O menino que eu fui aguardava com certa ansiedade as noites do sábado, em Pilar, agreste da Paraíba. Às 20 horas, em ponto, Seu Zé Ribeiro mandava o ajudante Jiló apagar umas poucas lâmpadas do Mercado Público, onde, momentos antes, as famílias locais haviam arrumado cadeiras domésticas para mais uma sessão de cinema.
O Cine Ideal, que ele faria tijolo por tijolo, cadeira por cadeira, ainda não havia sido construído. Na área do Mercado reservada ao comércio de cereais e farinha (o que ajudava na brancura da tela pregada a uma das paredes) quem não levava cadeira de casa arranjava-se com as bancas da feira mesmo.
Ambiente escuro, a sessão iniciava-se com a projeção de alguns desenhos animados, trailers de atrações futuras e com o futebol do Canal 100, hora de gritos e aplausos em todas os cinemas do País e, assim também, no espaço acanhado da pequena Pilar. Isso, apesar do enorme atraso na exibição dos jogos.
Iniciada a projeção do filme principal, a sessão era interrompida e Jiló tratava de reacender as lâmpadas do recinto enquanto Seu Zé fazia a primeira troca de rolos na velha máquina de 35 milímetros. Havia quem não gostasse da interrupção. Uma ou outra vaia, porém, podia ser punida com a expulsão do local e a devolução do dinheiro empenhado no ingresso.
Mais do que o olho de lince do saudoso cinemeiro, capaz de identificar as molecagens de Sapé e Paulo Barbosa onde quer que sentassem, era o medo de perder o seriado aquilo que fazia os mais impacientes aguentarem as três seguidas trocas de rolos do filme do dia.
Depois disso, estava armado o palco para a atração que levava a meninada do meu tempo ao cinema improvisado de Seu Zé: “Os Perigos de Nyoka”, o seriado que iríamos comentar até o capítulo seguinte, na semana que adviria.
Ah, quantas noites de sono a bela Nyoka não nos fez perder. E, para piorar, naquela fase de crescimento em que a visão de um belo par de pernas não nos trazia os pensamentos mais puros. As da moça, vistas de determinados ângulos, superavam sua bravura.
Ficar em episódio passou a definir qualquer situação de risco vivida pelos da minha geração, fosse a perspectiva da nota ruim na escola, a da arenga dos pais, ou a do temido fora da menina a quem se pretendesse namorar. Ao contrário de Nyoka, que escapava de qualquer perigo, nem sempre conseguíamos vencer todas as encrencas nas quais nos metêssemos.
Mas, sem maiores problemas, a vida fluía de domingo a domingo. Às quartas-feiras, Seu Zé apanhava, manhã cedo, o trem da Great Western para o Recife de onde voltava, à noite, com as fitas alugadas da Metro ou de outras companhias distribuidoras. Ele escondia a sete chaves os títulos novos até a exibição dos cartazes nos postes e pés de fícus da cidade, a partir das feiras livres dos sábados e ao cabo das missas matinais dos domingos, celebradas pelo Padre Gomes.
Dona Sílvia, a professora, torcia pelos filmes românticos que os mais novos detestavam. Queríamos mesmo eram os sopapos de Durango Kid, Roy Rogers, ou do Zorro. Não aquele de capa e espada, mas o de dois revólveres com seu cavalo Silver e seu companheiro, o índio Tonto. De uma coisa todos tínhamos certeza: Nyoka, a cada novo capítulo, seria a cereja do bolo. Depois dela, tudo terminava.
A série foi um sucesso mundial lançado em 1942 pela Republic Pictures, de William Witney, anos antes de vir eu ao mundo. Kay Aldridge encarnava a personagem inspirada no romance “Jungle Girl”, de Edgard Rice Burroughs. Era, portanto, uma Tarzan de saia. E que saia…
O seriado que eu vi desenrolou-se em 15 capítulos semanais com duração total próxima dos 300 minutos. Sua realização ocorreu de junho de 1942 até abril de 1952. Que saudade.
OS PERIGOS DE NYOKA, por Frutuoso Chaves
Morre Rubén Aguirre, o Professor Girafales do Chaves
O ator mexicano Rubén Aguirre, famoso por representar o personagem Professor Girafales, do seriado Chaves faleceu aos 82 anos. A morte foi noticiada por seu companheiro de elenco Edgard Vivar.
“Meu professor favorito descansa em paz… Hoje meu grande amigo Rubén Aguirre parte deste plano. Sentirei muitas saudades”, publicou ele em sua conta de Twitter junto com a última foto que tiraram juntos.
(da Agência Brasil, com Agência Telam)