“O sentido da vida é lutar pela liberdade e pelo engrandecimento humano. O pior no homem é viver somente para si” (Victor Serge, revolucionário franco-russo).
Há cinqüenta e cinco anos, em 1962, com dezessete anos, despedíamo-nos da Presidência do Diretório do Lyceu Paraibano, encerrando a experiência mais marcante da nossa vida. Nesse discurso de despedida, já externávamos preocupações com a justiça social, originadas de intensa militância na Juventude Estudantil Católica, iniciada no Pio X.
Na ocasião, proclamávamos “a nossa mais veemente repulsa ao status quo, às estruturas sociais vigentes, cuja desigualdade na distribuição de riquezas levará, mais cedo ou mais tarde, à mudança radical, pacífica ou pela força”. E acrescentávamos: “Olham os estudantes, perplexos, a miséria, o pauperismo, a indigência e outras chagas sociais, consequência do regime de espoliação do homem pelo homem em que vivemos”.
Em conclusão, afirmávamos que “nossa maior preocupação, como classe vanguardeira, será participar da luta libertária pela redenção econômica, social e política da nossa Pátria”.
Na Universidade, vivenciamos o dia-a-dia dos estudantes engajados, no qual até o namoro era “subsumido” à luta pela democracia e por justiça social. Foram muitos que se opuseram à ditadura, motivados por esses anseios, tendo como única arma para efetivar esse “delito” o exercício das liberdades democráticas.
Por essa oposição, pagamos um preço relativamente elevado. Fomos impedidos do direito de estudar e preso por duas vezes; demitido das funções de Professor de Francês do Lyceu e várias vezes processado, até mesmo quando já integrante dos órgãos diretivos da UFPB!
Fomos também impedidos, por dez anos, de ingressar no serviço público. Em 1999, em memorável reunião da Assembleia Universitária, já como membro do Conselho Universitário (Consuni) e Ouvidor daquela instituição, falamos em nome dos docentes e estudantes punidos pela ditadura.
Nessa ocasião, a Universidade retratou-se, anulando simbolicamente as punições que alunos, professores e funcionários receberam.
Permanecemos fieis aos ideais que precocemente abraçamos, conforme comprova atuação posterior em órgãos públicos e na sociedade civil, assim como todos os nossos escritos.
O engajamento da nossa geração na defesa dos ideais democráticos contrasta com a absoluta falta de interesse de muitos estudantes de hoje e de cidadãos bem informados por esses ideais, apesar de sua pungente atualidade.
Parte deles, incluindo pessoas queridas, optou por votar em candidato adepto confesso da tortura e do regime militar, o qual não considera ter sido uma ditadura!
A insatisfação do eleitor contra a corrupção e a insegurança foram fatores determinantes para conferir a esse candidato – também omisso em relação a propostas de distribuição de renda e favorável à supressão de direitos dos trabalhadores – um cheque em branco para implementação de políticas ultra-conservadoras.
Isso confirma a necessidade do estudo da psicologia das massas para melhor desvelar o autoritarismo embutido no sentimento de impotência de tantos brasileiros, que delegaram a um “homem forte” – com uma retaguarda armada – a resolução dos problemas nacionais.
Assim procedendo, fizeram, conscientemente ou não, tábula rasa do que havíamos construído. Mas de nada adiantará combatê-lo se as esquerdas não fizerem mea culpa, reconhecendo sua escassa consciência democrática, refletida na ausência de autocrítica e no funcionamento autoritário de seus partidos.
Isso demanda espírito de humildade e estruturas porosas para incorporar a participação dos que as apoiam. Vencer esse déficit de democracia ajudará a compreensão de que nossas males se devem não à existência desse regime, mas à sua debilidade, e só se resolverão com o aprofundamento da democracia.
- Rubens Pinto Lyra é Doutor em Ciência Política, Professor Emérito da UFPB
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Uma resposta para ANOS 60 E CONTEXTO POLÍTICO ATUAL, por Rubens Pinto Lyra
Bravo!