CIRCO, SANTOS E FEIJÃO NO COCO, por Frutuoso Chaves

Imagem: YouTube

Foi pequena a temporada do Circo Estrella del Mar, na cidadezinha. Não passou de uma semana, enquanto os outros, antes e depois dele, demoravam-se, ali, 15 ou mais dias, até a mudança para a praça seguinte.

A confusão em que seus artistas se meteram foi apenas uma das razões para a curta permanência. A outra foi a Semana Santa, tempo da reclusão de corpos e espíritos, dias de meditação e luto.

Também, de tudo com leite de coco: o peixe, o bredo verdinho e até o feijão nosso de cada dia. Das coisas assim temperadas por ordem expressa da minha mãe nem o dono da casa escapava. Mesmo ele que pretendia mandar em tudo com pulso de ferro.

Como eu detestava feijão no coco. E acredito, piamente, que assim estava em numerosa companhia. Não conheci menino da minha idade que disso gostasse. A não ser os bem pobrezinhos, aqueles que pediam um jejum para as mães jejuarem. Não estariam a pedir o contrário: um desjejum para a mãe, ou quem quer que mais fosse?

Pedido de perdão tem prazo validade? Espero que não tenha, pois, sinceramente, eu também não gostava da Semana Santa. Daqueles dias intermináveis de reflexão e reza, dos santos todos cobertos e da alimentação frugal, sem carnes, até o momento do exagero de peixes, favas e feijões, tudo com o bendito coco.

De circo, naqueles meus 14 anos, eu gostava. O Estrella del Mar – assim mesmo, metido a besta, espanholado – chegou sem aviso. A indicação do terreno deu trabalho à Prefeitura. O padre não queria aquilo perto da Via Sacra. O ponto então escolhido foi o Compra-Fiado, topônimo inspirado na penúria dos moradores. O lugar abrigou, direitinho, o tablado, a arena, o pano de roda, as tendas e tralhas da trupe.

Fugi duas vezes para ver o espetáculo e, já na primeira, caí de quatro pela contorcionista, um elástico em pessoa. Que vergonha quando o número terminou e aquela pequena deusa subiu ao poleiro (os degraus que nos estádios de futebol abrigam os geraldinos, a turma sem grana) e pôs uma fita perfumada no meu ombro, providência destinada a arrecadar um dinheirinho além da quantia mixuruca rateada pela bilheteria. Até Paulo Barbosa, duas fileiras abaixo, costumeiramente mais liso do que eu, contribuiu, fita no ombro, com a bolsa da menina. E eu, ali, sem um níquel.

O desejo da reparação foi o que me fez voltar ao circo onde tudo se repetia: o palhaço com as mesmas piadas, os acrobatas com as mesmas piruetas e a pirralha com aquela fita cheirosa. A diferença, acho eu, foi a cédula a ela entregue, desta vez, com o valor e o tamanho do meu encantamento. Demorasse mais por ali o Estrella del Mar, a padaria do meu pai teria falido mais cedo.

Minto. Havia outra coisa também diferente naquela noite: a segunda parte do espetáculo reservada ao teatro, se é que as falas recitadas e a má postura dos atores mereciam o termo. O tema escolhido, em homenagem à ocasião, era A Paixão de Cristo.

Mesmo inocente acerca de muitas coisas da vida, em razão da pouca idade, comecei a desconfiar do empurrão forte de um soldado romano num dos apóstolos. Não era em Cristo que ele deveria bater? A barba espessa na cara de surpresa do homem assim agredido não me era de todo estranha. Eu a conhecia da cena anterior quando na cara de Judas e, antes disso, na do mestre de cerimônia.

Não demorou muito para o distinto público, ao cabo do terceiro intervalo, se horrorizar com a perseguição ao barbudo por alguém de túnica levantada e faca na mão. O perseguido fugiu pelo picadeiro, a rota mais curta.

Escapou do inimigo, mas não do delegado Fonseca que deu ordem de prisão à trupe inteira. Eu soube, depois, que a bebida corria solta nos bastidores reavivando a inimizade entre aqueles dois. A encrenca tinha começado em Itabaiana, a praça anterior, por causa do desrespeito ao décimo mandamento.

Definitivamente, os homens não aprendem. É lição que advém dos tempos bíblicos, mas nunca aprendida. Os machos, em todas as eras, não atinam para o fato de que não se deve juntar mulher e cachaça, se um estiver de olho apenas na bebida e, o outro, também, no tira-gosto.

De todo modo, acho que os dois inimigos se reconciliaram depois de uma noite na cadeia, porquanto partiram juntos e em paz, três dias depois do acontecimento.

Quanto a mim, observo que certas coisas deixam marcas permanentes. Ponham-me, ainda hoje, frente a apresentações da tevê com essas divindades olímpicas que pairam no ar e assombram o mundo com seus rodopios e logo me vem à mente a garota do Circo Estrella del Mar. Mesmo que eu nunca mais tenha sabido dela.

CANTIGA DE RODA, por Babyne Gouvêa

Ciranda em Itamaracá, Pernambuco (Imagem do YouTube)

Estava pensando cá com meus botões. Cadê as cantigas de roda que tanto encantaram a nossa infância? E a vida adulta também, por que não?

Final dos anos 70  fomos à Ilha de Itamaracá, Pernambuco, dançar Ciranda com Lia – personagem icônica dessa dança de roda. Juliana, nossa filha, então com seis anos, era a participante mais animada do folguedo.

Ciranda é cultura popular, notadamente no Nordeste brasileiro.
Possivelmente, a falta de divulgação sobre esta manifestação acarrete a sua imerecida desvalorização.

Nossas tradições culturais já não são as mesmas. Ou melhor, as novas gerações não alimentam o senso de tradição. Difícil pontuar os motivos não sendo uma estudiosa no assunto. Lamentar é possível.

Lembro bem de uma passagem do ex-Presidente Juscelino Kubitchek e esposa pela Paraíba, em 1972. Foram recepcionados pela família de Humberto Rabelo, na Praia do Poço, Cabedelo. Na ocasião, à beira-mar, houve uma apresentação da Dança do Coco – cultura popular de suposta origem afro-indígena, com dança, música e poesia.

A dançarina Lau, famosa por dominar a arte do Coco, deixou os convidados embevecidos. Atualmente, tenho dúvidas se essa exibição constaria em agenda de uma autoridade nacional em visita ao nosso Estado.

Algumas cantigas de roda, como Coco e Ciranda, têm ritmos de origem incerta. Há versões que creem na ascendência afro-indígena, no ambiente dos engenhos de açúcar com influências dos batuques africanos e dos bailados indígenas.

Cantigas de roda não são cantadas e dançadas como outrora. Constituídas de textos anônimos simples, as suas rimas facilitam a memorização e o aprendizado. Embalam o imaginário infantil como autênticas manifestações socioculturais populares. São brincadeiras infantis que caem no gosto dos adultos também.

Melodias folclóricas sempre participaram do meu mundo lúdico. A rua da minha infância promoveu o companheirismo entre as crianças a partir de um repertório vasto de cantigas de roda. Estendi aos meus filhos o senso de coletividade com este importante componente da cultura popular. E, como efeito dominó, eles repassam para os meus netos.

Seguimos o lema: proibido se sobrepor à cultura. Assim, fica garantida a tradição na família com vivas às brincadeiras de roda!

Estão assaltando até amostras de xixi e cocô na Paraíba

(Foto: diariodebiologia.com)

(Foto: diariodebiologia.com)

Um final de semana dentro da normalidade na Paraíba, com o registro de pelo menos 13 crimes contra a vida e centenas contra o patrimônio do cidadão de bem, comum, inteiramente desprovido de segurança privada e pública. Entre as pessoas de paz e boa conduta assaltadas, uma moça protagonizou caso absolutamente inusitado em João Pessoa. Uma dupla de ladrões roubou o material que ela levava para exame em laboratório de análises.

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