Às quintas-feiras, Candinha visitava o túmulo de sua mãe. Saía do trabalho, à tardinha, passava na floricultura e seguia para o bairro Varadouro, na Cidade Baixa do Centro Histórico de João Pessoa. Um ritual inalterado, invariável, impostergável.
“O cemitério é um lugar resguardado pelas almas, o perigo está nos vivos que ali rodeiam”, dizia, repetindo sem temor algum as palavras da mãe. Tinha o hábito de rezar e florear o jazigo em todo o seu entorno. Para sua surpresa, em uma determinada visita, viu o túmulo violado, em parte.
Tomou a iniciativa de fazer a reclamação ao administrador. Prontamente foi atendida, mas Jarbas, o funcionário designado para inspecionar com ela as avarias, desde logo fez cara de poucos amigos e até o túmulo arrastou os pés sem pressa alguma de chegar e constatar necessidade de reparos.
No percurso, o jeito de Jarbas intimidou Candinha, inclusive porque o dia já estava se despedindo e a escuridão começava a dar sinais. Em dado momento, quando já era visível o temor da mulher, o funcionário perguntou se ela estava com medo e sugeriu que ela se achegasse a ele.
Confusão mental instalada, Candinha perguntou a si mesma: “Por que danado tenho que vasculhar um buraco no escuro?” E começou a pensar em uma maneira de se livrar da situação, mas observou ao largo do ambiente e percebeu que seria inútil pedir socorro.
Lembrou, instantaneamente, das advertências de sua mãe. “Naquele lugar, o perigo está nos vivos”. E foi tomada por essa lógica que Candinha correu na direção da saída do cemitério, faltando poucos minutos para o fechamento. Correu mesmo, embora duvidasse da capacidade de seus músculos e o coração, batendo forte, suportarem a corrida.
Depois daquele episódio, Candinha passou muito tempo em desassossego, tendo pesadelos com Jarbas, que reencontraria dias depois numa peixaria, ele com um facão em mãos cortando peixe. Não pensou duas vezes. Acionou novamente o “pernas, pra que te quero?”, inclusive esquecendo sobre o balcão o quilo de garoupa em posta que comprou, pagou e não levou.
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