O HOMEM DE CELULOIDE, por José Mário Espínola

Andrés e o filme que vai exibir e comentar hoje no Liv Mall, em João Pessoa

O tipo impressiona. Sujeito alto, boa compleição, louro de olhos azuis. E uma voz tronituante, de muita personalidade. Associados ao seu jeito carismático, isso faz com que nunca passe despercebido por onde anda.

Cultura fabulosa, vem dedicando toda a sua vida ao cinema. Literalmente: passa a maior parte do tempo dentro das salas de projeção, saindo de uma para entrar noutra, pois a Sétima Arte é o seu ofício.

Assiste a um filme com olhos profissionais, analisando já a partir da composição da platéia, desde a bilheteria. Semelhante a um bom sommelier, degusta cada filme saboreando todos os detalhes: câmera, direção, fotografia, atuações, trilha sonora, enredo, composição da platéia. E ao final dá a sua nota. Como um crítico rigoroso, dificilmente dá uma nota 10.

Exibe para a sua grande platéia, espalhada pelos cineclubes do Brasil, os melhores filmes da atualidade. Assim como outros lançados no passado, sempre excelentes películas. Não gosta do cinema brasileiro, e é fã declarado do cinema argentino, que diz ser um dos melhores o mundo.

Como um mestre de sala, comanda seus grupos com mão de ferro, exigindo que se limitem ao tema cinema, excluindo os recalcitrantes, após terem sido advertidos. Pois às vezes se comporta como um professor rigoroso, enquadrando aqueles alunos que esquecem as boas maneiras na sala de aula. Mas, assim como toda classe de colégio tradicional tem um mestre severo, também sempre tem um aluno travesso, o qual forma um binômio com o professor, que resulta sempre em boa amizade.

Fidalgo, possuidor de gosto exigente, como bom gourmet ele aprecia pratos sofisticados, sempre acompanhados de vinhos finos. Monarquista, respeita a democracia e abomina extremismos, tanto de direita quanto de esquerda. Como todo príncipe, ele tem a sua corte, com composição semelhante às dos nobres da Renascença. Tem de tudo que é personagem.

Nas suas apresentações, às vezes ele se entusiasma e escorrega na linguagem, deixando a platéia corada. Mas é o seu estilo, o seu valor é maior do que a boca candidata ao sabão.

Em alguns momentos tenta ser rigoroso, brabo mesmo. Porém, na realidade ele tem um coração de chantilly. Sempre muito solidário e preocupado com as pessoas, eu acho que ele é, na realidade, um socialista enrustido. E dos bons!

Enfim, este é Andrés Von Dessauer, o nosso mestre de cinema. Tem nome de príncipe bávaro, nasceu chileno e é brasileiro por adoção. Andrés hoje é cidadão do mundo. Ora nos parece um barão prussiano. Ou um conde do País de Gales. Ou um príncipe degredado. Já estudou até na Alemanha, onde teve a oportunidade de conhecer a Rainha Elizabeth II, recém-falecida.

Já trabalhou em muito países, mas escolheu o Brasil como lar. É possuidor do melhor museu de arte erótica da Paraíba, em cuja calçada encontramos um jacaré gigante, feito de cimento, que ele trouxe sabe lá de onde, e sabe lá como. E que crianças e pessoas simples pensam ser real.

Considerando a sua boa saúde, a excelente forma física, a sua resistência incrível que o leva a suportar maratonas de filmes, em cidades como João Pessoa, São Paulo e Rio de Janeiro, nas quais é muito conhecido, e levando em consideração a sua afinidade com o cinema, cheguei à conclusão de que Andrés não é feito de tecido humano: ele é feito de celulóide, o mesmo material dos filmes cinematográficos acomodados em rolos, para serem exibidos nos cinemas.
***
Esse é, portanto, o nosso príncipe bávaro. Por tudo isso é que ergo um brinde para o nosso grande mestre, Andrés Von Dersauer, com champagne Veuve Clicquot, brût: longa vida ao príncipe!