Eu vou desdizer
Aquilo tudo que eu lhe disse antes
Eu prefiro ser
Essa metamorfose ambulante
(Raul Seixas: ‘Metamorfose ambulante’)
Era uma vez um grande reino dos bichos, bonito por natureza, mas que beleza, que em fevereiro tinha carnaval.
Vinha sendo governado pela Rainha Anta, que tinha o maquiavélico Conde Babuíno como vice. Muito inexperiente, arrogante e centralizadora, cercada de gente incompetente, a Rainha Anta desfez quase todo o progresso acumulado pelas coroas anteriores do Macaco Velho e do Sapo Barbudo, tornando-se insustentável.
Após o desastre, a bicharada, açulada pelos rádios, jornais, revistas e TVs, fez um movimento caçarolável tão alto que deu força e gás para Conde Babuíno juntar os deles, e derrubaram a Rainha Anta, não pela incompetência, mas alegando motivos fúteis. Não sem uma ampla conivência…
Assim que assumiu, Rei Babuíno convocou a sua grei. Escolheu a dedo. Eram bichos de destaque, conhecidíssimos desde priscas eras, de notório “saber” sobre as coisas do reino. E quase todos “bichados”.
Entre os bichos mais poderosos da época, destacava-se o Marquês Hiena, feiticeiro e chefe da representação dos bichos. Talvez por algum distúrbio digestivo, ele passava o tempo todo arrotando poder.
O poder moderador, à época, era composto principalmente pelos tamanduás, os Guardiões da Lei. Assumiu a Chefia-Geral dos tamanduás uma vistosa Borboleta, que surgiu de operosa lagarta que foi promovida a crisálida e finalmente a Borboleta.
Chamava a atenção pela firmeza de princípios, a veemência com que defendia a Carta Magna e os aplicadores da Lei. Dizendo logo para o que veio, ela enfrentou aqueles que costumavam afrontar os mais simples, tornando-se a esperança da bicharada por dias mais justos.
Eis que surgiram alguns alcaguetes do MP, que falaram muito mal do Marquês Hiena, do Rei Babuíno e de alguns outros bichos com alcunhas esquisitas, lembrando até crônica policial: Angorá, Mulher-Feia, Cajú, Polo, Boca Mole, Babel, Mineirinho, Decrépito, Todo-Feio, Primo, Caranguejo, Piqui. E por aí vai…
Encurralado pelos tamanduás, e apoiado pelos bichos esquisitos, Marquês Hiena resolveu desafiar todo mundo: Rei Babuíno e Borboleta com sua Alta Corte dos Tamanduás. Com uma história de Trancoso de desestabilidade, seduziu o Rei Babuíno e, pasmem, a vistosa Borboleta e sua corte.
O malvado Marquês Hiena lançou, então, um feitiço sobre a Alta Corte dos tamanduás, paralisando até os mais velhos, roubando-lhes a decência. E alcançou o que mais queria: tornou-se o bicho mais poderoso do reino.
E a bela Borboleta, para tristeza geral da bicharada, sofreu o feitiço da metamorfose reversa: rapidamente regrediu a crisálida, e daí voltou a ser uma simples e pouco atraente lagarta comum.
Concretizou, assim, a sina de Raul Seixas. Parodiando o título da peça de Fernando Mello: Carminha, quem diria, foi parar no Maceió.
José Mário Espínola – Cidadão indignado
- A presente obra é produto da imaginação. Qualquer semelhança é mera coincidência.
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Uma resposta para Meta-metamorfose, por José Mário Espínola
Muito bom, Dr. José Mário! Bem bolado e inteligente. Gostei das metáforas sugestivas. Parabéns, um abraço, Neuza Spínola.