MAMAS OU TUBERCULOSE? por Eurípedes Mendonça

Cinco sinais que podem detectar o câncer de mama masculino

Foto meramente ilustrativa copiada de Folha Vitória

Caro leitor, apesar do título, não será discutida a tuberculose mamária e sim uma consulta médica na qual uma importante característica sexual secundária e uma doença pulmonar estão imbricadas. É um caso verídico, com salpicos de comicidade e potencialmente trágico. Ou nem cômico nem trágico? Leia e ao final decida. 

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O então consultório do autor era na rua Manoel Deodato, bairro da Torre, em João Pessoa. Além da atendente, nele “trabalhava” a Relações Públicas Adélia Mendonça de Souza, minha saudosa mãe. Ela fazia o meio de campo enaltecendo as qualidades e ocultando os defeitos. Vocês sabem, mãe é mãe!

Um dia qualquer, anterior ao ano de 2013, adentra ao consultório um paciente, beirando os 60 anos de idade. Trazia um resultado de exame de tórax – não lembro se a solicitação fora do autor, mas a ação de levar os exames para o médico, mesmo não especialista, é recomendável. Até por que os exames básicos estão ao alcance interpretativo de todo médico.

Como todos sabem, um exame de tórax engloba uma película – também chamada de filme ou chapa – e o laudo. Fiel à lição “primeiro a chapa, depois o laudo”, coloquei a película no negatoscópio (equipamento obrigatório – nos consultórios – que ilumina a chapa, facilitando sua adequada observação).

“Como quem não tem cão, caça com gato”, na sua ausência a chapa é analisada contra a luz. Convém torcer para que os fiscais do Conselho Regional de Medicina não apareçam. Poderia ter advertência e, na recorrência, até uma interdição.

Com a película devidamente posicionada, conforme ensinava dr. Beltrão Paiva Castelo Branco, professor de Pneumologia, foram identificadas duas imagens “suspeitas”: uma típica caverna tuberculosa. Mas, além das cavernas, havia duas gigantes imagens brancas e circulares, simetricamente dispostas, do tamanho de um melão! Mamas? Sim. Imponentes mamas naturais.

Alguns minutos se passaram, intercalando-se a observação da chapa e a inspeção do tórax do paciente. Ressabiado, ele perguntou: “O que deu, Doutor?” Foi respondido que ficasse calmo, que seria lido o laudo. O diagnóstico batia com o do autor, mas havia divergência quanto aos círculos brancos. Afinal, o radiologista não valorizou as montanhosas mamas num paciente masculino, tampouco registrara uma possível ginecomastia, que vem a ser o crescimento anormal de mamas em um homem.

Por sua vez, muito apreensivo, o paciente cobrou de novo: “E aí, Doutor?”. O tórax do paciente não apresentava aquelas elevações compatíveis com mamas gigantes; pelo contrário, parecia uma “tábua”. E a qualidade da chapa era impecável, inquestionável. Ficou constatada a falha, houve troca nas radiografias. O que ele me trouxe pertencia a uma mulher.

Não dava mais para adiar o anúncio da conclusão do médico. “Tenho uma notícia boa e outra ruim. Quer ouvir qual primeiro?”, perguntei ao paciente. Não lembro qual foi a opção dele, mas emendei: “A notícia ruim é de que o portador dessa chapa de tórax tem uma avançada tuberculose pulmonar; a boa, que essa radiografia não é sua, é de uma mulher”.

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Caso o erro não fosse percebido, o paciente seria impactado psicologicamente, quem sabe poderia até perder o emprego, devido ao estigma da tuberculose pulmonar. Claro que antes do paciente, desnecessariamente, tomasse antibióticos por seis meses, o obrigatório e acessível exame de escarro daria um ponto final ao erro.

E quanto ao desfecho do caso? Houve retificação do laudo? Apresentadas denúncias? E a verdadeira dona da chapa radiológica? Foi identificada? Tratou? Ficou curada? São tantas interrogações, leitor amigo, que o desfecho vai ficar por conta da imaginação de cada um. Meus idosos neurônios teimam em não lembrar.

E que Deus nos proteja de um caso assim em nossas vidas.

  • Eurípedes Mendonça é Médico