DORES E DORES, por Babyne Gouvêa

Retrato pintado por Pamela Castro (Imagem copiada de observatoriochega.com.br)

Sem vã filosofia, qualquer dor é incômoda. Dor física, dor emocional e tantos outros tipos de dor. Acredito ser unanimidade essa concepção.

Quando jovens ao perdermos um páreo por um paquera, dói um bocado. Numa festa, a frustração acontece quando não somos convidados para uma contradança. Ficamos a ver navios, questionando o motivo de não ter recebido o convite.

Nas escolhas alguém sai preterido. Se há vida, há disputa. No âmbito afetivo as seleções existem e muitas vezes maltratam. Esse tipo de dor pode acontecer em vários momentos da existência. Poucas vezes essas dores são questionadas, mas muitas vezes são armazenadas.

Um dia elas eclodem, seja na maturidade ou em qualquer outro instante. Esses exemplos de dores triviais são administráveis e muitas vezes tolos. Nada que um desabafo com um amigo não resolva.

Nesta semana estive em visita ao Hospital Napoleão Laureano, como tímida colaboradora da sua manutenção. Ali sim, existe dor de dimensões inimagináveis. Só sabe quem é refém da doença que o leva àquele lugar. Uma vez lá aproveitei para observar o ambiente físico e profissional.

Os vários especialistas que lá trabalham falam uma mesma linguagem: acolhedora. Serventes, funcionários burocráticos, copeiros, enfermeiros, médicos, todos sem exceção, são humanitários. Sempre com um sorriso nos lábios, eles atendem os necessitados sem maçada.

Afago é um fármaco eficaz ao enfermo. Auxilia consideravelmente a terapia. A dor se torna atenuada. Em conversa com alguns pacientes percebi serenidade em suas palavras, com sinais de segurança e alívio. Como se aquele hospital fosse seu porto seguro. Ali estavam protegidos.

O coletivo de dores é vasto. Este campo está sempre minado, basta viver. É acionado em diferentes graus a depender da circunstância. Dores dominadas e dores incoercíveis convivem conosco. Alguns indivíduos têm mais defesa, são mais resistíveis; outros são mais frágeis.

Dor física, dor emocional, dor da alma, dor da vida…difícil elencar as modalidades desse sofrimento. Há quem aprove a afirmação: “A dor é inevitável. O sofrimento é opcional”. Há controvérsias.

VACINAS DE VENTO? por Eurípedes Mendonça

Eurípedes e o famoso verso de Pinto de Monteiro, em Monteiro, no Cariri Paraibano

Confesso desconhecer o porquê de a mídia denominar de “Vacina de Vento” aquela em que o vacinador, inescrupulosamente, não injeta o conteúdo vacinal no músculo do braço do paciente.

A falha é que o criminoso vacinador não aspira a vacina para o interior da seringa, que logo fica apenas com o ar na parte compreendida entre o bico e o êmbolo da seringa. A seguir, injeta-o, em vez de vacina, na enganada e vulnerável vítima.

Não existe vento e sim ar atmosférico no interior de uma seringa. Recorrendo aos conhecimentos de Física ministrados no ensino médio, fica patente que a manchete “Vacina de Vento” não tem sustentação cientifica. Explico: no interior de uma seringa, cujo conteúdo é inexistente, ou seja, não foi colocado nela a vacina, inexiste vento e sim ar atmosférico.

Simples assim, como me ensinou o experiente professor Pelágio Nerício. Perguntado, ele se empolgou e começou a discorrer sobre os oito tipos de vento. Pra ser sincero, só me interessei pela paraibana brisa, notadamente por encontrá-la em João Pessoa.

Pelágio e os melhores dicionaristas concordam: “Vento é o ar atmosférico em movimento natural”. Logo, ensina o docente, a diferença entre vento e ar atmosférico é a movimentação da matéria. A diferença é mais de natureza física do que química. A citação da palavra ‘matéria’ ativou minhas conexões neuronais e lembrei-me de recorrer a um verdadeiro Professor de química, no caso José Carlos Godoi, pois, apesar de habilitado pelo Mec nesse campo do conhecimento, não me considero um professor de química.

Segundo o professor Godoi, a Química atesta que o ar e o vento são compostos da mesma matéria. Fisicamente, a diferença é a presença de movimento, presente no vento e ausente no ar atmosférico. E arrematou Godoi: “Logo, se um vento fosse introduzido numa seringa, imediatamente perderia o movimento, perderia sua identidade. Mudaria de vento para ar”. Assim, se essa matéria (que pesa 1,43g/L) fosse introduzida no músculo deltóide do paciente, seria sempre ar e nunca vento.

Conclui-se, portanto, que do ponto de vista científico – na química e na física – a expressão ‘vacina de vento’ é imprópria. O recomendável seria, indubitavelmente, ‘vacina de ar’. Mais precisamente, ar atmosférico.

VACINA DE VENTO OU VACINA AO VENTO?

Espero ter convencido o leitor de que cientificamente é impossível a existência de vento numa seringa. Quem insistir precisará de uma urgente assistência psiquiátrica (onde estaria o dr. Joao Leonardo Ribeiro Moraes?), pois configurar-se-ia um delírio patológico.

Só há uma maneira de manter o vocábulo “vento” no interior de uma seringa, usando a linguagem poética e os recursos do nosso vernáculo. Já dizia o fantástico Pinto do Monteiro, da cidade onde nasce o Rio Paraíba. Ele proclamava, orgulhoso: “Poeta é aquele que tira de onde não tem e bota onde não cabe”. Traduzindo: na prosa, tudo pode!

Mas nem precisa forçar a barra, usando a liberdade poética, para “salvar a existência de vento dentro da seringa”. Basta a mídia substituir ‘vacina de vento’ por ‘vacina ao vento’. Ou seja, uma simples saída preposicional. Mas diria o leitor: “Não seria trocar seis por meia dúzia?”.

Peço licença ao compositor pernambucano Accioly Neto e ao sanfoneiro monteirense Flávio José para argumentar a favor, tomando como fundamento a linda música “Espumas ao vento”. Basta o primeiro verso:

Sei que aí dentro ainda mora um pedacinho de mim
Um grande amor não se acaba assim
Feito espumas ao vento.

Vamos interpretá-lo à luz da temática da vacinação. ‘Um pedacinho de mim” seria a vacina anti-covid; “ainda mora”, habitar o corpo humano; e, “feito espuma de vento”, é mesmo que desaparecer, morrer, ou seja, ao vento, o que reforça a ideia de efemeridade. Logo, vacina ao vento sinalizaria para uma vacina que não ficou, que não foi injetada no organismo, que acabou, enfim, tal e qual diz o verso de Accioly Neto.

Concluindo, literariamente falando, “Vacina, ao vento!”, com virgula e ponto de exclamação, seria um nome cultural e possível candidata à substituta.

Mas a ciência é soberana. Os professores José Carlos Godói e Pelágio Nerício deram o respaldo à tese do autor de que a mídia troque o “Vacina de Vento” por “Vacina de Ar” e, como opção cultural, “Vacina, ao vento!”.

Aos professores do Colégio das Lourdinas de João Pessoa, Godói e Pelágio, e ao meu professor de psiquiatria João Leonardo, rendo as minhas homenagens.

Que os ventos soprem a nosso favor e todos sejam vacinados! Deus nos proteja.

  • Eurípedes Mendonca é médico.