Final dos anos 1970, já havia muitos médicos no Brasil, embora com imensa concentração na faixa litorânea. Nada a ver com as lindas praias brasileiras, mas é nessa zona onde se encontra a maioria dos grandes centros, que oferecem melhores condições de trabalho ao médico. Mas, como a concorrência já se fazia levar em consideração na escolha da especialidade, o futuro médico tinha que fazer uma profunda análise do panorama profissional.
Cristina não era apenas mais uma carinha bonitinha no curso de Medicina. Muito estudiosa, chegava a ser uma das melhores da sua turma. E concorria com seu namorado, o futuro Dr. João Ribeiro Neto. Este, muito inteligente, dinâmico e decidido, rápido escolheu a sua futura especialidade: apaixonou-se pelos hieróglifos do eletrocardiograma, as curvas do vetorcardiograma e as oscilações do fonocardiograma. Ou seja: Cardiologia.
Já Cristina ficou em dúvida: área clínica ou cirúrgica? Viu que tinha mais pendores, habilidade e paciência, decidindo-se por cirúrgica. Por ser mulher, a tendência era que se tornasse obstetra. Mas era mais esperta e tinha muita visão: fez a sua própria pesquisa de mercado e tomou a decisão inabalável.
O difícil foi contar ao futuro esposo qual seria a sua especialidade médica. Machista e, pior ainda, dotado de um excelente humor mordaz, jamais iria compreender ou aceitar, embora sempre tenha se destacado como um aluno muito inteligente. Mas, chegada a hora da inscrição para a residência médica, teve que revelar o seu segredo. Aí, começou o inferno.
A briga já vinha durando desde o Hospital Universitário, continuou no ônibus do Castelo Branco e rolou até chegarem a casa, no Miramar.
Dona Zuzu, mãe de Cristina, mulher prática, tranquila, viu aquela confusão entrando, João muito vermelho, exaltado, falando alto, e perguntou:
– Ave-Maria, como vocês brigam! Estão brigando porque, desta vez?
– Nada não, mamãe.
E o João Ribeiro:
– Diga a ela! Diga a ela!
– Diga a ela o quê, Cristina?
– Nada não, mamãe!
João insistiu:
– Conte pra ela! Du-vi-dê-ó-dó!
– Contar o que, Cristina? De que é que vocês estão falando?
– Da escolha dela, da especialidade que ela escolheu!
– E qual é?
– Não interessa, mamãe!
– Fale! Conte, se tem coragem!!
– Qual foi, minha filha?
– Depois eu digo, mamãe…
– Conte agora! Ah, duvido!
– Qual foi minha filha? Diga!
– Proctologia…
– Qual? Não escutei nada, filha.
Abusada, Cristina respondeu:
– PROCTOLOGIA, MÃE!!
– Ah, sim. Muito bem, minha filha, parabéns.
Surpreso, João olhou para a sogra, olhou para a namorada, e maldoso perguntou à sogra:
– Dona Zuzu, me responda: a senhora sabe o que é proctologia? Sabe para que serve, mesmo?!?
Inocentemente, Dona Zuzu respondeu:
– Não é alguma coisa de Medicina?
Venenoso, João Ribeiro fez uma breve explanação pouco científica à sogra, sobre a especialidade de Proctologia. Dona Zuzú passou mal:
– Oh! Oh! Oh! Ai, meu Deus! Não acredito! Não acredito! Tão bem que criei minha filha, tanta educação que lhe dei, com muito sacrifício coloquei-a no colégio das freiras! E é isso que recebo?! É este o pagamento que você me dá? Estudar seis anos para ser médica de CU??!!
José Mário Espínola
Especialista em especialidades médicas
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