MINHA HISTÓRIA COM BIU RAMOS

Biu Ramos com os jornalistas Nonato Guedes e Gonzaga Rodrigues (Foto: Os Guedes)

Biu Ramos é jornalista por excelência e essência. Uso verbo no presente porque morte alguma seria capaz de lhe subtrair predicados tão naturais. Além do mais, ele é membro insubstituível do meu restrito clube de ídolos do jornalismo e da literatura.

E pensar que um dia ousei confrontá-lo, quando ele colunava em O Norte e o Correio me tinha como editor. Coisa pro comecinho dos 80, se a memória pouca não me trai. Biu, na contundência de sempre, por algum motivo deu uma traulitada daquelas no concorrente que ameaçava a liderança do à época todo poderoso carro-chefe dos Diários Associados na Paraíba.

Respondendo pelo jornal que me dera cabimento, escrevi editorial que o próprio Biu, na tréplica, qualificaria – e bem – de ‘furibundo’. Especialmente em razão do título infeliz da peça: ‘Linhas tortas’. Juro: não foi alusão às pernas de Garrincha do nosso craque do colunismo político. Irrefletidamente, apenas tomei emprestado de livro do Major Graça que estava relendo.

De qualquer modo, o troco de Biu deixou-me sem graça. Ele inferiu uma nada sutil referência ao seu problema físico. Fiquei muito mal por não ter atinado para o detalhe antes de intitular o texto. Arrependo-me até hoje não ter pedido desculpa. Somente assim ele saberia quem escreveu o editorial torto. Saberia ainda ter sido alguém que jamais poderia tratar de forma preconceituosa qualquer pessoa com deficiência. Até pelo simples fato de também ser uma.

Não fiquei apenas sem graça. Também não encontrei ânimo de esticar a corda. Seria inútil polemizar. Com ou sem razão, Biu era capaz de sustentar uma boa polêmica por dezenas de edições consecutivas. O próprio núcleo duro do Correio deve ter percebido a inutilidade da peleja. Tanto que algum tempo depois trouxe-o de volta à casa, para oferecer ao leitor o que havia de melhor na praça em matéria de opinião qualificada.

Claro que minha história com Biu não se resume a uma história besta feito essa. Não fui dos seus mais chegados, é verdade, mas me incluo entre as amizades que fizeram bom proveito da proximidade afetiva. Ele foi, por exemplo, um dos meus grandes eleitores quando inventei de disputar a presidência da Associação Paraibana de Imprensa (API) em 1987. Apoiou-me, mesmo tendo do outro lado o seu amigo-irmão Nonato Guedes, então presidente da entidade e apoiador declarado do saudoso Oduvaldo Batista, com quem concorri.

DEFENDENDO JA

Estou com um livro pronto para publicação. Cuida de histórias sobre relações de poder e poderosos na Paraíba. Ficção e realidade misturadas. Em um dos capítulos, uma mais do que gratificante colaboração de Biu Ramos. Que ele cometeu quando enviou carta à coluna que eu assinava no Correio no primeiro decênio do século em curso.

Reproduzo abaixo o que ele escreveu. Escreveu para rebater críticas e insinuações em torno do fato de João Agripino ter sido diretor da construtora Camargo Corrêa, que fez uma das maiores obras viárias da Paraíba ao tempo em que o velho JA de guerra nos governava. 

DIZ AÍ, BIU!

Devo lhe afirmar, meu caro Rubens, com a autoridade que me conferem cinquenta anos de exercício de jornalismo político, que, dos homens públicos da Paraíba, João Agripino foi, insofismavelmente, um paradigma de honradez, dignidade e espírito público, como poucos existiram na Paraíba, a exemplo de José Américo.

Depois que deixou o governo, Agripino ingressou na iniciativa privada indo ocupar uma diretoria no grupo Newton Rique, onde ficou por apenas seis meses, saindo para ser ministro do Tribunal de Contas da União, do qual foi presidente logo após o seu ingresso naquela corte.

Depois que se aposentou do TCU, Agripino foi convidado para uma vice-presidência do grupo Camargo Corrêa. Esta empresa havia executado a pavimentação asfáltica da BR-230, um dos principais marcos de seu governo, numa extensão de 750 km.

Agripino foi duramente censurado por alguns adversários por ter ingressado na Camargo Corrêa, insinuando-se que o emprego seria um prêmio pelas facilidades que teriam havido para execução da obra, esquecendo-se que outras empresas, de igual porte, também concorreram, entre elas a Gutierrez e a Metropolitana.

Os seus críticos também o acusaram de ter preterido empresas do Estado em favor de grupos do sul do país. Agripino, no entanto, não teve dificuldade em convencer a opinião pública de que não seria possível fazer uma estrada daquela dimensão com empresas de pequeno ou médio porte, sem capital de giro, sem equipamentos nem recursos financeiros para cumprir um organograma com prazos rigorosamente estabelecidos.

A Camargo Corrêa, durante o andamento dos trabalhos, chegou a acumular créditos de Cr$ 10 milhões, sem que tenha havido qualquer paralisação ou redução no ritmo das obras. Agripino foi convidado para integrar a equipe de executivos da Camargo Corrêa exatamente pela sua firmeza na fiscalização das obras e sua excepcional capacidade de avaliação dos trabalhos técnicos. Foi por méritos e não por favoritismo ou retribuição de qualquer natureza.

Só pra completar: apesar de ter ocupado os mais altos postos na vida pública e na iniciativa privada do país, João não deixou fortuna pessoal, conforme seu testamento publicado pela revista A Carta. Talvez tenha sido o único político brasileiro que teve o seu testamento divulgado publicamente.

Quando era governador, fez um empréstimo avalizado pelo seu ex-secretário Juarez Farias para comprar o anel de formatura do seu filho Gervásio. Saiu endividado do governo (Cr$ 300 mil) e chegou endividado ao Tribunal de Contas da União, onde se aposentou. Tudo isso está no meu livro ‘O Mago de Catolé’. É só conferir.

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Lembra que confessei ter tirado proveito da amizade? Pois é…

  • Artigo publicado originalmente em 30 de agosto de 2018. Republicado por ser hoje (30) véspera do lançamento de ‘Biu Ramos: Timoneiro da Arca de Sonhos’, de Samuel Amaral, às 19h desta quinta-feira na Livraria União do Espaço Cultural, em João Pessoa

Jornalista lança na 5ª-feira biografia de Biu Ramos

Biu Ramos (Foto: Foto: Felipe Gesteira/Jornal da Paraíba)

O jornalista e escritor Samuel Amaral lança na quinta-feira (31), às 19h, na Livraria A União (Espaço Cultural, João Pessoa) o livro “Biu Ramos: o Timoneiro da Arca de Sonhos” (Editora A União, 2023). A biografia é resultado da dissertação de mestrado do autor, defendida em 2022 no Programa de Pós-Graduação em Jornalismo da Universidade Federal da Paraíba (PPJ-UFPB), sob orientação da também jornalista e Professora Doutora Joana Belarmino.

Severino Ramos Pedro da Silva, mais conhecido entre os leitores como Biu Ramos (1938-2018), foi um dos grandes nomes da história da imprensa, integrante da chamada “era de ouro” do jornalismo paraibano, com atuação marcante na segunda metade do século XX. Negro, de origem humilde e com uma deficiência congênita nos pés, Ramos enfrentou o racismo e uma série de preconceitos até firmar-se como um dos mais admirados textos do colunismo político do Estado, conquistando seu lugar por sua escrita impecável e atenção às questões sociais e políticas do seu tempo.

Ramos se destacou como um dos últimos polemistas da imprensa, com passagens pelos principais jornais do Estado, como Correio da Paraíba, O Norte, A União e O Momento. Também foi correspondente de importantes jornais nacionais, como o Jornal do Brasil e Folha de S. Paulo. Além disso, ocupou diversos cargos públicos, incluindo o de Secretário de Comunicação de João Pessoa, Procurador do Estado, Secretário de Cultural do Estado, diretor da Rádio Tabajara e do jornal A União, tendo enveredado pela carreira política ao se candidatar a deputado estadual em 1986.

Dividido em dez capítulos, 408 páginas, o livro é prefaciado pelo escritor e historiador Bruno Gaudêncio e apresentado pela professora, jornalista e escritora Joana Belarmino. A publicação também comemora o aniversário de Biu Ramos, que, se vivo estivesse, completaria 85 anos em agosto de 2023.

COMENTÁRIOS SOBRE A OBRA

Em “Biu Ramos: o timoneiro da Arca de sonhos”, Samuel Amaral apresenta uma ótima narrativa biográfica. Seu texto é bem construído, objetivo, claro e coerente, demonstrando uma pesquisa profunda que se baseou no rico acervo pessoal do próprio Biu Ramos. Além disso, o autor, habilmente, inclui depoimentos de pessoas que conviveram com o biografado, adicionando camadas de autenticidade e intimidade à narrativa. A precisão e minúcia de Amaral em seu processo de apuração são admiráveis, entregando ao leitor a complexidade que foi seu biografado (Bruno Gaudêncio – historiador e escritor, prefaciador do livro).

O primoroso trabalho da Editora A União entrega ao leitor não apenas a história do jornalista Biu Ramos, mas traz a lume, o nascimento do jornalista investigativo, do jovem e persistente escavador de memórias, Samuel Amaral Veras Bonifácio, que tem a sede pela recuperação do passado da profissão e quer dar a conhecer, através da sua narrativa, os nomes e as cenas desse tempo em que o jornal do dia seguinte fazia sentido e criava opinião na Paraíba (Joana Belarmino de Sousa – professora, jornalista e escritora).

Por várias décadas, Biu Ramos registrou, com sua “metralhadora datilográfica”, os principais acontecimentos e polêmicas na Paraíba. Sua narrativa fluida e apaixonada marcou época no jornalismo paraibano com estilo próprio, conquistando muitos admiradores e desafetos. Entretanto, sua contribuição ao jornalismo ainda não foi devidamente reconhecida pelas novas gerações. A obra de Samuel Amaral corrige esta lacuna na história do jornalismo local, com um texto fundamentado historicamente, envolvente e sofisticado, próprio do jornalismo literário (Glória Rabay – professora e jornalista).

As referências sobre a história do Jornalismo ganham uma obra valiosa: Biu Ramos: o timoneiro da Arca de Sonhos, do paraibano Samuel Amaral, jornalista, pesquisador, escritor. É uma leitura que incentiva o desejo de conhecer e se espraiar pelos caminhos e métodos dos/das jornalistas que constroem o arcabouço da história paraibana. Transitar pela narrativa de Samuel Amaral nos faz compreender a tessitura de acontecimentos políticos, socioeconômicos, vividos e narrados através de uma construção textual que deságua em uma linguagem jornalística clara, simples e objetiva. Biu Ramos fez história e Samuel Amaral registrou! (Suelly Maux – professora e jornalista)

A obra intitulada ‘Biu Ramos: o timoneiro da Arca de sonhos’, da autoria de Samuel Amaral, é uma ode à vida e obra de um dos mais significativos jornalistas e escritores paraibanos, Severino Ramos Pedro da Silva (1938-2018). Sob a perspectiva teórica de Pierre Bourdieu, Biu Ramos foi um profissional em seus estados sucessivos de movimento, capaz de imprimir seu estilo marcante na imprensa paraibana e no fazer literário memorial. Ler é deleite! (Bernardina Freire – professora e presidente da Academia Feminina de Letras e Artes da Paraíba).

  • Texto de divulgação gentilmente cedido por Samuel Amaral