INTEMPERANÇA E CAOS, por Francisco Barreto

Imagem copiada do Núcleo de Estudos da Violência da USP

Em futuro próximo, já não usufruiremos de paz e de temperanças. No cerne da temperança, teologicamente, sempre nos ensinou Sto. Tomás de Aquino em sua admirável Suma, esta se afirma pelo domínio de si e pela moderação em exacerbados e infectos desejos.

Na gênese da temperança está o saber dominar comportamentos pessoais e políticos, e que, esta mais importante das virtudes cardinais, assenta-se sobre a grandeza humana e a prevalência do bem sobre todo o mal. A ordinalidade de fazer o bem conflita abertamente com o uso do Poder e da inteligência, da força guiada pela desordem que aprisiona e domina a mais nobre das faculdades humanas.

Desastroso é o uso da inteligência para prática do desejo que se vocaciona ao uso das armas que se destinam à destruição em massa, às práticas de guerrear, de crimes, de injustiças e da imposição de atos ditatoriais. Enfim, o mal e a prepotência têm os seus desejos engatilhados contra seres indefesos.

Os filhos de Deus não foram criados para fazer o mal. A dimensão espiritual da condição humana e de sua temperança se contradiz com os atos de reprimir, amordaçar, suprimir e abafar guiados pela desordem. À luz dos ensinamentos de Sto. Tomás de Aquino, estamos diante do grave “pecado da insensibilidade”. Os nossos dias, de hoje e próximos, nos apontam para momentos de caos.

Não há qualquer sinal de paz e temperança a partir de Outubro próximo. Paira um temeroso sentimento de que se avolumam com possíveis descortinos de violência no cenário nacional. O embate político eleitoral pode assumir proporções violentas entre os vitoriosos e derrotados pela vontade popular.

Os indícios preconizam embates alimentados pelo ódio e vinganças. Não é dado a ninguém em sã consciência desconhecer no discurso dos poderosos o recurso às armas, a violência indiscriminada contra as instituições e pessoas. Já não há mais duvidas de que está armado um palco de turbulências e nelas se imiscuirão grupos armados disseminando focos de insurgência com violência. Há evidências de que incontáveis são os insurgentes grupelhos armados que irão atentar contra a alma democrática nacional.

As instituições públicas que edificam o pálio democrático resistirão? A sociedade civil, e as representações populares oferecerão resistência? As Forças armadas irão constitucionalmente se perfilar ao lado da legalidade democrática? Afigura-se na esteira da turbulência que a nossa frágil democracia poderá ser desmoronada por espíritos da discórdia, da desordem com matriz autoritária.

Renuncio agora a minha insana ingenuidade, que a idade e a minha longínqua trajetória de exilado me ensinaram: “Quem já foi mordido por cobra desconfia até de linguiça”.

A minha angústia pessoal, longe de qualquer veleidade ideológica, alimenta-se do meu olhar e afeto pelos meus filhos e netos neste cenário de aflição e intemperança. Apenas isto. Me dói o Brasil.