CARTA AO AVÔ DOS MEUS FILHOS, por Babyne Gouvêa

Imagem meramente ilustrativa copiada da Wikimedia Commons

Hoje sonhei com você e me deu uma vontade danada de conversar. Fiquei pensando no seu encantamento com apenas sessenta e oito anos, exatamente a idade em que me encontro.

Estava lhe vendo na praia e na fazenda, seus dois locais prediletos. Tinha o hábito de andar com os braços cruzados nas costas, e saía a esmo. Com corpo de halterofilista costumava usar bermuda sem camisa, não sei se pelo clima quente ou por exibicionismo. E se fosse, qual o problema?

Você me ensinou muito, principalmente a diversificar iguarias. Assava um cabrito como ninguém, e a partir daí comecei a comer esse caprino pelo qual sentia aversão. Lembra das gororobas que receitava na hora da sobremesa, sabendo que é o meu prato favorito? O mamão recheado com doce de goiaba em calda foi invenção sua. Essa delícia inesquecível degusto até hoje.

E o peixe Serigado assado na brasa? Sabia que eu apreciava e me chamava para ver o que a gente ía saborear. São mimos difíceis de serem desmemoriados.

Gostava de vê-lo sozinho naquele barco pescando. Fiz companhia a você em uma das vezes, e comprovei que o silêncio e a tranquilidade daquela imensidão de mar eram seus reais parceiros. Ficamos emudecidos para a isca atrair o alvo; pescamos, mas liberamos de imediato a presa. Você entendeu a minha angústia em ter privado o peixe de sua liberdade. Foi um momento nosso de solidariedade com a natureza.

Na beira-mar o via acompanhar a chegada dos pescadores e suas redes de arrasto. Ficava identificando em voz alta cada peixe fisgado – sabia que eu desconhecia as espécies. Sou-lhe grata por mais esses ensinamentos.

E o dia em que meu segundo filho nasceu? Foi você que me levou à maternidade e, no caminho, ficava clamando: “segure mais um pouco, aqui dentro do carro, não”. Para nossa sorte deu tudo certo, o meu parto foi no lugar devido. E pensar que podia ter sido no seu Dodge Dart verde e preto, hein? Sabe que eu me lembro dessa situação e fico rindo sozinha?

Na fazenda, eu lhe observava explorando as suas terras; notava a sua presença mais frequente diante da plantação de inhame. Estou certa? E a fila de netos lhe acompanhando, hein? Lembro bem que as frutas colhidas no pomar eram distribuídas com todos os filhos, nenhum era preterido. Eram manifestações carinhosas que jamais podem ser esquecidas.

As festas juninas eram organizadas com capricho. A fazenda se tornava um arraial colorido, com fogueiras, bandeirolas e muita comida de milho, preparada pela magistral matriarca. A alegria dos netos ficava completa quando compartilhavam os fogos de artifício com o avô. Você se lembra dessas festividades, certamente.

Vou lhe contar um condicionamento que ocorre comigo desde que você esteve hospitalizado. No trajeto que eu fazia para lhe visitar na Beneficência Portuguesa sempre ouvia Chopin quando passava por uma escola de música. Você subiu ao céu, mas a associação do compositor com você continuou presente.

Passaria horas aqui conversando mesmo com as nossas divergências ideológicas. A gente sabia conviver harmoniosamente numa relação de admiração e respeito mútuos.

Vou ficando por aqui, acho que deu para amenizar a saudade. Sim, esqueci de dizer que o mar avançou na faixa de praia onde ficava a sua casa. Acredito que por sentir a sua falta.

Fique bem. Até qualquer dia!

O QUE É QUE A ECOPRAÇA TEM

Tem muita beleza, tem

Tem verde, muito verde tem

É acessível como ninguém…

Espaço, muito espaço tem

Um mar pertinho a Bessa, tem

Tem coleta seletiva, tem

E energia solar também…

Tem gente que usa, tem

E gente que cuida bem…

Donos de imóveis privatizam e cercam praias na Paraíba

Sejam bem-vindos à Praia do Poço, no litoral paraibano, mas não fiquem muito à vontade, não, porque a área já foi ‘loteada’.

Clique para ler mais