PAQUERA ABENÇOADA, por Babyne Gouvêa

À Rosana Maciel, minha amiga estelar

Bençãos de São Felix no ano de 2022 na Basílica da Penha

Imagem meramente ilustrativa (Foto: Rafael Furtado/FolhaPE)

Jovem católica, frequentadora assídua de missas semanais, Afrodite sempre se sentiu entusiasta desse rito. Os efeitos físicos e comportamentais, naturais da adolescência, não a afugentaram desse hábito religioso.

Sempre ia com uma amiga para esse ato de fé na Capela do Colégio Pio X, em João Pessoa. Entre as trocas de confidências confessaram ser observadas por rapazes frequentadores da mesma igreja. Descobriram que havia olhares comuns das duas para o mesmo rapaz. Decidiram disputá-lo.

Na fila da comunhão olhariam para Apolo – dono de beleza admirável. Num trato inusitado, desistiria do mancebo quem não despertasse o seu olhar.

Assim os dias de missa eram aguardados com bastante ansiedade. A escolhida tratou logo de contar a novidade à outra amiga, vizinha de residência do cobiçado moço. As perguntas eram sucessivas – como se chamava, que lugares frequentava… O interesse aumentava à medida que desbravava o seu currículo.

A semana que antecedia o ato litúrgico girava em torno da indumentária a ser usada para impressionar quem deveria ser impressionado. A originalidade era imprescindível para chamar a atenção. Os cosméticos foram usados para diminuir o seu aspecto imaturo. E nada de exagero para não mascarar as suas características genuínas – marca da sua imagem.

O Padre, conhecedor do seu público semanal, começou a desconfiar do comportamento adulterado da moça. Após se certificar da intenção dela, chamou-a para uma conversa na sacristia. Passou-lhe um sermão e uma recomendação expressa: “A concentração tem que estar em Deus, menina”.

Ela permaneceu inquieta, todavia. Não pretendia desistir facilmente. Planejou e deu certo: na hora de receber a hóstia fixava o olhar no pároco e o contornava depois de recebê-la – momento em que fitava o seu intento. Passou a se acomodar em bancos próximos ao seu alvo. Bastava o sacerdote dar as costas para os fiéis, os olhares se cruzavam entre os enamorados.

O templo ganhou retoques majestosos no olhar da jovem. Os santos esculpidos e distribuídos na lateral da nave paroquial se tornaram brilhantes reluzindo cores nunca dantes vistas. Esse encanto contrastava com a ideia de castigo religioso, temido por ela.

Sentiu necessidade de saber o grau da sua infração. Foi então que consultou uma amiga católica fervorosa. Claro que foi absolvida.

O ritual foi mantido semanalmente, entre solfejos efusivos durante o caminho até a igreja. Para surpresa da mocinha, o sacristão começou a observá-la com segundas intenções. Esse moço passou a criar histórias maliciosas para perturbar os adolescentes enamorados. Em vão.

Afrodite continuou contrariando as advertências por um certo tempo. Achava essa insubordinação atraente e aprazível. Deu certo, sua paixão foi correspondida e se alongou pela vida afora, mostrando que aquela paquera fora comprovadamente abençoada.