ESSES MOÇOS…, por José Mário Espínola

Lupicinio-Rodrigues

Lupicínio Rodrigues (foto copiada do site Vida Nova)

Esses moços, pobres moços… Assistindo ao noticiário veio-me à mente a belíssima canção, composta pelo cantor e compositor Lupicínio Rodrigues, que faleceu em 27 de agosto de 1974, com apenas 60 anos de idade.

Conta a história que ele compôs essa música no ano de 1947, com o objetivo de convencer seu amigo Hamilton Chaves a não se casar, pois tinha APENAS 22 anos de idade. Lupicínio queria alertá-lo para as surpresas da vida, e aos 33 anos achava-se um bom conselheiro.

Desconheço se o seu amigo aceitou ou não o conselho. O fato é que, ao assistir às noticias da pandemia, me foi inevitável a conotação com a música e com a intenção de Lupicínio: o alerta para que alguém evite cometer atitudes irresponsáveis pelas quais depois venha a se arrepender.

Pois não deixa de ser alarmante, para mim, o crescimento exponencial do número de casos da doença covid 19. E quando nós olhamos mais detidamente o perfil epidemiológico, ficamos assombrados com a evolução acontecida nos últimos três meses.

Até novembro do ano passado, morria bem menos gente por covid 19. E dentre os que morriam era muito maior o número de pacientes idosos, acima dos sessenta anos em diante. Estes significavam pouco mais de dois terços dos óbitos e os pacientes falecidos abaixo dessa idade eram menos de um terço. Esse também era o perfil dos pacientes internados pela doença.

Hoje, a estatística mostra uma inversão: quase dois terços de pacientes relativamente jovens (pelo menos não-idosos) ocupam os leitos hospitalares e morrem, contra menos de um terço de idosos.

O que pode ter acontecido de tão forte nesse período que possa ter influenciado a mudança de um perfil epidemiológico?

A resposta básica me parece ser apenas uma: a sabedoria de Lupicínio! A mudança no comportamento dos jovens.

Desde o início da epidemia, os idosos foram aconselhados a se isolarem o máximo possível. E obedeceram. Os menos-idosos e os mais jovens, por sua vez, de forma coletiva nunca obedeceram à recomendação de se isolarem e usarem máscaras corretamente.

Como a princípio morriam menos, parece que lhes subiu à cabeça a sensação de serem super-heróis. Dificilmente usaram máscaras ou se isolaram. Logo vinha lá de cima o mau exemplo do presidente da República, Jair Messias(?) Bolsonaro, que sempre negou a doença e a ciência, e nunca apoiou ou ordenou o isolamento rigoroso, o bloqueio total, como fizeram líderes de países que tiveram melhor evolução que o Brasil.

Nesse ínterim, o isolamento dos idosos contribuiu para inverter a curva epidemiológica, que no início de novembro já estava quase totalmente achatada. A epidemia, então, parecia estar controlada e a caminho do fim. Viva!

Mas eis que o cão atentou as autoridades estaduais e municipais, que foram pressionadas pelos segmentos econômicos, estes liderados pelo presidente da República, que dá o mau exemplo promovendo aglomerações sem usar máscaras. Assim, afrouxaram o controle sanitário.

Para agravar, veio a campanha eleitoral e o que se viu foi um “liberou geral” totalmente irresponsável. Repito sempre: as autoridades municipais e estaduais jamais poderiam ter permitido concentrações, naquela campanha. E, bem antes da campanha eleitoral, no início da pandemia, o presidente da República deveria ter tido uma atitude responsável, tomado as rédeas do país e assumido o papel do verdadeiro líder que ele nunca foi. E decretado o isolamento social de forma rigorosa.

Na sequência da mobilização eleitoral vieram as comemorações das festas natalinas, as comemorações de fim de ano, os “chás de macumba,” como diz (com toda a propriedade!) o Dr. Lauro Wanderley. Depois chegou o veraneio, culminando com o carnaval.

São medonhas as concentrações organizadas por empresários criminosos, as festas diabólicas chamadas de “paredões”, que contam com a tolerância cúmplice das autoridades civis. A consequência é o agravamento quase descontrolado da pandemia no Brasil.

Como sou componente da categoria de idosos, voltam à minha mente as sábias palavras de Lupicínio Rodrigues:

“Esses moços, pobres moços…/
… não passavam, aquilo que eu já passei…/
…Saibam que deixam o céu por ser escuro/
E vão ao inferno à procura de luz…”

Infelizmente, no momento que estamos vivendo, a letra da bela música me faz lembrar as luzes estroboscópicas e o som infernal dos “paredões” que os jovens irresponsáveis estão protagonizando.

Triste Brasil, que se veste de luto aceitando passiva e covardemente as mortes dos seus entes queridos. Triste juventude, que não escuta mais as vozes da experiência…

***

ESSES MOÇOS
Lupicínio Rodrigues

Esses moços, pobres moços
Ah! Se soubessem o que eu sei
Não amavam, não passavam
Aquilo que já passei
Por meus olhos, por meus sonhos
Por meu sangue, tudo enfim
É que peço
A esses moços
Que acreditem em mim

Se eles julgam que há um lindo futuro
Só o amor nesta vida conduz
Saibam que deixam o céu por ser escuro
E vão ao inferno à procura de luz
Eu também tive nos meus belos dias
Essa mania e muito me custou
Pois só as mágoas que trago hoje em dia
E estas rugas o amor me deixou

Esses moços, pobres moços
Ah! Se soubessem o que eu sei
Não amavam, não passavam
Aquilo que já passei
Por meus olhos, por meus sonhos
Por meu sangue, tudo enfim
É que peço
A esses moços
Que acreditem em mim