HOLOCAUSTRUM NOSTRO, por José Mário Espínola

Corpos de prisioneiros amontoados em Auschwitz (imagem copiada de Instituto Humanistas Unisinos)

Foi chocante! Inacreditável. Será possível que o lado pior da história tenha se repetido?! Pois é o que está acontecendo no nosso país. Contra o nosso povo. Nos últimos dias, o Brasil assistiu estarrecido a cenas que de repente trouxeram à baila a lembrança dos horrores da Segunda Guerra Mundial.

Foram divulgadas imagens de índios da etnia yanomami. Nelas, vemos homens, mulheres e crianças esquálidos, em sua maioria esqueléticos mesmo. Apresentam estados físicos e clínicos idênticos aos das vítimas dos nazistas encontradas nos campos de concentração, ao final da guerra, após a libertação dos territórios ocupados.

É triste ver a história se repetir nos seus piores aspectos. Mas ao longo dos últimos quatro anos vínhamos assistindo no nosso país a tentativa de se impor uma ideologia cruel, a política de perseguição a grupos distintos.

Se outrora, na Alemanha nazista, foi contra judeus, comunistas, homossexuais, negros, ciganos, nos últimos anos foi gritante a perseguição a nordestinos, pretos, pobres, esquerdistas, índios, homossexuais. Contra todos, enfim, identificados como possíveis adversários dessa nova ideologia desumana. E que quase conseguiram através da tentativa de um golpe frustrado, contra o regime democrático e tudo o que este representa.

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Ao ocupar os territórios até então dominados pela Alemanha (inclusive na própria Alemanha), nos estertores da Segunda Grande Guerra, as forças aliadas se depararam com algumas das piores cenas de horror do mundo moderno: os campos de concentração nazistas.

Lá dentro encontraram incontáveis corpos em valas comuns. E muita cinza nos seus respectivos crematórios. A maioria desses campos da morte era dotada de câmaras de gás, onde eram assassinadas coletivamente as vítimas do nazismo, obedecendo à política de Estado criada por Adolf Hitler e seus mestres do horror, com destaque para Heinrich Himmler e Reinhard Heydrich.

Com o primeiro Hitler deixou a responsabilidade de solucionar os gastos de alimentação e acomodação com as hostes vencidas, e também com os seus inimigos internos, que vinham se acumulando desde 1933. Himmler passou essa tarefa para Heydrich.

Cognominado o Açougueiro de Praga, Heydrich foi o Arquiteto do Holocausto do nazismo. Ele planejou e executou a morte de judeus, comunistas, negros, homossexuais, ciganos, e todos aqueles que foram considerados inconvenientes para o regime nazifascista.

Tratava-se da política de extermínio em ritmo de produção industrial, que Heydrich elaborou e executou com toda a sua competência.

Ele seria assassinado em um atentado no dia 4 de junho de 1942, aos 38 anos, na cidade de Praga, para onde havia sido nomeado por Hitler para o cargo de Vice-Protetor da Boêmia e Moldávia.

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Ao final da guerra, o espetáculo que se revelou diante dos olhos dos Aliados era realmente dantesco: elevado número de homens, mulheres e crianças esquálidos, em sua maioria esqueléticos mesmo, espalhados por esses lugares de horror que eram os campos de concentração. E muitos corpos insepultos.

Sobraram poucos vivos para contar a história. Mas foi o suficiente para testemunhá-la perante o mundo horrorizado.

A maior parte dos cidadãos alemães era nazifascista, mas desconhecia o que se passou nos campos de concentração. Ou fazia vista grossa, como se dissesse: “Não é comigo”. Eles diziam que era mentira dos vencedores. Foi necessário obrigá-los a ir até lá, aos campos da morte, para que vissem com seus próprios olhos o que acontecera. Em muitos casos esses cidadãos “respeitáveis” foram obrigados a enterrar os corpos insepultos.

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Para fugir da responsabilidade pelos crimes que cometeu contra a humanidade, vendo a inevitável derrota, Hitler suicidou-se com um tiro na cabeça. Antes, ele matou Eva Braun, por decisão desta.

Os outros grandes expoentes do nazismo tiveram fins semelhantes. Os suicídios de Joseph Goebbels e sua esposa Magda foram levados pelo fanatismo: eles decidiram que não tinha sentido existir sem o seu líder, Adolf Hitler.

Mas o toque de crueldade foi que, antes de se matarem, eles assassinaram os seus seis filhos, pois não admitiam que eles vivessem em uma Alemanha que não fosse nazista.

Heinrich Himmler suicidou-se com uma cápsula de cianeto, pouco depois de ser capturado pelo exército britânico. Ele tentava fugir da Alemanha disfarçado, mas foi reconhecido por um sargento inglês.

Hermann Goering foi capturado pelas tropas aliadas. Ele foi condenado à forca no memorável julgamento a que ele e outros nazistas foram submetidos na cidade alemã de Nuremberg, sede do tribunal penal internacional criado para julgar os crimes contra a humanidade cometidos durante a Segunda Guerra.

Goering suicidou-se antes do enforcamento. Mastigou uma ampola de veneno duas horas antes de sua execução. A teoria mais aceita é que a ampola lhe tenha sido passada pela esposa, num beijo da morte.

Outros nazistas tiveram melhor sorte, fugindo para países simpáticos, à época, a essa ideologia, como a Argentina e o Paraguai de Stroessner e até mesmo estados do sul do Brasil que ainda hoje têm grande concentração de alemães, caso de Santa Catarina.

Mas as figuras do segundo escalão do nazismo foram julgadas e condenadas, a maioria à morte por enforcamento.

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A tragédia yanomami revelada há pouco ao mundo parece ser o fio de uma longa meada de crimes cometidos contra a humanidade nos últimos quatro anos, por autoridades brasileiras. A investigação independente pela justiça, sem a interferência das autoridades federais, é que será capaz de comprovar quem são os responsáveis por esse e outros crimes que inevitavelmente virão à tona e serão denunciados.

Paralelo a isso, já se faz notar o movimento de suspeitos na tentativa de fugir à responsabilidade. Alguns já se ausentaram do país. Outros estão providenciando cidadanias estrangeiras (italianas, por exemplo), com a nítida intenção de preparar um plano de fuga para escapar da lei.

Outros mais aproveitaram o fato de ainda vivermos em um regime democrático e conseguiram se eleger para algum lugar no Congresso, tentando esticar a própria impunidade.

A desumanidade contra os ianomâmis não ficará impune. Serão responsabilizados aqueles que por ação ou omissão favoreceram o garimpo ilegal e a exploração predatória da floresta, com isso matando de fome e sede esses indígenas. Aí estão incluídos o ex-presidente, que traçou essa política da crueldade, justificando-a como uma necessidade econômica para o Brasil, e o seu vice, que ficou encarregado da proteção da Amazônia e deu no que estamos vendo.

Também há que ser investigado e julgado o ministro passador de boiadas que, tal e qual o Arquiteto do Holocausto, deu materialidade e pôs em prática o programa de genocídio do povo amazônico. A ministra responsável pela “salvação” da família branca e evangélica também tem o que explicar à nação brasileira.

Os ministros da Justiça do governo passado também têm explicações a dar: por que desmontaram a Funai, abandonando o principal órgão de atuação da causa indígena?

Será investigado, ainda, o papel das Forças Armadas, que tem a responsabilidade de proteger as nossas fronteiras, inclusive a Amazônia, e fez vista grossa para a sua ocupação por quadrilhas, sob a tolerância do então vice-presidente.
Enfim, esperamos que um dia todos sejam submetidos a um novo, amplo e justo Julgamento de Nuremberg para responderem por acusação de crimes contra a humanidade.

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Vendo as imagens de sofrimento dos ianomâmis, vem a pergunta: algum brasileiro, por mais fanático que seja; por mais aversão que tenha ao governo eleito; por mais religioso praticante que seja; por mais preocupado com família, política de costumes… Enfim, algum brasileiro será capaz de justificar o horror que aconteceu a esse povo?

Não acredito. Nada justificará tamanha infâmia.

  • Ilustrações: o horror da fome e desnutrição em cores (yanomamis) e em preto e branco (judeus na Alemanha nazista)

GOLPE BRANCO, por José Mário Espínola

Ato pela democracia e leitura da ‘Carta aos brasileiros e brasileiras em defesa do Estado Democrático de Direito’, em 11 de agosto deste ano, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) – Imagem: Roberto Parizotti/Fotos Públicas

Bom Amigo me provoca, para saber por que é que eu votar “em um ladrão”, segundo ele. Como é uma pessoa de quem eu tenho uma elevadíssima estima, procurei argumentar com fatos históricos.

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Na Alemanha dos anos 1920, Adolf Hitler aproveitou-se de uma nação fragilizada pelo pós-guerra de 1918, seguida de administrações democráticas, que, no entanto, não conseguiram obter sucesso para melhorar as terríveis condições que a população enfrentava, por diversos fatores: dívida de guerra extorsiva; desemprego incontrolável; inflação astronômica provocada pela quebra da bolsa mundial; caos social; ausência de segurança pública, porque o país estava todo dividido, com bandos armados espalhando o terror, principalmente os Camisa-parda nazistas. Estes eram arruaceiros e viviam em eterno conflito com os comunistas, sob influência da União Soviética, que os armava.

Esse foi o meio de cultura no qual cresceram bactérias humanas, como o cabo austríaco Adolf Hitler. Aproveitando-se da fragilidade política e social, Hitler disseminou o medo entre os alemães, em sua maioria pessoas simples, e no meio da nobreza falida e da elite alemã, que haviam perdido os privilégios, principalmente os prussianos. Todos buscavam um culpado para a situação em que se encontravam. A sua fala despertou a atenção desses segmentos da sociedade alemã. Hitler iniciou apontando os judeus e os comunistas como os culpados maiores pela derrota na guerra e pelas mazelas que o povo sofria. Disseminando notícias falsas, incutiu o ódio da população contra essa etnia. Com isso ele foi ascendendo politicamente, conquistando vagas no parlamento para o seu Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães, os nazistas, fundado em 1920.

Em 1933, Hitler foi eleito por via democrática, mas o seu partido não alcançou o número mínimo de cadeiras para fazer o chanceler, que era o seu objetivo. Ele teve que fazer uma coligação com outro partido, para alcançar o quórum necessário. Sabe com quem? O Partido Comunista Alemão! O Kaiser Hindenburg, que presidia a Alemanha, embora muito contrariado, teve que nomear Hitler para a chancelaria, pois era o que dizia a Constituição alemã. Assim, no dia 30 de janeiro de 1933, Hitler tornou-se Chanceler, o homem mais poderoso da Alemanha.

Dominando o Executivo, e tendo feito a maioria no Parlamento, quatro semanas depois Hitler deu um golpe. Aproveitando-se de um incêndio no prédio do Reichstag, que era o parlamento alemão, causado por um louco holandês, os comparsas de Hitler, orientados pelo ministro da Propaganda, Josef Goebells, disseminam a história de que se tratava de uma tentativa de golpe pelos comunistas, causando medo ao povo alemão. A população estava profundamente insegura. E as elites conservadoras de burocratas, políticos e militares temiam uma tomada de poder pelos comunistas.

Com a população amedrontada, Hindemburg foi convencido por Hitler a assinar um decreto que eliminava a liberdade de expressão, de opinião, de reunião e de imprensa. O sigilo do correio também era abolido, dando-lhe amplos poderes. Então Hitler fechou os partidos Comunista e Socialista, prendendo e torturando seus integrantes. Com o tempo interferiu no judiciário, aposentando os juízes e prendendo alguns. Substituiu-os por magistrados fiéis.

Perseguiu de todas as formas: judeus, católicos, intelectuais, homossexuais, ciganos, portadores de deficiência física ou mental. Recebeu o apoio dos evangélicos, da elite militar, dos prussianos, e da sociedade conservadora. Hoje, sabemos o que resultou dessa escalada, envolvendo o mundo em uma grande guerra de conquistas, com a morte de muitos milhões de pessoas, boa parte delas civis.

Essas informações podem ser confirmadas em livros sobre o nazismo, como, por exemplo: Ascensão e Queda do Terceiro Reich, de William Shirer (talvez o mais completo), e Memórias da Segunda Guerra Mundial, de Winston Churchill.

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Aproveitando-se de uma onda de extrema-direita que vem varrendo o mundo há mais de uma década, e da sociedade brasileira fragilizada pela administração de Dilma Roussef, e a administração pífia, leniente e corrupta de Michel Temer, um tenente que havia sido expulso do exército nos anos 1980, quando foi classificado de medíocre, incompetente e perigoso pelo presidente Ernesto Geisel, surgiu no panorama político com um discurso raivoso ultraconservador, muito semelhante ao do cabo austríaco Adolf Hitler, que encontrou eco na sociedade conservadora do Brasil.

Esse cidadão nunca trabalhou em sua vida. Ingressou na política como vereador do Rio de Janeiro. Fez pacto com grupos armados egressos da polícia estadual, conseguindo se eleger ao longo de 28 anos, dessa vez como deputado  federal. Apoiado numa nova forma de fazer política, as famigeradas redes sociais, ele aproveitou-se do momento de fragilidade da nação, disseminou o medo contra as esquerdas, adicionou o messianismo à sua pregação de ódio, e obteve assim o apoio de uma parcela muito organizada e respeitada, os evangélicos.

Nesse ínterim, o principal expoente do partido popular, o PT, foi excluído da eleição de 2018. Este partido deveria ter reconhecido o profundo sentimento antipetista que se instalou na população e apoiado outro candidato, que derrotaria Jair Bolsonaro. Mas, como o PT nunca teve autocrítica, lançou um candidato, que teria muitas chances de se eleger. Foi quando surgiu a facada, desferida por um louco (semelhante ao holandês que tocou fogo no Reichstag), que mexeu com o sentimento de piedade do brasileiro, a pieguice. E Bolsonaro foi eleito democraticamente presidente do nosso país. Como Hitler na Alemanha e Mussolini na Itália.

Ele já está afirmando que, logo que reassumir, irá iniciar o golpe branco. Começará deformando o STF, aprovando no Congresso reforma que lhe permita se livrar de todos os magistrados que possam vir a contrariar os seus planos, reduzir a idade de aposentadoria, além de ampliar o número de ministros, que serão nomeados por ele. Como ele conseguiu eleger a bancada mais conservadora de todos os tempos, se empossado ele conseguirá realizar o seu plano. Depois é só seguir a cartilha desses ditadores extremistas, já com a população subjugada.

Ele se espelha em exemplos internacionais: Hugo Chávez, na Venezuela; Viktor Orban, na Hungria; Vladmir Putin, na Rússia, e Kim Jong-Un, na Coréia do Norte. Um time seleto. Todos foram eleitos pelo voto em seus respectivos países.

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Volto à pergunta de Bom Amigo. Durante muito tempo eu também fui intensivista. Na UTI, nós aprendemos a realizar todos os esforços para salvar uma vida. Na tentativa, fazemos tudo o que é possível e necessário, correndo riscos, tais como, por exemplo, provocar fratura de costelas na massagem cardíaca. O importante é resgatar o paciente. Depois, tratamos as sequelas. Por analogia, devemos adotar o mesmo procedimento para salvar o Brasil.

No momento, a vida da frágil democracia brasileira corre elevado risco de morrer. Acho que esse é o mesmo pensamento que levou a apoiarem o adversário do atual presidente pessoas insuspeitas como Fernando Henrique Cardoso, Geraldo Alckmin, Armínio Fraga, Simone Tebet, vários ex-ministros do STF, toda a elite cultural, diversos empresários. Eles enxergam que é a única forma de impedir que o nosso “cabo austríaco” dê um golpe contra a nossa democracia que, repito, se encontra num momento de fragilidade.

Nesta eleição, escolhi o mal menor para o Brasil. Votei e votarei contra Bolsonaro. Assim, a democracia estará garantida.

ESTICANDO A CORDA, por José Mário Espínola

Paralerepensar - Texto

(Imagem copiada de Paralerepensar)

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Terrorismo é o uso de violência, física ou psicológica, por meio de ataques localizados a elementos ou instalações de um governo ou da população governada, de modo a incutir medo, pânico e, assim, obter efeitos psicológicos que ultrapassem largamente o círculo das vítimas, incluindo o restante da população do território. É utilizado por uma grande gama de instituições como forma de alcançar seus objetivos, como organizações políticas, grupos separatistas e até por governos no poder.

A História é um registro implacável do comportamento da humanidade ao longo da nossa existência, desde os primórdios, quando os humanos viviam isolados, porém deixando registros gravados, até os tempos em que passaram a fazer registros do que viam. E do que pensavam.

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Quinze anos após o fim da Primeira Grande Guerra, a Alemanha vinha se equilibrando como podia. A economia patinava, amargando níveis inflacionários estratosféricos, na casa do milhão por cento, consequente a administrações incompetentes, agravada pela recente Depressão econômica mundial.

O desemprego crônico e crescente provocou um efeito maléfico sobre a população, piorando o nível de pobreza, com segmento significativo da sociedade passando fome. Esse quadro caótico influenciava no comportamento social do povo alemão. Oportunistas surgiram insuflando a população contra aqueles que elegeram como culpados pela crise: os esquerdistas do Partido Comunista e os judeus.

Criaram, assim, um ambiente social insuportável na Alemanha, que se tornou um caldo de cultura rico em ódio. E acabou gerando uma crise sem precedentes em sua história. O ódio passou a ser o estímulo maior para as pessoas comuns, influenciadas pela propaganda política de ambos os lados. Todos os dias aconteciam escaramuças, agressões e perseguições por motivos ideológicos.

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Em 1933, Adolf Hitler assumiu os desígnios da Alemanha e do povo alemão, após o seu partido, o Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães – NADP, ter alcançado a maioria do parlamento alemão, o Reichstag, em eleições democráticas.

Todavia, como o número de cadeiras não superou a metade do parlamento, Hitler teve que fazer uma coligação com um partido menor. E por ironia do destino os nazistas tiveram que se coligar com o Partido Comunista. Justamente com os comunistas, que eles execravam e combatiam como inimigo maior, só perdendo para os judeus, a quem eles odiavam.

O Partido Comunista, então, garantiu a maioria do NADP no Reichstag. E só assim Adolf Hitler, líder (führer), pode reclamar ao Kaiser Himdenburg, presidente da Alemanha, o cargo de Chanceler (chefe do governo). Foi nomeado na noite de 31 de janeiro de 1933.

Hitler liderou o seu partido nessa conquista após uma década de proselitismo baseado no ódio. Ódio aos partidos da esquerda ideológica, a quem atribuía a má-administração do país.

Ódio aos judeus, em quem jogava a culpa do desastre econômico, e a quem creditava o fato de ter aceitado um armistício desfavorável à Alemanha em 1918, quando ainda teriam forças para continuar guerreando.

Ódio também aos franceses e ao Tratado de Versalhes, que humilharam internacionalmente a Alemanha e seu povo, tomando do território alemão uma área rica em carvão mineral na fronteira com a França, que passou a administrar a produção de tão crucial fonte de energia. 

O Tratado de Versalhes também proibiu a Alemanha de ter exército para se defender. Proibiu força naval que tivesse navios de grande calado. Proibiu a formação de uma força aérea.

A intenção dos países aliados – França, Inglaterra e Estados Unidos – foi limitar o arsenal de guerra da Alemanha por um longo tempo. Este era um país aguerrido e belicoso que nos últimos séculos havia protagonizado guerras desastrosas com seus vizinhos, muitas delas sem justificativa para algo mais que um simples conflito diplomaticamente contornável.

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Ao longo de sua carreira em direção ao poder, Adolf Hitler conquistou a maioria do povo alemão. A princípio, boa parte pela adesão às suas ideias, quase todas de iniciativas bélicas: eliminação de judeus e esquerdistas; criação de forças armadas; retomada de territórios e conquista de países ao leste, visando subjugar o povo russo. A Rússia seria o celeiro da Alemanha, e seu povo seria escravo dos alemães.

A propaganda maciça sufocou o alemão médio, dando a impressão de que os nazistas eram imbatíveis, que tinham que se conformar com eles. Com o tempo, o ambiente social ficou sufocadamente nazista, e aqueles que não comungavam com as suas ideias aderiram por medo de serem retaliados.

Em sua pregação, Hitler conquistou também ou muito mais a elite alemã, tanto a nobreza como o alto empresariado. Aqueles, por enxergarem nele a oportunidade de retomar a importância perdida. Já os empresários do ‘alto clero’ vislumbraram nele a oportunidade de melhores negócios, com o fim do caos em que se encontrava o país. Para tanto, fizeram vista grossa para toda a arbitrariedade do governo contra os opositores, vítimas da ascensão nazista e o verdadeiro terrorismo de Estado que o regime criou.

Assim que Hitler e o NADP assumiram o poder passaram a fazer tudo o que haviam ameaçado ao longo de década e meia. Um dos seus primeiros atos tornou proscritos os partidos de esquerda, prendeu comunistas e judeus, internando-os em campos de concentração.

O apoio incondicional da elite empresarial alemã e o domínio do parlamento permitiram uma melhora da economia da Alemanha. Dominou a inflação, passando a gerar empregos, mesmo que à custa de insegurança trabalhista e social.

Amparado pelo parlamento, o nazismo também interveio e aparelhou o Poder Judiciário da Alemanha, afastando magistrados independentes, substituindo-os por aqueles afinados com o pensamento do führer. Com esse ato, Hitler extinguiu a democracia alemã, totalitarizando o seu poder. A partir daí, passou a esticar a corda: decidiu avançar aos poucos sobre as proibições estabelecidas no Tratado de Versalhes.

Seguindo o roteiro traçado por si próprio no livro ‘Minha Luta’, escrito na prisão com a ajuda de Rudolf Hess, ele primeiro organizou um exército clandestino, seguido do aparelhamento da aeronáutica e da marinha. Aos poucos, as forças armadas alemãs foram “oficializadas” e passaram por um processo de fortalecimento organizado por Hermann Göring por ordem do führer.

Como os Aliados fizeram vista grossa, em 1936 ele invadiu e retomou o Território da Renânia, então invadido pela França que queria maior substância no pagamento da dívida de guerra estipulada no Tratado de Versalhes. A Renânia é aquela região rica em minas de ferro e carvão até então administrada pelos franceses.

As potências mundiais haviam declarado zona desmilitarizada e pelo Pacto de Locarno a Alemanha estava proibida de manter tropas no território. Para invadir a Renânia, Hitler tomou a decisão contrariando seus generais, pois estes sabiam que não tinham exército suficientemente forte e capacitado para tal, caso a França reagisse.

Mas Hitler blefou, os franceses acreditaram e abandonaram o território sem reagir. Os Aliados signatários do Tratado de Versalhes reagiram com muito barulho, mas não tomaram nenhuma medida efetiva. Hitler, então, sentiu-se fortalecido para novas e semelhantes aventuras, além de esticar a corda ainda mais.

Em março de 1938, anexou a Áustria. Em março de 1939, anexou a Tchecoslováquia. E em setembro de 1939 invadiu a Polônia, com a cumplicidade da comunista (outra vez!) União Soviética, causando o maior desastre bélico que a humanidade já viu, com várias dezenas de milhões de mortos.

A história demonstra que essa Grande Guerra poderia ter sido evitada se as potências ocidentais tivessem sido vigilantes e atuantes em defesa da ordem mundial.

Hitler testou os instrumentos democráticos a partir do momento em que assumiu o poder. Com a leniência generalizada, rapidamente subjugou todas as instituições, eliminou a oposição, extinguiu a liberdade de opinião e instituiu a censura à imprensa.

O resto é o que se viu depois, com o fim da paz no mundo e a morte de milhões de pessoas, mortes que não aconteceriam se aqueles com algum juízo tivessem controlado o louco em tempo hábil.

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Subversão (do termo latino subversione) é uma revolta contra a ordem social, política e econômica estabelecida vigente. Pode manifestar-se tanto sob a forma de uma oposição aberta e declarada, como sob a forma de uma oposição sutil e prolongada.

Desde que assumiu a Presidência da República, Jair Bolsonaro vem fazendo ameaças diárias de interferir nos outros poderes, especialmente no Supremo Tribunal Federal. O assédio é grande e crescente, desde que o legislativo aparentou já ter sido comprado para lhe garantir que não haverão surpresas constitucionais.

Desde o início de seu governo, o presidente vem estimulando abertamente o motim entre as polícias militares estaduais. Essa foi a mensagem transmitida pela Polícia Militar de Pernambuco, na recente manifestação pacífica contra Bolsonaro.

Como que fazendo parte de um plano sinistro de poder totalitário, o presidente vem promovendo o aparelhamento político da Polícia Rodoviária Federal, da Polícia Federal e até mesmo das Forças Armadas. Desde o início do governo, ele vem testando a paciência de quem tem juízo.

Ele diz o que não pode num dia, no outro recua e desdiz o que havia dito. Porém, já é perceptível um padrão: a cada pronunciamento, eleva o tom da ameaça da vez anterior.

A tática adotada para impressionar o público, para demonstrar que tem capacidade para dominar o país, é bastante manjada. É a mesma técnica do adolescente do “sem querer querendo” para conseguir as coisas. Começa testando a autoridade dos pais, dizendo o que não deve e recuando, pedindo desculpas, e aos poucos vai se impondo no que não é permitido, até os pais perderem definitivamente o controle sobre ele.

Bolsonaro começou soltando balões de ensaio, que a princípio eram aparentes lapsos. Depois passou a fazer declarações em tom de brincadeira. Depois, declarações afirmativas. Dizia o que queria e analisava a repercussão do que disse. Como nunca houve resposta à altura, hoje ele profere ameaças de soltar o Exército contra quem a ele se opuser.

É o que se observa na atual crise que criou dentro das Forças Armadas, em sua escalada de anúncios de que POSSUI AS FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS. São muitas as evidências: manifestações políticas em frente a quartéis.

Manifestações políticas com a exibição de oficiais generais da reserva. Como o exército não se opôs, passou então a fazer manifestações políticas com a exibição de oficiais generais da ativa.

Passou a proferir declarações de que “é o MEU Exército”, dando a entender que a respeitável instituição militar não é uma instituição de Estado, senão de SEU governo. Deixando claro que as Forças Armadas farão o que ele mandar. Que elas são comprometidas exclusivamente com ele, o presidente da República. E desse jeito ele tem sido tolerado. Só que a tolerância atingiu níveis de irresponsabilidade.

Como desde que começou nunca foi desmentido, e as Forças Armadas nunca o corrigiram, declarando que não, elas não pertencem a esse ou aquele presidente, e que o seu compromisso é com a Constituição, ele chegou a níveis insuportáveis de retórica. Agora explicitamente anuncia ser o “dono” dessas entidades.

No episódio mais recente, Bolsonaro arquitetou mais uma forma de desmoralização do Exército: levou um general da ativa para participar de manifestação política de ampla repercussão nacional, o que feriu o código disciplinar da Arma. E depois avisou que o general não poderá ser punido, pois é gente sua.

É grave a crise que o presidente criou. A não-responsabilização desse militar será um grave e perigoso exemplo para a caserna. A mensagem que está sendo transmitida é que podem fazer o que quiserem, pois não haverá punição. Isso será a desmoralização do Alto Comando das Forças Armadas! Logo assistiremos a sargentos liderando motins nos quartéis, manifestações contra seus comandantes.

Pergunto: por que é que o presidente está querendo desmoralizar o Exército, ao interferir na punição disciplinar do general Pazuello, comprometendo a hierarquia nas Forças Armadas? Será que ele quer vingar-se por no passado ter sido punido pelo Código do Exército e ter sido praticamente expulso da corporação por ser inapto para a carreira militar? Ou será algo mais sinistro: para criar um Estado totalitário às custas do desvirtuamento das Forças Armadas, subjugando-as à sua vontade? É uma possibilidade. O que o Brasil ganhará com essa atitude? O que as Forças Armadas ganharão?

Em 1964, sargentos promoveram a insubordinação dentro das Forças Armadas. A principal consequência foi a derrubada do presidente João Goulart. Haverá clima no Brasil para um novo golpe?

A HISTÓRIA SE REPETE MESMO COMO FARSA? por José Mário Espínola

Bolsonaro ao lado do deputado Arthur Lira Foto: Reprodução Redes Sociais

Bolsonaro com Artur Lira, candidato do Planalto para presidir a Câmara (Foto de redes sociais)

Após o Supremo Tribunal Federal ter feito valer a Constituição brasileira, a quem cabe defender, e ter assim decidido que seria inconstitucional a reeleição dos atuais presidentes David Alcolumbre, do Senado e do Congresso, e Rodrigo Maia, da Câmara Federal, percorreu o Brasil o maior frisson, causado pela especulação sobre quem serão os nomes que irão substituí-los nas respectivas Casas.

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