Acabo de rever “Cinema Engenho”, o curta-metragem dirigido por Dácia Pitangui, uma piauiense com graduação em Engenharia, mestrado em Comunicação e especialização na Escola Internacional de Cinema e Televisão de San Antonio de los Baños, Cuba.
Professora, também, da Universidade de Brasília, Dácia esteve em Pilar, em 2006, para concluir seu documentário sobre o premiadíssimo cineasta paraibano Vladimir Carvalho que, na ocasião, realizava as filmagens de “O Engenho de José Lins”. Ali, conheceu outra figura que a encantou: Seu Zé Ribeiro, homem de poucas letras e origem campesina cuja paixão pelo cinema o levou não apenas a projetar filmes em praças e mercados públicos, mas, ainda, a construir seu próprio prédio, tijolo por tjjolo, cadeira por cadeira.
Particularmente, devo ao Seu Zé o gosto pela Sétima Arte, assim tida e havida. Menino, eu costumava aguardar seu retorno, às quartas-feiras, do Recife, para onde ele seguia de trem a fim de encomendar nos escritórios da Fox, RCA ou Metro as fitas que exibiria na sala modesta de Pilar, três vezes por semana: aos sábados, domingos e quartas-feiras. Neste último caso, tratava de reprisar o filme que rendera a melhor bilheteria semanal, todavia, com um daqueles seriados que levavam a criançada ao delírio.
Na escola, tentávamos adivinhar de que jeito o mocinho, a mocinha ou os amigos dos dois (a turma do bem) escapariam dos perigos a que foram expostos no episódio anterior. “Ficar em episódio”, aliás, foi por muito tempo expressão usual de conversas que mantivéssemos sobre qualquer situação pessoalmente arriscada. A resposta ainda não dada a pedidos de namoro, a nota da prova escolar prestes a sair, a bronca esperada do pai ou da mãe, tudo isso deixava o camarada em episódio.
Tarzan, Capitão Marvel, Nyoka e, até mesmo, a Guarda Costeira americana fizeram-me perder muitos sonos por culpa de Seu Zé Ribeiro que demorava uma semana entre uma exibição e outra.
Tive a oportunidade de entrevistá-lo para uma das páginas amarelas da Revista “A Carta”. Título da matéria, proposital, simbólico: “E o vento levou!”. Sua vida e sua morte, meses depois do falecimento da mulher, dona Beatriz, foram tratadas por mim em Editorial do “Jornal da Paraíba” que, aliás, quase sem conter as lágrimas, vi emoldurado na parede de sua casa por um dos seus filhos.
Ah, Seu Zé, quanta saudade. Do senhor e do tempo em que os perigos do mundo sucumbiam aos cuidados paternos e à bravura dos mocinhos da tela. “Cinema Engenho” traz-me de volta a imagem desse homem e de sua missão formidável: retirar da maleta os sopapos de Buck Jones, a beleza de Grace Kelly, os encantos de Brigitte Bardot com seu convite irresistível ao pecado, aquele, o cometido na privacidade do banheiro, com que enchíamos os ouvidos do Padre Gomes sem medo da surra em casa. Afinal, confissão é confissão.
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