PAPEL COLOMY, por Frutuoso Chaves

Imagem meramente ilustrativa copiada de jornaldenegócios.pt

Os mais adentrados lembram, certamente, de uma das antigas brincadeiras infantis mais requeridas: aquela feita com maços de cigarros vazios e abertos, cuidadosamente, a fim de serem usados como se fossem dinheiro.

Jogava-se fora o papel de alumínio e o transparente. Em seguida, desmanchava-se o maço, pouco a pouco, pelas bordas coladas, estirando-o no sentido do comprimento. Depois, bastava dobrar as laterais sobre a face interna, em cima de cada vinco. Pronto, estava feito o “dinheiro”.

Naqueles idos de 1960, por aí assim, o valor das “cédulas” dependia do custo de cada marca então vendida, no mundo real, aos fumantes. Minister, Cônsul, Hollywood e Continental, decrescentemente, superavam em valor as notas de Astória, Gaivota e Clássico, por exemplo.

A brincadeira era uma espécie de ensaio para a vida adulta. Podia, assim, aguçar a ostentação e a ganância. Eu, particularmente, nunca fui tão rico e perdulário. Gastava à toa. Também, pudera, detinha minha própria Casa da Moeda: os maços sobrados da venda a granel de cigarros no bar que meu pai havia agregado à nossa padaria. Bem aquinhoado, não fazia questão de perder muito nos jogos de botão, bozó, ou na bola de gude. Ainda bem que, no meu caso, a vida não imitou as artes de menino. Não fiquei rico, mas, em compensação, não me viciei em jogo nenhum.

Muito novo, não tinha idade para fumar nem adquiri o hábito mais tarde. Sempre detestei o cigarro, fosse qual fosse a marca, embora os estímulos não faltassem. Nem os internos (o velho Juca acordava às 5 da manhã já com um cigarro no bico), nem os externos (caubóis, atletas e gente bem-sucedida). Ainda não se fazia uso do termo, mas fumar, àquela época, era algo politicamente correto, para honra e glória da Sousa Cruz. E se ele, ou ela, adotasse piteira, expunha-se ao olhar do mundo como símbolo de grande elegância e distinção.

Eu e minhas manias de Jeca… O que ainda me despertava algum interesse neste quesito era o cigarro feito à mão. Os fregueses mais pobres compravam os ingredientes em separado: um pedaço de fumo de rolo preto como a consciência de Judas e o papel Colomy, na bodega de Seu Raimundo. Com uma faquinha amolada picavam um pouquinho e já enrolavam aquele tico numa folhinha do papel, com as mãos no ar, sem apoio algum. Depois, passavam a língua na borda solta e o cuspe segurava tudo. Coisa de mágicos. “É para espantar mosquito”, diziam alguns. Mosquito e, também, a mim, que dava por encerrada a minha contemplação. Quando um isqueiro a gasolina feito com ampola de lança-perfume ali punha fogo aquilo fedia como os mil e seiscentos diabos.

Eis, porém, que isso tudo agora me vem à mente com o sentimento das grandes perdas. Um desejo desmedido da volta ao passado, aos cuidados paternos e à vida sem preocupações acaba de abrandar a crítica que eu pretendia fazer a todos os fumantes.

Mas, não menos, aos adeptos dos ditos “cigarros eletrônicos”, um modismo duramente criticado, fora e dentro do campo médico, em razão dos riscos para a saúde dos usuários e circunstantes, neste último caso, injustamente, porquanto não merecemos a fumaça que nos vem aos pulmões. De resto, percebo como a velhice é espantosa. Como é que pode fazer a gente sentir saudade do papel Colomy?

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