Juiz culpa fotógrafo que perdeu olho em manifestação

Sérgio, o fotógrafo que perdeu a visão e a ação na Justiça (Foto: Conjur)

Sérgio, o fotógrafo que perdeu a visão e a ação na Justiça (Foto: Conjur)

Ao cobrir manifestação de rua que descamba para a violência entre lados antagônicos ou entre a Polícia e manifestantes, jornalista ou fotógrafo corre risco de levar bordoadas ou até mesmo tiro. Muitos já perderam a vida nesses confrontos, outros escaparam com sequelas para o resto da vida. E, pior, os sobreviventes podem ser responsabilizados judicialmente pela própria desgraça sofrida. É o caso do fotógrafo Sérgio Andrade da Silva, que o blog conta a partir deste ponto.

Sérgio perdeu a visão do olho esquerdo após ser atingido por uma bala de borracha disparada por um policial durante manifestação contra o aumento das passagens em São Paulo, em junho de 2013. Ele ajuizou – e perdeu, pelo menos em primeira instância – uma ação contra aquele Estado. Pedia R$ 1,2 milhão por danos moral, estético e material, além de uma pensão mensal de R$ 2,3 mil acrescida de R$ 316 para custear tratamento médico.

“Os pedidos, contudo, foram negados pelo juiz Olavo Zampol Júnior, da 10ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo. Ao justificar sua decisão, o juiz explicou que a responsabilidade do estado é objetiva, existindo diversos precedentes jurisprudenciais em que houve responsabilização estatal pela ação da polícia na contenção de tumultos e manifestações, quando manifestantes teriam sido feridos por balas de borracha. No caso específico, porém, o juiz considerou que houve culpa exclusiva do fotógrafo que se posicionou na ‘linha de tiro’ entre manifestantes e policiais, excluindo assim a responsabilidade do estado”, relata Tadeu Rover, da revista eletrônica Consultor Jurídico.

No recurso ao Tribunal de Justiça de São Paulo ou em eventual pedido de reconsideração dirigido ao próprio juiz, é bem possível que os advogados de Sérgio perguntem ao julgador se é razoável acreditar que deliberadamente alguém se coloque na ‘linha de tiro’ em meio a um tumulto da magnitude dos que ocorreram em São Paulo naquela época e em tantas outras capitais do país. Seria o caso de perguntar ainda ao Doutor Juiz: “Excelência, quantas pessoas naquele conflito, envolvendo milhares de pessoas em movimento para todos os lados, a maioria tentando escapar de bombas de gás ou balas de borracha, poderiam saber com exatidão – além dos policiais – que estavam na linha de tiro?”.

Mas essa não é a primeira vez que a Justiça de São Paulo culpa a vítima por ferimentos graves em tumulto semelhante. “Em 2014, a 2ª Câmara Extraordinário de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo negou recurso em que o fotógrafo Alexandro Wagner Oliveira da Silveira pedia indenização por danos morais e materiais. Ele foi atingido (em 2003, na frente do Masp) por uma bala de borracha, disparada pela PM, no olho esquerdo e perdeu parcialmente a visão”, escreveu o jornalista da Conjur.

O relator dessa última ação, desembargador Vicente de Abreu Amadei, afirmou em seu voto que o próprio fotógrafo foi o único responsável. Porque não se retirou do local “ao tempo em que o conflito tomou proporções agressivas e de risco à integridade física, mantendo-se, então, no meio dele, nada obstante seu único escopo de reportagem fotográfica, o autor colocou-se em quadro no qual se pode afirmar ser dele a culpa exclusiva do lamentável episódio do qual foi vítima”.

Para ler a sentença

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