CARTA AO INCUMBENTE, por Babyne Gouvêa

Imagem: Dicas Vip

Senhor Presidente,

Acordei melancólica, absorvida por preocupações diante da possibilidade de o senhor se perpetuar no comando do país. Resolvi, então, escrever uma cartinha.

As preocupações são muitas, não por mim, particularmente, já que sou uma mulher na casa dos sessenta, com vida estabilizada (até o momento; não sei o que poderá vir após o próximo dia 30/10).

A minha aflição reside, notadamente, naqueles que lutam pela sobrevivência e nas crianças e jovens sem condições de acesso a uma educação digna. Penso nos estudantes que, num passado recente, acompanharam o crescimento das suas universidades em várias frentes. Hoje, estudam num cenário inferior.

Fiquei também impactada por denúncias de corrupção no Ministério da Educação, gestão Milton Ribeiro. Pastores acusados de receber propina por liberação de verbas do Mec. E o que mais me deixou perplexa foi ter ouvido do próprio ministro que tinha o aval do presidente.

Por outro lado, pedir ao senhor para ter piedade da população é demais, eu sei. Não faz parte da sua personalidade ter pena da situação de penúria de um patrício.

Lembro bem quando o senhor imitou uma pessoa com falta de ar durante a pandemia da Covid. Doeu tanto, Senhor Presidente. Sabe por que?

Porque a população estava sendo dizimada pelo vírus e o meu irmão estava num leito de UTI lutando para se manter vivo. Deixe-me dizer uma coisa: ele chegou a receber a extrema-unção. Imagine o estado dos seus familiares e amigos. Mas Deus permitiu que o meu irmão continuasse a sua missão aqui na Terra.

Enquanto rezávamos, rogando a Deus pela recuperação de sua saúde, o senhor se vangloriava assistindo aos seus seguidores fazendo carreatas e parando em frente ao Hospital das Clínicas, São Paulo, entoando as buzinas dos seus carros, em afronta aos agonizantes. Sim, lembro também de gente filmando na área interna dos hospitais para em seguida editar e publicar cenas não condizentes com as reais.

Sou uma mulher sessentona, já não sou menininha, tampouco bonitinha, como as garotas venezuelanas. Portanto, sem perigo de pintar um clima. Sinto-me com liberdade para escrever ao senhor e falar do temor que lhe tenho.

Veja bem, esforço-me para visualizar algo de positivo no senhor, mas não consigo. Me ajude. Até da nossa Constituição, algo pelo qual lutamos e conseguimos aprovar em 1988, o senhor desdenha.

Mostramos ao mundo que somos uma democracia com os três poderes podendo funcionar em sintonia, em defesa dos brasileiros. A Constituição é motivo de orgulho para o país. No entanto, desde que o senhor venceu as eleições em 2018, com o auxílio do Moro – este é um capítulo à parte -, não o vejo respeitar o Supremo Tribunal Federal.

Isso é tão ruim para o país, Senhor Presidente. Sabe o que ocorre com esse comportamento desrespeitoso? Muitos dos seus seguidores não obedecem regras; qualquer sociedade civilizada precisa de normas. E aí se sentem livres para explicitarem o que está dentro de si. Senão vejamos, para o senhor entender melhor: cresceram durante a sua gestão, coincidentemente, os números de agressões aos negros, índios, mulheres, homossexuais e a outros grupos de vulneráveis.

Não posso omitir outra grande preocupação, Senhor Presidente, que diz respeito a nossa Amazônia. As nossas florestas estão sendo destruídas (a monitoração pelos satélites não me deixa mentir), enquanto a “boiada passa”.

Lembro bem que o senhor demitiu o cientista Ricardo Galvão do cargo de diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE, após publicar dados do desmatamento no Brasil que lhe desagradaram.

É só um lembrete amigo para corrigir as suas palavras na ONU, quando diz que em seu governo não houve desmatamento, praticamente. Os rios daquela área estão sendo poluídos com a mineração, que faz uso do mercúrio, contaminando os peixes – alimento da população indígena.

Como o senhor deve ter sabido, o ambientalista Bruno Pereira e o jornalista Dom Philips foram mortos por fazerem o seu trabalho em defesa do meio ambiente. Que trabalho honroso, não?

Ah, Presidente, fanáticos estão invadindo os templos religiosos e ameaçando os sacerdotes, quando esses proferem palavras que contrariam as ideias da pessoa chamam de “mito”.

Nunca tinha visto isso em toda a minha vida. Bastou o arcebispo D. Orlando Brandes falar nos pobres para receber xingamentos, por exemplo.

O senhor deve ter assistido ao que aconteceu na Basílica de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do nosso Brasil, porque o senhor estava lá. Lamentável, presidente.

Sabe o senhor que nasci, cresci e envelheci sob as palavras de Deus: “não mentir”? Está em Êxodo 20:16. “Guarda a tua língua do mal e os teus lábios de falarem o engano (mentira)” : Salmos 34:12-13.

Estou reproduzindo aqui nesta cartinha algo que o senhor, pretenso leitor da Bíblia, deve conhecer. Mas peço-lhe um favor, em consideração à população da nossa pátria. Diga para os que querem lhe ver reeleito para não propagarem a mentira. Esse mal distorce a formação das nossas crianças.

O senhor deve ter ouvido uma leviandade perversa de uma ex-ministra do seu governo, a senadora eleita Damares Slves, contando estórias execráveis sobre crianças da Ilha de Marajó. É apenas um dos exemplos de mentiras contadas na sua campanha.

Para não lhe cansar, não me estenderei mais. Deixarei em banho-maria as rachadinhas, os 51 imóveis comprados com dinheiro em espécie, o uso da máquina pública em campanha, orçamento secreto, a campanha em horário de expediente, condecoração a milicianos, 33 milhões passando fome e tantos outros que, se partissem de outro candidato, a reação de muitos seria outra.

Agradeço a sua atenção de ter lido esta missiva. Saiba que peço sempre a Deus para o senhor se redimir e se transformar num cidadão generoso e respeitável. As famílias, hoje divididas, e os amigos, hoje separados, voltariam a viver felizes no país, como outrora.

Saudações democráticas.

Babyne Gouvêa 

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P. S. Conte comigo se quiser apagar essa sua imagem de “espelho da ignorância humana”

É BOM ESCLARECER
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Uma resposta para CARTA AO INCUMBENTE, por Babyne Gouvêa

  1. Este é um artigo para ser lido, divulgado, e colocado em moldura.
    Uma das melhores peças que eu lí nestes tempos de pura indignação.
    Puxa, que texto!
    Parabens, Babyne!