CASAS QUE CONHECI, por Babyne Gouvêa

Casa construída nos anos 1930, no Tambiá, acolhe há mais de 30 anos repartições estaduais

Numa manhã de domingo circulo por alguns bairros de João Pessoa para observar, a título de curiosidade, o estado de conservação de conhecidas residências. Moradas de famílias tradicionais, que tive oportunidade de conhecer na infância e juventude.

Iniciei o roteiro pela casa do Sr. Armando Ribeiro – avô dos meus filhos -, na Rua Monsenhor Walfredo Leal, no bairro Tambiá. Pertence, atualmente, à Defensoria Pública, que a mantém no seu estilo primário. Lá, vivi momentos inesquecíveis.

Satisfeita, sigo em frente. Não encontrar a casa de Clara Otto Amorim, famosa confeiteira de João Pessoa, na mesma rua, esquina com a Rua Eurípedes Tavares, me deixa desolada. Foi posta abaixo. Era tão condicionada àquele lugar ao ponto de sentir o aroma de suas deliciosas guloseimas, ao passar por perto.

Embora desapontada, caminho adiante, ainda na Rua Monsenhor Walfredo Leal. Em frente ao Clube Astrea olho tristemente para a casa abandonada e desmoronada, há anos, da família do Dr. Antônio D’Ávila Lins. Diferentemente dela, a casa vizinha permanece bonita e elegante.

Construída nos anos 30 pelo exportador de algodão Abílio Dantas, foi adquirida nos anos 60 pelo então deputado Inácio Pedrosa. Encontra-se em perfeito estado de conservação, nas mãos de um órgão estadual – Sudema. Afinal, um patrimônio construído com mármore de Carrara em seu interior e outros materiais importados de igual relevância, não poderia ser destruído. Fico aliviada.

Sigo em direção à Rua Odon Bezerra, junção da Rua Monsenhor Walfredo Leal. Vislumbro a morada do conceituado médico pediatra, Dr. João Medeiros, com o fascínio do seu projeto original, nas imediações do Shopping Tambiá. Fico pensando nos murmurinhos das crianças que buscavam a sua assistência.

Parto para a Av. General Osório e observo as velhas casas, alheias à conservação. Fico imaginando aquelas residências com o mesmo estilo arquitetônico, sem recuos laterais ou frontais, com as suas janelas floridas de mocinhas, com os braços apoiados, observando o tempo passar. Esta rua, em particular, me remete à Festa das Neves e agradáveis recordações. Fico triste, evidentemente, em presenciar as ruínas das casas junto às suas histórias. Ainda nesta via, esquina com a Rua Peregrino de Carvalho, observo o prédio da Biblioteca Pública Estadual Augusto dos Anjos, com aparência notável. Admitamos ser uma edificação do século XIX.

Prossigo pela Rua das Trincheiras. Logo no início, em frente à Câmara de Vereadores, me impacto. A casa de um dos membros da família Ribeiro Coutinho, que conheci e guardo na memória, em companhia de amigas de infância, está totalmente esquecida. Aparência flagelada não compatível com o poderio econômico ostentado anos atrás.

Dou continuidade aos olhares na mesma rua. Sinto o semblante entristecer à medida que vejo a deterioração de históricos lares, tão bem mantidos no passado. Um deles foi habitado pelas minhas saudosas Tias Gouvêa, numa época onde ainda havia bondes como meio de transporte. Na mesma via pública vejo a lacuna deixada pela antiga Maternidade Frei Martinho, onde tantos pessoenses ganharam vida. Em contrapartida, em frente a ela, visualizo um acalanto – o edifício bem conservado da atual sede da Reitoria do IFPB, prédio que sediou no passado a Faculdade de Farmácia e Bioquímica da UFPB, como também a Casa do Estudante Universitário.

Passo pela Rua Capitão José Pessoa, ainda no bairro Jaguaribe, e paro em frente à residência do amigo do meu pai, Dr. Fernando Carrilho Milanez. Fico encantada com a exuberância intacta daquela morada que conheci na adolescência.

Sigo na direção da Rua Rodrigues de Aquino e me surpreendo com a inabalável casa do famoso alfaiate italiano, Sr. Mário Faraco. Situada perto da Maternidade Frei Damião, antigo Hospital Paula Marques, contrasta com lares derrocados nas proximidades. Naquela localidade, as casas destroçadas não foram resultados da especulação imobiliária. Provavelmente, estão em mãos de herdeiros, e a vegetação se apossa do lugar abandonado.

Logo à frente, dobro à direita na Av. João Machado e olho um tanto acabrunhada para a mansão decadente do Dr. Odilon Ribeiro Coutinho, muito conhecida pelos animais exóticos, criados no seu entorno, outrora.

Respiro fundo e prossigo. Ainda, na mesma avenida, percebo alternância do estado de conservação de suas residências. Algumas praticamente extintas, outras íntegras, como a do Sr. Luiz dos Santos, bisavô dos meus filhos, ambiente que frequentei em reuniões familiares. Neste passeio noto prédios bem cuidados, que sediam escolas e órgãos públicos, a exemplo do IPHAEP. Mas, o encanto daquela avenida está mesmo na residência incólume do Dr. Luiz Inácio Ribeiro Coutinho, situada em frente ao Fórum Cível Desembargador Mário Moacyr Porto. Esta, em particular, é inesquecível para mim.

Lá passei momentos alegres no amplo jardim e no glamour de cada ambiente, com amigas queridas de infância. A beleza de todos os seus recantos ficou impregnada na minha memória.

Mais adiante, na expectativa de observar um determinado imóvel, resolvo andar pela Av. Maximiano Figueiredo. Chego aonde queria. No cruzamento desta avenida com a Rua Camilo de Holanda encontro a graciosa e impecável Casa Cor-de-Rosa, abrigo do Dr. Bento Pereira Diniz. Motivo para me dar ânimo.

Sigo em direção à Av. Epitácio Pessoa e passo por várias demolições. A mais dolorosa foi, sem dúvida, a morada do Dr. Atílio Rota, em frente ao Posto Santa Júlia. Doeu demais vê-la substituída por um banco (instituição financeira) em estilo arquitetônico totalmente distinto do lar da família Rota. Encontro consolo, um pouco mais à frente, na protegida residência do Dr. Cassiano Ribeiro Coutinho, considerada ícone da arquitetura moderna brasileira no Estado da Paraíba. Projeto de Acácio Gil Borsoi, esta linda e grandiosa residência agrega um jardim projetado pelo paisagista Roberto Burle Marx.

Como antídoto ao malefício que as ruínas me causam, me dirijo aos protótipos de casas belas e bem preservadas, na minha concepção: a imponente casa branca do Dr. João Crisóstomo Ribeiro Coutinho, na Av. Epitácio Pessoa, próxima ao Grupamento de Engenharia. Esta casa possui estilo semelhante ao Georgiano (Casa Branca dos EUA), mas ressalto ser minha a afirmação; e a residência da Fazenda Boi Só, construída no século XIX pela família francesa Boisson. Este patrimônio da cidade de João Pessoa foi residência de várias famílias importantes, sendo a última a ter o título de posse a do Dr. Isidro Gomes da Silva. Situada em local estratégico no Bairro dos Estados é considerada cartão-postal de paisagem antiga salvaguardada.

Finalizo as andanças um tanto entristecida. Casas antigas tão belas e aconchegantes estão desaparecendo do ambiente urbano, dando lugar aos edifícios. Sob meu olhar, a cada casa demolida morre um pedaço da história da cidade. Junto com os escombros do que outrora foi um lar se extinguem histórias e lembranças. Restarão, apenas, as memórias das pessoas que nelas viveram.

Ameaças motivam troca de casa por apartamento

Edifício Manoel Pires, no Centro da Capital (Foto: Wikimedia Commons)

Edifício Manoel Pires, no Centro da Capital (Foto: Wikimedia Commons)

Meus pais aderiram ao apartamento quando notaram o que chamam de pouca utilidade dos espaços abundantes de uma casa. Com os filhos casando ou estudando fora, então, a casa ficou imensa para eles. Fora quarto de dormir, banheiro, sala de tevê e a cozinha ampla o bastante para caber mesa de refeição, os demais cômodos foram declarados inúteis pelo casal.

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Feito Gonzaga, também tenho um sítio que anda comigo

Casa da Praça do Colégio, última residência em Bananeiras

Casa da Praça do Colégio, última residência em Bananeiras, que terá sua história contada no próximo capítulo

Parei sábado passado na penúltima residência da família Barbosa da Nóbrega em Bananeiras. Casa da Rua Coronel Antônio Pessoa, a principal do lugar. Casa grande e comprida, mas de quintal minúsculo e ainda por cima com metade do terreno tomado por um galinheiro e um quarto de despejo. Para compensar, talvez, o Professor Vicente comprou um sítio a três léguas do cidade. Para quem antes morou no campus de uma Escola Agrícola, pense na festa!

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Mudanças e moradias. Da casa do campus ao centro da cidade

A Casa da Escola, no Campus da UFPB em Bananeiras

A Casa da Escola, no Campus da UFPB em Bananeiras

Depois da casa do antigo Posto Agropecuário, do Ministério da Agricultura, e da casa da Ladeira do Paravéi, que pertencia a Nossa Senhora do Livramento, moramos em mais três casas em Bananeiras. Findo o contrato com a santa padroeira, a família Barbosa da Nóbrega foi se arranjar em outra moradia boa. Boa é pouco. Pra lá de ótima.

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Mudanças e moradias. De Bananeiras a João Pessoa

Casa do antigo Posto Agropecuário, hoje residência universitária do Campus da UFPB em Bananeiras

Casa do antigo Posto Agropecuário, hoje residência universitária do Campus da UFPB em Bananeiras

Se eu pudesse comprava todas as casas em que morei! Todas, todas mesmo. Mesmo aquelas em que sofri sozinho – ou junto com meus pais e irmãos – alguns momentos ruins. A exemplo do que aconteceu na casa grande do antigo Posto Agropecuário de Bananeiras, onde passei mais de um ano de minha infância entrevado, em cima de uma cama.

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