CARTA A UMA AMIGA ESPECIAL, por José Mário Espínola

Crédito: Jack The Mask

Querida amiga,

Outro dia você disse que eu iria para o inferno pretinho e de cabeça pra baixo. Não me importei muito, até achei engraçado.

Não que eu ligue muito pra essas coisas, mas o fato é que o inferno não é um destino muito atraente, para mim. Pelo menos nunca planejei ir até lá.

É verdade que dificilmente encontrarei alguns chatos lá embaixo. Jamais vou me deparar com carolas. Por isso eu acho que lá não se é obrigado a ouvir todos os dias as epístolas de São Paulo. Nem salmos responsoriais. Meu Deus!

Estarei sempre em boas companhias. Provavelmente boa parte dos melhores escritores clássicos se encontram no inferno: o Marquês de Sade, Cúzio Malaparte, Adelaide Carraro, Oscar Wilde, Sergio Porto, Nelson Rodrigues, Henry Miller, João Ubaldo, D. H. Lawrence, Masoch, Carlos Zéfiro e muitos outros.

Vai ser uma alegria encontrar Norma Bengel, Dercy Gonçalves e Costinha! Sargentelli com as suas melhores Mulatas. A maioria das vedetes do Rio e São Paulo, também. Êpa!

Os corruptos e toda a turma do Centrão vão para lá pra baixo, acredito. A minha dúvida é saber se os hipócritas conseguem enganar a turma do Céu, e subir para lá.

Os falsos cristãos, os fascistas e os falsos patriotas também devem estar no inferno. Mas nos confins dos infernos eles têm que usar crachá especificando o motivo de terem descido. Assim fica mais fácil evitá-los. Assassinos e estupradores jamais são encontrados pelas ruas de lá, pois são torrados logo que chegam, acredito.

***

Amiga, quando você rogou a sua praga, apenas lhe pedi que pelo menos não fosse de cabeça pra baixo, pois, como você sabe, eu sofro de labirintite, e poderia ter uma crise, quando estivesse descendo. Pelo menos nisso você até concordou e me deixou de cabeça pra cima. Mas hoje estou muito preocupado. Explico por que…

Embora tenha nascido em Patos, uma das cidades mais quentes do nosso Estado, criei-me em João Pessoa e me adaptei às temperaturas daqui.

Patos, Sousa, Pombal, todas têm calor infernal. Quando estou lá, a sensação que eu tenho é que estou dentro de uma terrina de sopa. Você já andou dentro de uma terrina de sopa? Eu também não, mas imagino como deve ser.

Foi o calor infernal que está fazendo aqui, neste verão, o que me deixou realmente preocupado. Aqui na terra está um inferno. Fiquei pensando: se aqui está assim, imagina no dito cujo!

O homem está destruindo o mundo, o que pode ser visto e sentido nos últimos anos: temporais nunca antes visto no lado de baixo do Equador, alternando-se com secas apocalípticas. Quem diria, cinco anos atrás, que um dia a gente veria o rio Amazonas secar?!

Aqui em nossa cidade temos pelo menos uma brisa aliviante, quando estamos à sombra. Que eu saiba, no inferno não tem sombra. Nem brisa.

Em quanto estará a temperatura no inferno? Você tem notícias de lá? Seu guia provavelmente tem.

Será que lá não tem umas suítes para clientes especiais, do tipo Sala Vip dos aeroportos? Para aqueles hóspedes que têm cartão Black da Sicredi, por exemplo? É justamente o que eu tenho! Ou cartão American Express, como quer a amiga Aparecida.

Se não tiver, acho que vou precisar muito da ajuda dos amigos, dos parentes e de todas as pessoas que rezam muito, para ver se eu consigo ir pra destino melhor. Ou, se não conseguirem me despachar lá pra cima, invertendo a rota, que pelo menos garantam um lugar numa Sala Vip do inferno. Senão eu vou morrer de calor por lá!

Do seu sempre amigo bem intencionado,

Zé Mário

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