosso bairro.

Ainda de acordo com Petrônio Souto, nesse edifício existia o Clube das Enfermeiras, que promovia todos os anos um animado baile de carnaval. Não é do meu tempo.

No térreo daquele prédio tinha o bar Escondidinho, assim chamado porque a porta de acesso ficava por trás do elevador.

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Ponto de Cem Réis e seus pavilhões em forma de rins (Foto: acervo Mirabeau Dias)

O Ponto de Cem Réis tinha em seu centro dois pavilhões em forma de rins. Num deles ficava a lanchonete e sorveteria do Seu Madruga. Na sorveteria do Seu Madruga serviam um excelente cachorro quente, acompanhado de soda, uma bebida gasosa filtrada na hora de servir. O outro pavilhão abrigava a maioria dos engraxates e dos sapateiros do centro e a banca de revistas do pai de Walter.

Em torno dos pavilhões ficava o Paraíba Hotel, com a Sorveteria Canadá, no térreo, e o Havaí Drinks, no mezanino. Na sua calçada havia uma excelente banca de jornal, de Reginaldo Cobrão. Vendia o Jornal do Brasil e o Jornal dos Sports, este de cor rósea, ambos do Rio de Janeiro.

Essa banca era um ponto de encontro de torcedores de times paraibanos, do Rio e, em menor número, de São Paulo, a quase totalidade formada por santistas. O debate entre os diversos torcedores provocava até brigas, vias de fato, mas Reginaldo intervia e acalmava os brigões.

No Ponto de Cem Réis existiam, também, duas padarias. A Padaria Fluminense, do pai de Dr. Marco Tadeu de Freitas Pereira e de Claudio Lévy, colega do meu irmão Silvino, ficava na calçada da Rua Duque de Caxias. E a Padaria Rosa de Ouro no lado do então prédio-sede do jornal Correio da Paraíba, onde, segundo Humberto Espínola, serviam pastéis de nata e deliciosas empadas com camarão.

Também orbitando o Ponto de Cem Réis, subindo a Rua Duque de Caxias à direita, na direção da sede do Clube Cabo Branco, encontrávamos a Casa dos Frios, do Seu Leodécio. O chope era gelado e o tira-gosto, ovos cozidos coloridos. Foi nela que eu tomei o meu primeiro porre, na excelente companhia dos amigos Fernando Furtado Filho, o Nino, e Idalvo Cavalcanti Toscano.

A Casa dos Frios ficava junto do primeiro endereço do Café Santa Rosa, vizinho à loja O Faqueiro, de Seu Ciro, pai de Ciro, Flávio Libânio, o Xaréu, que jogava xadrez muito bem. E de meu amigo Bosco, de quem tenho muita saudade.

Já subindo a rua Duque de Caxias à esquerda havia um bar chamado Porta Aberta. Acima dele, no primeiro andar, uma república de estudantes denominada Castelo, habitada pela turma da cidade de Misericórdia, hoje Itaporanga.

Ponto de Cem Réis (Foto: acervo de Mirabeau Dias)

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Não somente os que aqui habitam como também pessoas que vinham do interior tinham um certo fascínio pelo local.
Chegando à capital para resolver algum problema, por exemplo, na Secretaria das Finanças, para se consultar com Dr. Arnaldo Tavares ou Dr. Osório Abath, ou apenas para tratar de algum problema no Tribunal de Justiça. Qualquer que fosse o motivo, terminavam dando ao menos uma passada por lá.

Essas pessoas chegavam cedinho no ônibus da Viação Gaivota, desciam na Praça Pedro Américo e se dirigiam para o local de destino.

Invariavelmente, após ter resolvido o seu problema, essas pessoas demandavam algum restaurante do centro, onde almoçavam. À tarde, dirigiam-se para um dos cafés do Ponto de Cem Réis, para fazer um lanche, tomar um café e fazer hora até chegar o momento do retorno à cidade de origem.

***

Pois bem, esse foi o Ponto de Cem Réis que eu conheci e aprendi a amar. Para mim é muito triste ver a situação em que se encontra hoje, totalmente deformado, transformado numa laje fria e, assim como o seu entorno, semimorto. Tornou-se assim após a mudança das atividades vitais da cidade, do centro para a orla.

Já tive esperanças de revitalização do centro de João Pessoa. Hoje, não vejo mais retorno para o nosso ponto central. É a vida, a evolução…

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PURGANDO OS PECADOS NO SERTÃO, por Frutuoso Chaves

Transcorria julho de 1984 quando a leitura de um artigo do amigo Hélio Zenaide me fazia cair o queixo. Então Secretário de Comunicação da Prefeitura de João Pessoa, Helinho escrevera n’A União, o jornal pertencente ao Governo da Paraíba, sobre a visita de entidades extraterrenas a um grupo de moradores de Sousa, a mais de 470 quilômetros de João Pessoa.

Artigo do próprio punho, na página de opinião do Jornal, a fim de que não restasse dúvida quanto à história e sua autoria. Mesmo assim, liguei em busca da confirmação daquilo que eu acabava de ler.

Disse-lhe que pretendia encaminhar o assunto a’O Globo, do qual fui correspondente por toda a década de 1980. O homem me confirmou tudo, detalhadamente.

O jornal carioca divulgou a coisa na edição do dia 9 do mês aqui já referido. E o titulista me deixava mal com meu amigo. O cara assim grafou no topo da matéria publicada no primeiro caderno: “Richelieu, agora bancário, paga os pecados no Sertão”.

Sem fotos, naturalmente, de tal encontro, o Departamento de Arte d’O Globo completou o estrago. Alguém, ali, fez o desenho de um disco voador pousado na Caatinga e com a rampa baixada para o desembarque de Richelieu em cima de um jumento. Jornalista de longo batente, Hélio não rompeu comigo. Sabia que o título nem a ilustração eram coisas minhas. E sabia, é claro, dos riscos que corria ao dar publicidade ao assunto.

Dizia o texto que encaminhei à Sucursal recifense d’O Globo, onde foi recebido por Roberto Tavares, então encarregado da coleta e do repasse à Sede, no Rio, daquilo que produzia a rede regional de correspondentes:

JOÃO PESSOA – Contatos com naves interestelares e seres extraterrestres, revelações de que o Cardeal Richelieu, a eminência parda da França do Século 17 está vivendo no interior da Paraíba e a construção de um hospital fazem parte de uma espantosa história que envolve um grupo de pessoas, entre as quais figuras de expressão no Governo e meios empresariais do Estado.

A história é contada pelo Secretário de Comunicação da Prefeitura de João Pessoa, Hélio Zenaide, um dos integrantes do grupo e homem que também já foi Secretário de Educação, Finanças e Comunicação do Governo da Paraíba.

O hospital está sendo construído em Sousa, município do Alto Sertão, para reparar um mal causado à cidade francesa de Montpellier, em 17 de agosto de 1603, quando um exército de encapuzados, sob o comando do Cardeal, invadiu La Maison de Route (A Casa do Caminho), um albergue-hospital, destruindo-o e matando pastores protestantes e todos os enfermos.

Hélio Zenaide garante que foi o assassino de Charles de Montebrun, General dos Hunguenotes (exército protestante), fundador de La Maison de Route. Chamava-se, então, Vicent de Medard e era, ao que diz, “um fanático católico a serviço da Igreja de Roma”.

Richelieu, afirma Zenaide, está encarnado em um bancário que vive em Sousa. O grupo aumenta a cada dia à medida que outros “invasores de La Maison de Route” são identificados por Cleofas, um ser que, segundo o mesmo Zenaide, “habita Antares, uma estrela da Constelação de Escorpião” e que desembarcou, a 17 de agosto do ano passado, junto com Charles de Montbrun e outras vítimas do massacre de 1603 de uma nave espacial no local onde está sendo construído o hospital-albergue.

Visitei essa mesma edificação situada à margem da BR-230, entre Sousa e Aparecida, anos depois, já em pleno funcionamento, desta vez, para matéria destinada ao Jornal do Commercio, do Recife.

Eu e o fotógrafo fomos bem recebidos. Conversei com o pessoal da direção e com alguns internos – gente retirada das ruas e ali abrigada – todos solícitos. Mas, em nenhum momento, apesar da minha insistência, me revelaram a identidade atual do velho Richelieu. Perdi, sem dúvida, um bom papo. Outro fato a lastimar foi a notícia posterior de que “A Casa do Caminho” paraibana, que vivia de doações, passava por dificuldade financeira em razão da falta de apoio governamental.

Coisas ali percebidas ainda hoje me intrigam: o doce cumprimento de uma velhinha, seu olhar pacífico e penetrante a me acompanhar na conversa de varanda e, além disso, a presença intimidadora de um camarada alto e forte que tomei por segurança do lugar. Do meu pequeno grupo de interlocutores foram estes os únicos dos quais não me despedi porquanto não mais os via por perto. Êpa!

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TRÊS FACES DE UMA MESMA MOEDA, por José Mário Espínola

Avenida Epitácio Pessoa, de João Pessoa, decorada para o Natal 2023 (Foto: José Mário Espínola)

1 – CARA

Como que provando que o homem ainda é capaz de admirar o belo, passados alguns meses e ainda nos lembramos da beleza da decoração de João Pessoa no último Natal. Nesse ano, 2023, a Prefeitura realizou a talvez mais bonita decoração natalina de rua. Após dois anos muito fracos, eis que fomos surpreendidos por ruas, praças, a Lagoa e a praia engalanadas com luzes brilhantes e coloridas, formando figuras lindas.

A Lagoa Parque Solon de Lucena e a Praça da Independência estavam exuberantes, com luzes de cores variadas, com vários formatos. A fonte luminosa central da Lagoa nunca havia “trabalhado” tanto e tão bem! Na Avenida Epitácio Pessoa, os troncos e os galhos das árvores foram envolvidos por luzinhas brancas que lhe deram formatos diversos. A avenida parece ter sido invadida por gigantes luminosos nas mais variadas atitudes.

Mas as figuras mais notáveis tinham formas humanas. Lembravam figuras ciclópicas soltas pela avenida.
Pareciam pessoas em atitudes diferentes: dançando soltas; namorados abraçados num enlevo sensual; segurando uma criança ou erguendo uma bola. Quanta beleza! Inesquecível! Extasiante! Esperamos que a prefeitura volte a nos presentear da mesma forma, no próximo Natal.

Lagoa do Parque Solon de Lucena, em João Pessoa, no Natal 2023 (Imagem: YouTube)

2 – COROA

Começou assim…

Infelizmente, aprendemos também que não se pode apenas elogiar. Há mais de ano, o trânsito ao longo da Avenida Ruy Carneiro, já muito lento e atribulado nos horários de pico, vem sendo agravado por uma obra interminável no canteiro central da via. Que já era estreito, com ciclo-faixa nos seus dois lados, mas recoberto por bonitas pedras portuguesas pretas e brancas.

Sem nada que justifique, até o momento, eis que as pedrinhas vêm sendo arrancadas e substituídas por… Cimento! Enfeando ainda mais o que era apenas bonitinho. O canteiro está sendo reduzido em mais ou menos 20 centímetros de cada lado, para se transformar em um quase meio-fio. Enquanto isso, nas redes sociais dizem que a “obra” é para alargar a “ciclovia” (?), que vai do antigo Largo da Gameleira ao nada, pois é descontinuada, interrompida, quando a Ruy Carneiro encontra a Epitácio Pessoa. 

Pergunto: essa ‘obra’ vai beneficiar mesmo quem? O trânsito da cidade, naquela área, seguramente não é, pois só piora o que já era ruim. Com um agravante: se por um lado as ciclovias (quando de verdade) são necessárias para quem utiliza bicicleta na prática de exercícios ou para se deslocar e trabalhar, por outro são fartamente utilizadas por motoqueiros irresponsáveis.

… para acabar assim

Como se fosse pouco, a Prefeitura de João Pessoa piora ainda mais a situação ao derrubar árvores da mesma avenida Ruy Carneiro, sob o pretexto de que serão plantadas 60 outras, nativas. Lembrando: na avenida Fernando Luiz Henrique, no Jardim Oceania, foram também derrubadas outras tantas árvores, sem nenhuma explicação. Por que de repente a PMJP decidiu adotar esse comportamento floricida?

… o que antes era assim, com árvores no canteiro central

3 – COROA B

Livres de punibilidade, eles infernizam a nossa cidade. Além de circularem soltos pelas ciclovias, fazem manobras proibidas à esquerda, à direita, correm na contramão, sobem nas calçadas e por elas circulam livremente. Surgem súbita e rapidamente à direita dos carros, depois se enfiam por entre os veículos de forma perigosa. Meses atrás, quase fui atropelado na calçada do prédio do meu consultório por uma moto pilotada por um desses motoqueiros irresponsáveis, que circulam pelo trânsito como maus elementos, andam em manadas e quando provocam um acidente caem ameaçadoramente em cima do motorista do carro envolvido.

Por que eles agem assim? A resposta, muito simples, é essa mesmo que você está pensando: IMPUNIDADE! Eles sabem que nada lhes acontecerá, pois não existem oficiais de trânsito pelas ruas e esquinas da cidade que possam controlar o tráfego e MULTAR esses baderneiros do asfalto. Infelizmente, no nosso Brasil o mau cidadão só aprende pelo peso do prejuízo da multa no seu bolso. É o que está faltando à Prefeitura fazer. E ela já está muitíssimo atrasada para isso!

Os agentes da Semob em nossa cidade são como o Lombardi, do programa de Sílvio Santos: nós nunca os vemos. E só temos conhecimento de sua “presença” nas artérias da cidade quando recebemos uma multa por estacionamento feito inadvertidamente em local proibido.

***

Se por um lado as motocicletas popularizaram o transporte individual do brasileiro, sendo muito úteis para quem precisa trabalhar ou deslocar-se rápido, por outro geram prejuízos para a nação. Explico. As emergências de todo o Brasil estão repletas de acidentados e motocicletas. Isso eleva bastante o custo do atendimento de emergência em todo o país, com reflexos bastante negativos para o Ministério de Saúde, que tem que desviar recursos valiosos para pagar o atendimento de emergência. Assim como gera prejuízo para o INSS, que tem filas longas para conceder licença a esses acidentados.

Fico pensando como seria financiar toda a emergência do Brasil, acrescentando um imposto exclusivo para a aquisição de motocicletas, a ser pago na hora da compra? Seria algo como 2% pagos pelo fabricante; 2% pagos pelo vendedor; 2% pagos pelo comprador, num total de 6%, que seriam destinados exclusivamente para os serviços de urgência e emergência de todo o país. Acho que isso teria um bom reflexo, muito importante nas despesas do Ministério da Saúde e do INSS, financiando o atendimento de emergência. E, por que não, um bom reflexo sobre o trânsito de todo o país, quem sabe? A conferir.

  • José Mário Espínola, Médico e Cidadão
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AS ELITES NÃO PERDOAM, por Jesus Fonseca

Imagem enviada pelo autor para ilustrar seu artigo

Há momentos que me fazem voltar ao passado e relembrar coisas boas da infância. É o que acontece agora quando ouço loas, parlapatices para tudo que é lado. Lembro-me bem de uma historiazinha que gostava de ler naqueles livros que minha mãe costumava nos dar, a mim e a meus irmãos, para que não viéssemos a andar “soltos na rua” como ela costumava dizer. Um deles contava-me a estória de uma galinha que de posse de três espigas de milho resolvera fazer um bolo. Para tanto, seria necessário que o milho fosse debulhado, moído, peneirado e, posteriormente, misturado aos ingredientes necessários ao petisco desejado.

Assim, ela conclamou a patos, perus, porcos, marrecos, guinés, galos e demais galináceos presentes no terreiro, solicitando-lhes ajuda na feitura do bolo: quem quer debulhar o milho? Eu não quero, respondeu um! Eu, também, não, respondeu um outro! Nem eu, disse-lhe um terceiro! Ninguém se apresentou para a tarefa. A galinha debulhou o milho e de posse dos grãos fez outra solicitação; quem quer moer o milho? Idêntica negativa foi o que se ouviu. E assim a galinha fez todas as tarefas até deixar o bolo pronto. Então perguntou; quem quer comer do bolo? Eu, eu, eu, também, eu, e todos se acharam no direito de devorar a guloseima.

Início do ano da graça de 2003! O Brasil vai mal! Está quebrado, desacreditado perante a opinião internacional. Inflação beirando a casa dos 12%, taxa Selic atingindo os patamares de 25% ao ano, risco Brasil na casa de 2250, último no Mundo. O FMI ordenando como deverá ser a política financeira do País, com arrochos fiscais. Alguns jornalistas independentes e desassombrados escrevem que há espinhos na trilha do novo Presidente, principalmente, na área econômica.

O Dólar, moeda universal, está disparado, rumo às alturas, resultado de mais umas das facetas dos oito anos do governo FHC, ameaçando a estabilidade dos preços. É uma economia tão frágil que as crises se sucedem, bastando para isto haver algum “choque” em qualquer parte do mundo ou, mesmo, internamente, como especulação financeira, racionamento de energia, anúncios desastrosos de autoridades, não se sabe se proposital ou por incompetência etc., etc.

O defunto morreu! Alguém, por certo, irá se escandalizar com tal oração! É porque, muito antes, ele já era defunto para as classes oprimidas pela pobreza, pela miséria, mas bastante vivo para banqueiros, como os Cacciolas da vida. A dívida social deixada como herança faz o País bater o recorde de desemprego, com mais de 8 milhões de desempregados e dentro do contexto, a pior concentração de renda do Planeta Terra, deixando o “Gigante pela própria Natureza” ao lado dos países mais pobres da África, tipo Serra Leoa, Suazilândia.

E a Previdência Social? Vai muito mal, obrigado! Tem um rombo de mais de R$ 17,5 bilhões, com perspectiva de aumento, fruto da crescente informalidade. E os investidores, onde andam? Já fugiram da Suazilândia sul-americana, intitulada Brasil, é evidente! Sem investimento, a situação torna-se dramática para setores de suma importância ao crescimento da Nação, como é o caso do de Energia, cujas pendências regulatórias acanham o seu desenvolvimento e, consequentemente, o do País.

Como toda herança só é considerada grande quando há somas ou números maiores, Lula está herdando quantias extrapolantes de endividamento. O do Setor Público, sempre em escala crescente, alcança a bagatela de mais de 790 bilhões de Reais, o que equivale a mais de 59% do PIB, em torno 1,346 trilhões de Reais. Assim a “debacle” da Classe Média é evidente, que tem como lazer cortar despesas e criar novo estilo de vida. Da Classe Pobre, sequer se pode falar, pois o que consegue arranjar com “bicos”, mal dá para comer, já que a cesta básica nem com um salário se compra. Finalmente, lá mais para baixo, a classe surgida nos oito anos do governo FHC, a dos Miseráveis que, para sobreviver, parte para a violência já em ascensão pelo País, afora.

E os Títulos Públicos? Ora bolas, os números do Senhor Fernando não podem estar com cifras de milhões! A herança que deixará tem que ser fenomenal, senão não será herança! Então, para Lula, o primeiro trimestre de 2003 irá ser seu primeiro teste! Vence-se R$ 106 bilhões de Títulos Públicos. Alguém de mente mórbida deve ter pensado: “você ganhou o pleito, mas não vai poder governar!” – ou seja, se pagar os Títulos não poderá reduzir os juros em menos de um ano, aliás, terá que subir estes juros, o que por certo fará a desilusão do povo que o elegeu. Nunca vi um jargão popular tão bem aplicado na prática – “se correr o bicho pega se ficar o bicho come!”. Oba! Esqueci-me dos juros! A Taxa Selic é de 25% aa!

Quero frisar que estou usando o Presente do Indicativo, quando estou a escrever esta matéria, por me portar ao início da gestão Lula, no início de 2003. Pois bem, a situação econômica é tão caótica neste início de 2003, que setores da Mídia, vejam bem, setores da Mídia, tais como Bandeirantes, Revista Forbes, Jornal do Brasil tomam a iniciativa de juntar especialistas em diversas áreas para fazerem uma relação dos principais problemas que Lula irá enfrentar, inclusive, formular uma Agenda de Transformação do Brasil que, entre outras coisas, faça um plano para elevar o PIB do Brasil para patamares em torno de 1,6 trilhão de dólares, em 25 anos.

Antes de irmos ao Ano da Graça de 2007, segundo governo de Lula, lembro-me, agora, que no final do governo FHC, o “bendito” FMI, de saudosa memória para o PSDB & Cia., havia estabelecido uma meta do Superávit Primário de 3,75%, quando a “Nação Econômica” do País achava que deveria ser de, no mínimo, 5%. Mas contrariar o FMI, por quê? O aperto no Crédito tem que acontecer, senão o Setor Produtivo poderá crescer e aí, então, se fará presente a espiral de crescimento, com surgimento de empregos, mais renda, mais consumidores, mais renda, mais salários, mais empregos, etc. e ainda, nosso “amigo” Dólar caindo a patamares mais modestos.

Quatro anos se passaram! O Operário, o Barbudo, o Metalúrgico, o Analfabeto, o “Sem Dedo”, qualquer que seja o epíteto preconceituoso ou maldoso, mostrou como se deve governar um País! Os verdadeiros Cidadãos ganharam o direito de assim serem chamados. O Brasileiro que, até anos atrás, escondia-se de sua Cidadania, em outras plagas, no início do segundo mandato de Lula, já bradava sem susto, sem complexo, ter o orgulho de ser brasileiro!

Dou-me a liberdade de usar o Pleonasmo para reforço do que escrevo.

Tentaram, também, naqueles idos, fazer uma INTENTONA contra o Governo estabelecido. Não foi possível, porque o Povo inteligente não atendeu ecos desesperados, ainda mais pelas “vozes” dos NÚMEROS que teimavam, diuturnamente, em mostrar o vigoroso progresso do País. Apelaram, e ainda apelam, para sordidez, para mesquinhez, através da MÍDIA que, se aproveitando de algum sinistro ocorrido, como foi o caso da TAM, na época, queriam dar entender ao povo que o País estava um caos. Semana após semana, mês após mês, surgia na tela da TV, por trás do jornalista, o informe sobre os vôos com letras grandes – ATRASADO, ATRASADO, CANCELADO, ATRASADO, CANCELADO, numa espécie de lavagem cerebral, mas o cidadão entendeu, não como eles queriam, e, mais uma vez, lá se foi outra vil estratégia.

Aqui é onde cabe a analogia com a estória da Galinha e das Espigas, narrada no começo desta matéria. Na época, não podendo fugir das evidências de franco progresso do Brasil que se colocava no topo das Nações em desenvolvimento, inventavam o conto da carochinha, falando em alto e bom som que o crescimento do País não era mérito do Presidente que ali estava, pois começara com outros Presidentes.

Veja que mesquinhez! Sempre que se via publicada uma estatística de desenvolvimento, ela vinha sempre com os dados de 1999 a 2007, jamais de 2003 a 2007. Ora bolas, nos oito malfadados anos do Governo do PSDB foram criados 900 mil empregos, no Governo Lula, em cinco anos, 13 milhões. Se colocarmos estes números de crescimento de emprego, desde 1999 até 2007, obteremos uma média de 1, 450 milhão a cada ano, beneficiando uma média de um governo, que não passou de 110 mil empregos anuais. Por outro lado se a estatística for feita com base em 2003 e 2007, teremos uma média de 2,600 milhões empregos/ano.

Isto é apenas um dos exemplos que acontecia em vários setores. Tratava-se de mais uma estratégia para confundir a opinião pública. A Elite não perdoa e cobrava de seus seguidores a derrocada do Homem do Povo no Poder. Os principais partidos da época, PSDB, DEM e Cia. já não sabiam mais o que fazer, então apelavam para umas das estratégias acima.

Segundo alguns parlamentares, o Governo Lula adotava a mesma política econômica do Governo anterior! VERDADE? E que fosse! Então por que em oito anos o governo do PSDB, tendo no leme o Sr. FHC, foi um verdadeiro fiasco? Logo, se a política era a mesma, houve falta de inteligência ou má intenção. Certa vez ouvi uma justificativa. A Política Econômica do Governo passado demorou um pouco para aparecer porque o Governo FHC não teve a sorte do Governo LULA, de encontrar um cenário internacional tão favorável, em quatro anos de gestão!

Segundo eles, o Governo que passara enfrentou tempestades, as mais drásticas, como a crise na Rússia, a do México, dos Tigres Asiáticos etc. Quiçá tivessem razão! Naqueles tempos era suficiente Boris Yeltsin, Presidente da Rússia, tomar uma carraspana, aliás, ‘carraspodka’, e amanhecer de ressaca para derrubar a economia do Brasil. Se no México, o presidente Ernesto Zedillo colocasse um “sombrero” e cantasse “malagueña” sem afinação, a economia brasileira sofria uma crise, e por aí vai.

Entretanto, mesmo não sendo um “expert” em economia, ouso dizer sem susto que todas aquelas crises externas jamais atingiriam o Brasil se o Senhor Fernando Henrique não tivesse atrelado à Selic 49% de nossa dívida interna e os outros 51% ao Dólar, dolarizando a economia brasileira, deixando-a altamente vulnerável.

Isto foi considerado, na época, pelos doutos economistas, dois gatilhos de autodestruição, pois protagonizou fuga de capitais e, consequentemente, geração de uma ciranda de dependência de empréstimos junto ao FMI e diversos outros credores, fazendo a moeda americana entrar em franco crescimento e o risco País ir lá para as nuvens, apesar das reservas internacionais, pois tais reservas eram ilusórias, eram fictícias, eram de mentirinha, eram fruto de empréstimos, não tinham robustez.

Ademais, se Luis Inácio tinha sorte, o povo fez bem em escolhê-lo como Presidente, pois o País não necessita de gente azarada no seu leme. Entretanto esquecia-se, a Oposição (PDDB, DEM e Cia), que a Economia, tanto alardeada por todos, como a maior do Mundo, a Economia Estadunidense, na época, tremia em sua base, dando mostras de início de uma recessão e, apesar de todos estes solavancos, o Brasil tirou de “letra”, não houve nenhum abalo considerável que pudesse derrubar o avanço brasileiro no Setor, tanto que os investidores mundiais resolveram apostar no País, elevando-o como um dos Países mais sólidos do Planeta, em sua Economia, onde pudesse fazer seus investimentos.

O barril de petróleo ganhava as alturas, nos preços, quase que diariamente, mas, aquilo não abalava o País, o preço dos combustíveis estava estagnado, praticamente, em nosso Território, há anos, diferentemente do que ocorria na gestão do Senhor FHC.

Eram aqueles e outros números positivos que deixavam os agentes das elites desesperados. Não tendo meios para investir contra a robustez daquele Governo, procuravam situações mesquinhas no intuito de desqualificar o destemido governante. Em desespero total, a Mídia chamou os irmãos “tutti frutti”, os Caruso, Chico abacaxi e Paulo Goiabinha para fazerem “charges” pífias e bufas para achincalhar a imagem do Presidente. Não deu certo, o Povo mais uma vez deu prova de inteligência e de maturidade!

Assim, sabedores de mentes preconceituosas, convocavam-nas para através de seus blogs estamparem em suas telas as imagens, não só do Governante Máximo da Nação, mas também de seus dirigentes, de seus ministros, principalmente daqueles que mais se destacavam no cenário nacional, fazendo galhofa, críticas infundadas, distorções de fatos, tudo em nome de uma “imprensa livre e saudável”.

Todavia, continuo batendo na mesma tecla, o Povo é Inteligente. Ele já estava podendo fazer comparações do que via e sentia em relação a governos passados. Assim, os preconceituosos, os desesperados elitistas, sofriam as agruras daquele refrão usado pelos “emboladores” com seus ganzás enfeitados de pequenos espelhos, nas feiras do Interior deste lindo país: “Chora, Pirrita, pra teus “oi” correr loção, teu desespero vai enfartar teu coração”.

***

Escrevi este artigo porque vejo nos dias atuais a mesma cantilena que os setores elitistas, aproveitando-se de uma horda de fanáticos bolsonaristas, ignaros sob todos os aspectos, principalmente na política, destilam com uma ânsia sórdida de PODER.

Paulatinamente, usando de todo tipo de subterfúgio, queimando por baixo como fogo de monturo, o mundo elitista vai tentando salvar da derrocada final um indivíduo inescrupuloso, sórdido, ao tempo em que prepara a ascensão de outros indivíduos da espécie, tais como Nicolas Ferreira, Ratinho Júnior et caterva.

Cuidado! O jargão popular continua em evidência: ‘Cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém!’.

***

  • Título original do artigo: ‘A galinha, o bolo e a classe elitista’
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O DESABAFO DE UM MÉDICO

(Imagem: Biologianet)

Prezado Rubens,

O assunto que me move e me traz até você é a frágil saúde de crianças vulneráveis que não podem ser objeto de lucro de uma cooperativa de médicos. Quem vive ou sobrevive em João Pessoa e no resto da Paraíba sabe a que estou me referindo. Mas a mídia está silente e a classe médica, à qual pertenço, também. Envergonham-me.

Não tenho parente autista ou com paralisia cerebral, mas sinto a dor das mães e das crianças. Como médico, estou e devo estar sempre atento ao sofrimento alheio. É o que chamam de empatia. E não me importa, em absoluto, quem está certo ou errado nessa querela. Que, pelo visto, tem no dinheiro sua razão maior. Nesse terreno, no caso em apreço, a julgar por ações e reações de uma das partes em litígio, dela não cai um pingo de humanidade.

Quem tem o mínimo de compreensão das circunstâncias e sofrimentos que envolvem o problema deseja que todas as crianças vítimas dessa guerra sem sentido sejam atendidas com a melhor tecnologia disponível, atinjam o máximo da sua capacidade cognitiva e tenham um futuro não dependente de quem só objetiva lucros.

E a imprensa, hem? Também pelo visto, o jornalismo que tantos colegas seus dizem praticar não se pronunciou ou investigou. A classe médica e seus órgãos representativos, da mesma forma. Não o fazem, mas poderiam questionar – pelo menos refletir – sobre a função social de uma cooperativa médica. Lucros, lucros e lucros? E o lado humano?

Não me tornei médico para passar tamanha vergonha alheia. Peço, contudo, sigilo da fonte. Peço porque temo represálias. Inclusive por receber informações segundo as quais a cooperativa em causa estaria em situação pré-falimentar. Nessa conjuntura, se procedente, bate tanto o desespero como o corte de determinadas “despesas” por quem está à frente do empreendimento. E lá, quem já era capaz de tudo, é capaz de muito mais.

De qualquer modo, imagino: o mesmo temor que me oprime deve ser compartilhado por quem “anda falando de lado e olhando pro chão”, como dizem os versos de Chico Buarque. Pois é assim, desse jeito, que impera a omissão entre os temerosos. E nesse império do mal muitos sequer falam de lado, muito menos olham pro chão. Apenas fazem vista grossa. Por conivência, cumplicidade ou interesses outros que não dá para dizer aqui quais são.

Faça o que bem entender deste desabafo, meu caro. Sua atenção e leitura já me bastariam.

Fraternalmente,

Médico Indignado

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  • Nota do Editor
  • No Dia Mundial da Conscientização do Autismo, o Blog do Rubão recebeu a carta acima transcrita. Por óbvio e evidências, remete ao caso Unimed-JP versus Clínica Estima, também de João Pessoa, especializada em autismo, Síndrome de Down e outros “transtornos do neurodesenvolvimento”.
  • A clínica enfrenta um processo de descredenciamento da cooperativa médica, supostamente por não permitir auditoria que a Unimed realiza em sua rede assistencial. Com isso, cerca de 700 crianças teriam sido prejudicadas por descontinuidade de tratamento.
  • Na tarde desta terça-feira (2), A Unimed divulgou nota informando que a partir de 6 de maio a Estima será substituída por sete prestadoras “equivalentes”, com “capacidade de atendimento aumentada”, posto que terminaria somente no dia 5 do próximo mês o contrato com a Estima.
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Observatório Debate entrevista Laerte Cerqueira

(Foto: Jornal da Paraíba)

Editor-geral de Jornalismo da Rede Paraíba, Laerte Cerqueira (foto) será o entrevistado do Observatório Debate nesta quarta-feira (3). A entrevista dá sequência à série que o programa do Observatório Paraibano de Jornalismo (OPJor) iniciou semana passada com diretores de jornalismo das maiores empresas de comunicação da Paraíba.

Laerte Cerqueira estreou na profissão em 2004, na TV Correio. Quatro anos depois, foi contratado pela TV Cabo Branco, onde se encontra desde então. Antes de assumir a nova função, em 17 de fevereiro último, atuou como apresentador e editor da emissora de João Pessoa e repórter de rede da Globo, da qual a Cabo Branco é afiliada.

Colunista de Política da Rede Paraíba (inclui, além da Cabo Branco, a TV Paraíba de Campina Grande, a rádio CBN e o Jornal da Paraíba), Laerte é também Professor Doutor em Comunicação do Mestrado em Jornalismo da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).

A entrevista de Laerte Cerqueira ao programa Observatório Debate poderá ser assistida a partir das 17h desta quarta-feira (3) no canal do Observatório Paraibano de Jornalismo no YouTube.

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  • O Blog do Rubão é editado por Rubens Nóbrega, Observador Credenciado do OPJor
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JORNALISTA SE VÊ ALVO DE PATRULHAMENTO

Luís Tôrres, diretor de jornalismo do Sistema Arapuan, em entrevista ao Observatório Debate

Entrevista de ex-ministro da Saúde à TV Arapuan atacando a vacinação gerou Termo de Ajustamento de Conduta para o sistema do qual Luís Tôrres é diretor de Jornalismo

por Rubens Nóbrega, Observador Credenciado do OPJor (*)

Diretor de Jornalismo do Sistema Arapuan de Comunicação, o jornalista Luís Tôrres considera patrulhamento e criminalização do jornalismo ações ajuizadas contra veículos de comunicação que divulguem mentiras, deturpação de fatos ou acusações infundadas proferidas durante entrevista. O entrevistado deve ser responsabilizado, não o entrevistador, enfatizou.

Tôrres manifestou seu posicionamento nesta quarta-feira (27) no programa Observatório Debate, produzido pelo Observatório Paraibano de Jornalismo (OPJor) e transmitido pelo YouTube. Ele foi abordado sobre Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado recentemente entre o Sistema Arapuan e o Ministério Público Federal (MPF) para combater desinformação sobre vacinação contra a Covid-19.

Segundo o jornalista, o TAC baseou-se em tese jurídica, adotada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em novembro de 2023, que fixou critérios para responsabilizar empresas jornalísticas “por divulgação de acusações falsas”. Por maioria, o STF decidiu que tais empresas “têm o dever de verificar a veracidade dos fatos alegados e de esclarecer ao público que as acusações são sabidamente falsas”.

De acordo com o MPF, a desinformação que tentou desacreditar a imunização contra a Covid-19 foi gerada em 24 de janeiro deste ano durante entrevista do médico Marcelo Queiroga, ex-ministro da Saúde, à TV Arapuan. Além de criticar o governo federal por incluir crianças de seis meses a cinco anos entre os grupos prioritários para receber a vacina contra a doença, ele relacionou a vacinação a mortes.

“Podem existir óbitos com efeitos adversos da vacina”, afirmou Queiroga ao ser perguntado se “a vacina mata?”. Pergunta formulada por Luís Torres, que entrevistava o ex-ministro. Indagado ontem porque não questionou nem contestou tal afirmação, Tôrres disse que Queiroga “deu uma opinião (…) e, absurdamente ou não, ele tem o direito de dizer e ser responsabilizado pelas loucuras que diz”.

O jornalista comparou ao AI-5 (Ato Institucional nº 5 emitido pela ditadura militar quatro anos após o golpe de 1964) a iniciativa de quem denunciou o Sistema Arapuan por conta da entrevista de Queiroga. “Isso é coisa de 64, esse negócio aí, movido por quem moveu, é coisa de AI-5”, acentuou, referindo-se ao fato de que o TAC nasceu de uma provocação de terceiros e não por iniciativa própria do MPF.

Tôrres lamentou que o episódio e suas consequências não façam justiça ao “histórico de responsabilidade de informação da Arapuan”. Garantiu que o grupo de comunicação liderado pelo empresário João Gregório celebraria e cumpriria “50 mil acordos como aquele”. Mesmo considerando o equívoco de quem o provocou, reforçou, e mais ainda de quem denunciou o sistema à Procuradoria da República na Paraíba.

Formado em jornalismo pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Luís Tôrres ingressou na profissão em 2000. Editou a revista O Forte (Cabedelo), foi subeditor de Política do Jornal da Paraíba, comentarista de política da TV Cabo Branco (João Pessoa), coordenou os portais ClickPB e PB Agora e exerceu o cargo de secretário estadual de Comunicação de 2014 a 2019.

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  • (*) Observatório Paraibano de Jornalismo
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CIRCO, SANTOS E FEIJÃO NO COCO, por Frutuoso Chaves

Imagem: YouTube

Foi pequena a temporada do Circo Estrella del Mar, na cidadezinha. Não passou de uma semana, enquanto os outros, antes e depois dele, demoravam-se, ali, 15 ou mais dias, até a mudança para a praça seguinte.

A confusão em que seus artistas se meteram foi apenas uma das razões para a curta permanência. A outra foi a Semana Santa, tempo da reclusão de corpos e espíritos, dias de meditação e luto.

Também, de tudo com leite de coco: o peixe, o bredo verdinho e até o feijão nosso de cada dia. Das coisas assim temperadas por ordem expressa da minha mãe nem o dono da casa escapava. Mesmo ele que pretendia mandar em tudo com pulso de ferro.

Como eu detestava feijão no coco. E acredito, piamente, que assim estava em numerosa companhia. Não conheci menino da minha idade que disso gostasse. A não ser os bem pobrezinhos, aqueles que pediam um jejum para as mães jejuarem. Não estariam a pedir o contrário: um desjejum para a mãe, ou quem quer que mais fosse?

Pedido de perdão tem prazo validade? Espero que não tenha, pois, sinceramente, eu também não gostava da Semana Santa. Daqueles dias intermináveis de reflexão e reza, dos santos todos cobertos e da alimentação frugal, sem carnes, até o momento do exagero de peixes, favas e feijões, tudo com o bendito coco.

De circo, naqueles meus 14 anos, eu gostava. O Estrella del Mar – assim mesmo, metido a besta, espanholado – chegou sem aviso. A indicação do terreno deu trabalho à Prefeitura. O padre não queria aquilo perto da Via Sacra. O ponto então escolhido foi o Compra-Fiado, topônimo inspirado na penúria dos moradores. O lugar abrigou, direitinho, o tablado, a arena, o pano de roda, as tendas e tralhas da trupe.

Fugi duas vezes para ver o espetáculo e, já na primeira, caí de quatro pela contorcionista, um elástico em pessoa. Que vergonha quando o número terminou e aquela pequena deusa subiu ao poleiro (os degraus que nos estádios de futebol abrigam os geraldinos, a turma sem grana) e pôs uma fita perfumada no meu ombro, providência destinada a arrecadar um dinheirinho além da quantia mixuruca rateada pela bilheteria. Até Paulo Barbosa, duas fileiras abaixo, costumeiramente mais liso do que eu, contribuiu, fita no ombro, com a bolsa da menina. E eu, ali, sem um níquel.

O desejo da reparação foi o que me fez voltar ao circo onde tudo se repetia: o palhaço com as mesmas piadas, os acrobatas com as mesmas piruetas e a pirralha com aquela fita cheirosa. A diferença, acho eu, foi a cédula a ela entregue, desta vez, com o valor e o tamanho do meu encantamento. Demorasse mais por ali o Estrella del Mar, a padaria do meu pai teria falido mais cedo.

Minto. Havia outra coisa também diferente naquela noite: a segunda parte do espetáculo reservada ao teatro, se é que as falas recitadas e a má postura dos atores mereciam o termo. O tema escolhido, em homenagem à ocasião, era A Paixão de Cristo.

Mesmo inocente acerca de muitas coisas da vida, em razão da pouca idade, comecei a desconfiar do empurrão forte de um soldado romano num dos apóstolos. Não era em Cristo que ele deveria bater? A barba espessa na cara de surpresa do homem assim agredido não me era de todo estranha. Eu a conhecia da cena anterior quando na cara de Judas e, antes disso, na do mestre de cerimônia.

Não demorou muito para o distinto público, ao cabo do terceiro intervalo, se horrorizar com a perseguição ao barbudo por alguém de túnica levantada e faca na mão. O perseguido fugiu pelo picadeiro, a rota mais curta.

Escapou do inimigo, mas não do delegado Fonseca que deu ordem de prisão à trupe inteira. Eu soube, depois, que a bebida corria solta nos bastidores reavivando a inimizade entre aqueles dois. A encrenca tinha começado em Itabaiana, a praça anterior, por causa do desrespeito ao décimo mandamento.

Definitivamente, os homens não aprendem. É lição que advém dos tempos bíblicos, mas nunca aprendida. Os machos, em todas as eras, não atinam para o fato de que não se deve juntar mulher e cachaça, se um estiver de olho apenas na bebida e, o outro, também, no tira-gosto.

De todo modo, acho que os dois inimigos se reconciliaram depois de uma noite na cadeia, porquanto partiram juntos e em paz, três dias depois do acontecimento.

Quanto a mim, observo que certas coisas deixam marcas permanentes. Ponham-me, ainda hoje, frente a apresentações da tevê com essas divindades olímpicas que pairam no ar e assombram o mundo com seus rodopios e logo me vem à mente a garota do Circo Estrella del Mar. Mesmo que eu nunca mais tenha sabido dela.

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