A UM CIDADÃO CHAMADO LULA, por Francisco Barreto

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Prezado senhor,

Tomo a liberdade de lhe escrever. Vosmecê não me conhece. Não tem importância. Sou apenas um nordestino, um campinense de vários costados.

Meus ancestrais pairaram na Vila Nova da Rainha no final do século 18 e, por volta de anos 1800, meus sétimo e sexto avós, o Capitão de Ordenanças José Nunes Viana e Baltazar Luna, comerciante, abrigaram o revolucionário Joaquim do Amor Divino, o grande Frei Caneca, e com este foram presos e recambiados para o Recife. Liberados, retornaram às terras da Borborema.

Herdei deles a minha alma carbonária de insurrecto. Fui preso, expulso e exilado, proibido de ter emprego público à conta de ditadura militar.

Pessoalmente, nos conhecemos em 1980, no Recife, quando da primeira greve dos professores em Pernambuco. Admirei sua bravura ao defender a vilipendiada categoria da Educação no governo Marco Antônio Maciel. Trabalhava naquele governo. Com Everardo Maciel (Finanças) e Joel de Holanda (Educação), modestamente acompanhei (do Planejamento) uma reunião com os grevistas na qual vosmecê estava presente num apoio intersindical e silente, disciplinado, participou.

Anos depois, em 1989, parlamentar do MDB em João Pessoa, convidados por Luís Guschiken, eu, Potengi Lucena e Delosmar Mendonça fomos convidados para aderir à sua campanha. Agradecemos e permanecemos leais ao Dr. Ulysses Guimarães, um homem certo numa hora errada. Teve uma imerecida e injusta derrota. No segundo turno votei em vosmecê. Continuei votando. Em 1994, 1998 e em 2002. Vinte anos depois, renovei a minha confiança.

Passei a acompanhar com muita inquietação os seus passos. Para a minha alegria, em que pesem os meus desagrados com o PT, com a minha desprezível contribuição, votei e bradei pela derrota de Bolsonaro e o espectro de uma ditadura fascista. Vivi para ver essa histórica e sofrida vitória.

Hoje, reconheço e me cumpre louvar a sua coragem e a sua imensurável importância ao varrer o lixo bolsonarista. Tenho a plena convicção, apesar dos inúmeros e lamentares pesares, que vosmecê era o único capaz de empreender um novo rumo ao país. Venci a minha indignação e mais, tenho a certeza, a sua trajetória hoje é muito mais avassaladora e vai muito além de sua precária âncora partidária.

Enxergo-lhe no menino de Garanhuns, com o coração nordestino e capaz de exibir grandes gestos de reconciliação com as suas origens, apesar do verniz paulista. São Paulo lhe deu o palco, mas a sua história é a de pau de arara pernambucano. O que me orgulha, certamente, é saber que quem conviveu com a miséria e a fome na infância tem cicatrizes profundas e a certeza de que nasceu para viver o que tiver que viver e compreender que os tormentos de ontem e de hoje não despedaçarão a sua história.

Os nordestinos anônimos, como eu, devotam-lhe fé e esperança. Não nos falte.

Hoje, tenho que lhe confessar que admiro a sua grandeza a flor da pele. É sua tarefa e sei que a fará e vai juntar os cacos provocados pela bestialidade e selvageria que atingiu moralmente e fisicamente os poderes da República. Existem pessoas que nascem e morrem sem nada saber porque existem outras que sucumbem a catástrofes humanas e políticas e renascem mais fortes. Vosmecê é uma destas.

Cuide apenas das ciladas dos fetiches do Poder, dos tapetes vermelhos, dos próximos amigos ou inimigos, e outra vez suba no Pau de Arara e sacuda a poeira das estradas que podem lhe cegar.

Hoje, diferente de ontem,47 volto a confiar em vosmecê. E pise com calma no seu chão pleno de vidros estilhaçados pela barbárie. Aja com prudência e faça o que toda criança nordestina sabe: mingau de milho se come devagar e pelas bordas para não se queimar. Deixe o resto esfriar.

A vida nos ensina que a brutalidade, ignorância ou intemperança – ou a soma delas – é prato que se come frio.

Olhe para os lindos céus e horizontes do Planalto Central, abra o seu coração. O resto a Providência Divina o fará. O seu povo aguardará os seus grandes gestos de Magistrado desta sofrida e pobre Nação.

Tal como Antônio Conselheiro, empunhe a sua cruz contra os impuros.

Com os meus respeitos de anônimo cidadão nordestino e campinense, despeço-me.

Francisco Barreto