Aos poucos as casas estão sendo substituídas por apartamentos. Os motivos das mudanças vão da segurança ao modismo. Mas há ainda quem prefira morar em casa, como eu.
Um espaço inexiste num apartamento: quintal. Tenho um certo xodó por ele e muitas lembranças. Quem não se recorda do seu quintal, quando criança? Lembro do meu, muito bem.
Alguns grandes, outros menores, todos os quintais eram sortidos de fruteiras, galinheiros, quaradouro e bastante espaço para as brincadeiras das crianças.
Como era bom subir nas árvores e saborear as suas frutas – dos quintais alheios eram mais suculentas. Achava geniais os balanços improvisados com cordas nos galhos, que permitiam movimentos estonteantes em pleno ar.
Andar por cima dos muros, num equilíbrio digno de elogios dos amigos, era glorioso e permitia contemplar o cactário cultivado pelo vizinho. Mas triunfal mesmo era atingir uma casa de maribondo com baladeira. Bravura e inconsequência se misturavam na traquinagem.
Ninguém esquece das brincadeiras de esconde-esconde, dos jogos com bolas de gude, cozinhados com ovos surrupiados do galinheiro, e dos bangue-bangues, com direito à queda, choro e mercurocromo.
Quintal é um recinto de relações com o outro e consigo mesmo. Sempre me provocava reflexões sobre a natureza. Observava daquele lugar um céu mais ensolarado e estrelado, à noite.
Conseguia, num rompante onírico, transferir a literatura infantil para a minha companhia. Com este espírito de sensibilidade e curiosidade, típico da infância, conseguia transportar os personagens das histórias para aquele espaço propício à imaginação.
Meu quintal sediava peças teatrais, com roteiro memorizado pelos atores mirins. Todos trabalhavam com afinco na organização das apresentações. Lençóis nos varais se transformavam em cortinas e o quaradouro funcionava como palco. Papel crepom, comprado na mercearia do bairro, era o insumo usado na confecção dos figurinos. Pronto, o ambiente artístico estava montado com desvelo.
Criatividade não faltava às crianças. Envolver a vizinhança adulta para formar plateia era fundamental. Muitas vezes, de tão numerosa, superava a expectativa das crianças.
O corre-corre para conseguir mais cadeiras a fim de acomodar os espectadores se transformava num movimento exaustivo, mas divertido também. Os convidados sabiam prestigiar, mereciam ser bem acolhidos. Satisfeitos com a apresentação aplaudiam exaustivamente.
Cenário de um quintal de décadas atrás está assim reproduzido. Ambiente lúdico de uma criança sem medo de ser feliz.
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