GOLPE BRANCO, por José Mário Espínola

Ato pela democracia e leitura da ‘Carta aos brasileiros e brasileiras em defesa do Estado Democrático de Direito’, em 11 de agosto deste ano, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) – Imagem: Roberto Parizotti/Fotos Públicas

Bom Amigo me provoca, para saber por que é que eu votar “em um ladrão”, segundo ele. Como é uma pessoa de quem eu tenho uma elevadíssima estima, procurei argumentar com fatos históricos.

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Na Alemanha dos anos 1920, Adolf Hitler aproveitou-se de uma nação fragilizada pelo pós-guerra de 1918, seguida de administrações democráticas, que, no entanto, não conseguiram obter sucesso para melhorar as terríveis condições que a população enfrentava, por diversos fatores: dívida de guerra extorsiva; desemprego incontrolável; inflação astronômica provocada pela quebra da bolsa mundial; caos social; ausência de segurança pública, porque o país estava todo dividido, com bandos armados espalhando o terror, principalmente os Camisa-parda nazistas. Estes eram arruaceiros e viviam em eterno conflito com os comunistas, sob influência da União Soviética, que os armava.

Esse foi o meio de cultura no qual cresceram bactérias humanas, como o cabo austríaco Adolf Hitler. Aproveitando-se da fragilidade política e social, Hitler disseminou o medo entre os alemães, em sua maioria pessoas simples, e no meio da nobreza falida e da elite alemã, que haviam perdido os privilégios, principalmente os prussianos. Todos buscavam um culpado para a situação em que se encontravam. A sua fala despertou a atenção desses segmentos da sociedade alemã. Hitler iniciou apontando os judeus e os comunistas como os culpados maiores pela derrota na guerra e pelas mazelas que o povo sofria. Disseminando notícias falsas, incutiu o ódio da população contra essa etnia. Com isso ele foi ascendendo politicamente, conquistando vagas no parlamento para o seu Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães, os nazistas, fundado em 1920.

Em 1933, Hitler foi eleito por via democrática, mas o seu partido não alcançou o número mínimo de cadeiras para fazer o chanceler, que era o seu objetivo. Ele teve que fazer uma coligação com outro partido, para alcançar o quórum necessário. Sabe com quem? O Partido Comunista Alemão! O Kaiser Hindenburg, que presidia a Alemanha, embora muito contrariado, teve que nomear Hitler para a chancelaria, pois era o que dizia a Constituição alemã. Assim, no dia 30 de janeiro de 1933, Hitler tornou-se Chanceler, o homem mais poderoso da Alemanha.

Dominando o Executivo, e tendo feito a maioria no Parlamento, quatro semanas depois Hitler deu um golpe. Aproveitando-se de um incêndio no prédio do Reichstag, que era o parlamento alemão, causado por um louco holandês, os comparsas de Hitler, orientados pelo ministro da Propaganda, Josef Goebells, disseminam a história de que se tratava de uma tentativa de golpe pelos comunistas, causando medo ao povo alemão. A população estava profundamente insegura. E as elites conservadoras de burocratas, políticos e militares temiam uma tomada de poder pelos comunistas.

Com a população amedrontada, Hindemburg foi convencido por Hitler a assinar um decreto que eliminava a liberdade de expressão, de opinião, de reunião e de imprensa. O sigilo do correio também era abolido, dando-lhe amplos poderes. Então Hitler fechou os partidos Comunista e Socialista, prendendo e torturando seus integrantes. Com o tempo interferiu no judiciário, aposentando os juízes e prendendo alguns. Substituiu-os por magistrados fiéis.

Perseguiu de todas as formas: judeus, católicos, intelectuais, homossexuais, ciganos, portadores de deficiência física ou mental. Recebeu o apoio dos evangélicos, da elite militar, dos prussianos, e da sociedade conservadora. Hoje, sabemos o que resultou dessa escalada, envolvendo o mundo em uma grande guerra de conquistas, com a morte de muitos milhões de pessoas, boa parte delas civis.

Essas informações podem ser confirmadas em livros sobre o nazismo, como, por exemplo: Ascensão e Queda do Terceiro Reich, de William Shirer (talvez o mais completo), e Memórias da Segunda Guerra Mundial, de Winston Churchill.

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Aproveitando-se de uma onda de extrema-direita que vem varrendo o mundo há mais de uma década, e da sociedade brasileira fragilizada pela administração de Dilma Roussef, e a administração pífia, leniente e corrupta de Michel Temer, um tenente que havia sido expulso do exército nos anos 1980, quando foi classificado de medíocre, incompetente e perigoso pelo presidente Ernesto Geisel, surgiu no panorama político com um discurso raivoso ultraconservador, muito semelhante ao do cabo austríaco Adolf Hitler, que encontrou eco na sociedade conservadora do Brasil.

Esse cidadão nunca trabalhou em sua vida. Ingressou na política como vereador do Rio de Janeiro. Fez pacto com grupos armados egressos da polícia estadual, conseguindo se eleger ao longo de 28 anos, dessa vez como deputado  federal. Apoiado numa nova forma de fazer política, as famigeradas redes sociais, ele aproveitou-se do momento de fragilidade da nação, disseminou o medo contra as esquerdas, adicionou o messianismo à sua pregação de ódio, e obteve assim o apoio de uma parcela muito organizada e respeitada, os evangélicos.

Nesse ínterim, o principal expoente do partido popular, o PT, foi excluído da eleição de 2018. Este partido deveria ter reconhecido o profundo sentimento antipetista que se instalou na população e apoiado outro candidato, que derrotaria Jair Bolsonaro. Mas, como o PT nunca teve autocrítica, lançou um candidato, que teria muitas chances de se eleger. Foi quando surgiu a facada, desferida por um louco (semelhante ao holandês que tocou fogo no Reichstag), que mexeu com o sentimento de piedade do brasileiro, a pieguice. E Bolsonaro foi eleito democraticamente presidente do nosso país. Como Hitler na Alemanha e Mussolini na Itália.

Ele já está afirmando que, logo que reassumir, irá iniciar o golpe branco. Começará deformando o STF, aprovando no Congresso reforma que lhe permita se livrar de todos os magistrados que possam vir a contrariar os seus planos, reduzir a idade de aposentadoria, além de ampliar o número de ministros, que serão nomeados por ele. Como ele conseguiu eleger a bancada mais conservadora de todos os tempos, se empossado ele conseguirá realizar o seu plano. Depois é só seguir a cartilha desses ditadores extremistas, já com a população subjugada.

Ele se espelha em exemplos internacionais: Hugo Chávez, na Venezuela; Viktor Orban, na Hungria; Vladmir Putin, na Rússia, e Kim Jong-Un, na Coréia do Norte. Um time seleto. Todos foram eleitos pelo voto em seus respectivos países.

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Volto à pergunta de Bom Amigo. Durante muito tempo eu também fui intensivista. Na UTI, nós aprendemos a realizar todos os esforços para salvar uma vida. Na tentativa, fazemos tudo o que é possível e necessário, correndo riscos, tais como, por exemplo, provocar fratura de costelas na massagem cardíaca. O importante é resgatar o paciente. Depois, tratamos as sequelas. Por analogia, devemos adotar o mesmo procedimento para salvar o Brasil.

No momento, a vida da frágil democracia brasileira corre elevado risco de morrer. Acho que esse é o mesmo pensamento que levou a apoiarem o adversário do atual presidente pessoas insuspeitas como Fernando Henrique Cardoso, Geraldo Alckmin, Armínio Fraga, Simone Tebet, vários ex-ministros do STF, toda a elite cultural, diversos empresários. Eles enxergam que é a única forma de impedir que o nosso “cabo austríaco” dê um golpe contra a nossa democracia que, repito, se encontra num momento de fragilidade.

Nesta eleição, escolhi o mal menor para o Brasil. Votei e votarei contra Bolsonaro. Assim, a democracia estará garantida.

É BOM ESCLARECER
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9 Respostas para GOLPE BRANCO, por José Mário Espínola

  1. Alberto Lacet escreveu:

    Muito bom. Todo esforço intelectual em trazer um pouco de luz
    histórica para esse país, é meritório e louvável

  2. José Maria de Almeida Filho escreveu:

    Temos que evitar a Barbárie no nosso Brasil, o nazismo, o fascismo. Só uma solução. Votar no Lula

  3. Marta Pessoa escreveu:

    Ze Mário, sou admiradora da sua escrita e fã do médico e cidadão que você é. Seus textos são farol e lazer. Parabéns.