O BEM QUE UMA BOA CAUSA FAZ, por José Mário Espínola

Há pouco mais de quatro anos, findas as eleições de 2018 no Brasil, foi eleito um novo presidente. Não foi o que eu gostaria, foi exatamente quem eu achava que não serviria para melhorar o nosso país. Mas foi eleito democraticamente, pelo voto.

Assim, paciência, só me restava fazer como recomenda Dr. Genival Veloso, na sua sabedoria: “Terminou o campeonato, nós perdemos. Agora, é enrolar a bandeira e esperar o próximo campeonato.” E foi o que fiz.

Eu achava que ele não tinha competência para administrar o país. Mas, como bom democrata, torci para que fizesse um bom governo, que montasse uma boa equipe, predominando técnicos, e que respeitasse a opinião de seus ministros. Mas não foi o que aconteceu. O episódio da demissão do primeiro ministro da Saúde exemplifica bem esse defeito do então presidente: demitiu Mandetta POR CIÚMES!

Já no primeiro dia, ainda não havia tomado posse, o dito cidadão começou a criar confusão. Todos os dias ele arranjava uma briga. E mentia e espalhava o ódio, contra tudo e contra todos. E como ele mentia! Dizia uma mentira de manhã. À tarde, desmentia com outras duas. E foi assim todo o seu governo: de tapas e mentiras. Todo não: os últimos dois meses ele não disse nada e parou de trabalhar (?). Ficou mudo e depois fugiu para a Disneylândia.

Mas, a partir do momento em que constatei que ele era muito pior do que eu pensava, que o mal que poderia fazer ao país poderia ter efeitos catastróficos, resolvi assumir uma boa causa: resistir! E passei a procurar mostrar, de todos os meios ao meu alcance, quem era essa figura sinistra e seus comparsas, e os riscos que trazia para o Brasil. A resistência pacífica, porém aberta, transparente, era o que estava ao meu alcance fazer. E comecei a escrever, artigos e crônicas.

Assunto não faltava: todos os dias o meu “muso” inspirador, seus filhos e seguidores geravam um fato. Nunca me senti tão bem! De repente passei a ficar animado para responder aos atos e fatos que me causavam indignação, e que me traziam muita inspiração. Eu acho que na base do cérebro de todo cronista tem uma glândula que é estimulada por indignação. Ela é mais desenvolvida ou menos desenvolvida de acordo com a capacidade de a gente se indignar.

Também acho que todo cronista precisa de um tirano que o estimule a escrever. É tanto que fiquei preocupado com a derrota desse cidadão: temia que a sua saída de cena pudesse me causar depressão.
Qual o quê! O rescaldo que está sendo feito nas ruínas administrativas do Brasil  mostra o estrago que as ações do ex e de seus comandados causaram ao nosso país em todas as áreas: saúde, educação, econômica, social, científica, ambiental… São motivos para mais de mil crônicas indignadas.

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Pois bem, como disse antes, a boa causa que assumi (combater o fascismo que estava se instalando no Brasil), me trouxe o benefício do rejuvenescimento. Explico. De repente, voltei a ser aquele rapaz dos tempos do Liceu Paraibano, de 1968, que lutava por uma boa causa: resistência à ditadura militar.

Participar de assembléias proibidas, geralmente convocadas por Washington Rocha. Rodar e espalhar panfletos (ainda sinto o cheiro do mimeógrafo!). Ir a reuniões clandestinas para ouvir discos proibidos, escondidos num quarto na casa de Karlow Neves de França (por exemplo: Arena Canta Zumbi). Preparar coquetel molotov escondido na casa de Mônica Moraes Pessoa e fugir disparado quando o irmão dela, meu colega de ginásio João Alberto, chegou vestido de soldado (era recruta) e eu não reconheci. Só vi na minha frente um soldado. Que susto!

Mais: nas passeatas, portando faixas pintadas por Flávio Tavares, depois enfrentaria a polícia com pedras, lá no Ponto de Cem Réis, para depois descer correndo em direção à Lagoa, com um soldado logo atrás e mim e de Silvino, meu irmão. O meganha empunhava um cassetete maior do que eu.

Ocupar a FAFI por três dias e ser expulso de lá por agentes da Polícia Federal armados de metralhadoras, após assistir Everaldo Júnior fazer um discurso violento e corajoso contra a ditadura, cara-a-cara com Emílio Romano, o Diretor da PF no Estado, que tinha fama de torturador. Eletrizante!

Ocupar o Restaurante Universitário, que funcionava no Cassino da Lagoa, até sermos expulsos de lá pela Polícia Militar, que quebrou tudo, inclusive a radiola, no momento em que tocava o Hino da Independência.

Todas essas lembranças vieram à tona enquanto escrevia. Preparando os artigos, não conseguia deixar de “ouvir”, na mente, músicas como Apesar de Você, Um Novo Tempo, Caminhando, Desesperar, Jamais. Estimulantes.

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Em princípio, a partir de 2019 instalou-se um clima de medo na sociedade. As pessoas temiam repressão, perseguição, difamação palas infames redes sociais, verdadeiros esgotos que espalhavam notícias falsas contra quem se opunha a eles. Do meio pro fim, ninguém aguentava mais. Foi quando entraram em cena grandes nomes da cultura, da música, imprensa, literatura, cinema. Figuras como Ruy Castro, Caetano Veloso, Reinaldo Azevedo, Marisa Monte, Gilberto Gil, Chico Buarque, Vera Magalhães, que injetaram coragem na população, mostrando que não estávamos sozinhos, dando força para resistir e reagir. Aí eles não conseguiram mais nos segurar, e as grades foram arrombadas e o clima de democracia voltou a dominar o Brasil.

Ah, que tempos, esses quatro anos! Pois toda essa energia retornou para mim, estimulado pelo combate ao clima de fascismo que tentou se espalhar por todo o país a partir de 2019, provando que uma boa causa traz benefícios ao corpo e à mente. E me sinto, assim, novo de novo.

Um grande exemplo disso é o meu professor de cardiologia no Hospital Português de Recife, Dr. Edgar Victor. Ao assumir a nossa causa, ele remoçou. Fez melhor do que Juscelino Kubitschek de Oliveira, que prometeu desenvolver o Brasil 50 anos em cinco. Edgar Victor rejuvenesceu 50 anos em quatro! Está aí novinho, vibrando com a salvação da democracia.

Hoje, o clima é de muita alegria, as pessoas voltaram a cantarolar, falar umas com as outras, vizinho dar boa tarde ao vizinho, irmãos fazendo as pazes. O Brasil está, realmente, mais leve. São realmente grandes, enormes, os benefícios de uma boa causa.

É BOM ESCLARECER
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Uma resposta para O BEM QUE UMA BOA CAUSA FAZ, por José Mário Espínola

  1. Marco Santos escreveu:

    Conheci o Doutor Espinola recentemente, voltando do autoexílio em Portugal para um Brasil que não conhecera antes, neste Nordeste que tanto me está fazendo bem. Agora, que maravilha, estou conhecendo o Cidadão Espinola. Bravo, meu grande Doutor! Que prazer ler seu texto, me emociona às lagrimas. Vida longa, meu já “caro amigo”!