SEGUNDA-FEIRA DE CINZAS, por José Mário Espínola

Foto: Ricardo Stuckert

Amanhã, vai ser outro dia
Amanhã, vai ser outro dia…
(Apesar de Você – Chico Buarque)

“Acabou! Acabou!” Esses são os gritos que a gente costuma ouvir nas finais de campeonato, quando já estão chegando ao fim os acréscimos de tempo e o árbitro ainda não apitou o fim da prorrogação.

A torcida está prestes a invadir o gramado para comemorar, enrolada nas bandeiras do nosso time, que lutou bravamente até o fim de um campeonato atípico, superando todo tipo de catimba do adversário, que jogou o tempo todo de forma desleal, criando todos os tipos possíveis de obstáculos. Mas a gente acabou vencendo!

Aos torcedores da equipe derrotada cabe o sábio conselho do professor Genival Veloso: enrolar a bandeira, e esperar o próximo campeonato. Essa é a atitude democrática correta.

Esta segunda-feira será a festa da redenção. Será como uma verdadeira quarta-feira de cinzas, na qual vai passar nessa avenida um samba popular, cada paralelepípedo da velha cidade essa noite vai se arrepiar, num desfile pós-carnaval dos blocos que foram impedidos de ganhar as ruas, já que a verdadeira festa da democracia foi usurpada por esses quatro anos.

Amanheceremos revigorados para mais um ano e uma vida nova, após a noite escura que durou quatro anos, com nuvens plúmbeas cobrindo o céu do Brasil, a atmosfera tóxica, qual filme de Blade Runner, tendo envenenado quase toda a sociedade brasileira.

Foi um mau carnaval, que durou não apenas quatro dias, mas quatro anos, o Brasil assistindo a passarela ser invadida por um único bloco, que tomou conta do país de forma egoísta e irresponsável.

Seu mestre-sala, em vez de um elegante fraque e cartola, trajava farda, e estranhamente portava uma bandeira de navio pirata, com ossos e caveiras, revelando a índole ruim do bloco. Foi desse jeito que eles se apossaram do nosso carnaval, como fariam mais tarde com o nosso Dia da Pátria.

Nesta segunda-feira vamos comemorar. Pois nossa gente voltou a sorrir, nosso povo será amistoso de novo, irmãos voltarão a se falar, os pais voltarão a beijar seus filhos. Vizinhos se cumprimentarão sem baixar a vista, mesmo que ainda um pouco encabulados. Namorados se reconciliarão.

E todos cantarão com Beth Carvalho, o refrão da música ‘Esse é o Botafogo que eu Gosto’:

Tanto tempo esperando esse momento, meu Deus
Deixa eu festejar que eu mereço

A eleição deste domingo abrirá um novo tempo onde vamos sobreviver, como diz Ivan Lins na sua canção Novo Tempo:

No novo tempo, apesar dos perigos
De todos pecados, de todos enganos, estamos marcados
Pra sobreviver, pra sobreviver

E aos poucos o povo brasileiro voltará à normalidade plena, respirando aliviado, pois a democracia foi salva.

Numa segunda-feira atípica, o Brasil emergirá das cinzas, qual uma bela fênix auriverde.

GOLPE BRANCO, por José Mário Espínola

Ato pela democracia e leitura da ‘Carta aos brasileiros e brasileiras em defesa do Estado Democrático de Direito’, em 11 de agosto deste ano, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) – Imagem: Roberto Parizotti/Fotos Públicas

Bom Amigo me provoca, para saber por que é que eu votar “em um ladrão”, segundo ele. Como é uma pessoa de quem eu tenho uma elevadíssima estima, procurei argumentar com fatos históricos.

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Na Alemanha dos anos 1920, Adolf Hitler aproveitou-se de uma nação fragilizada pelo pós-guerra de 1918, seguida de administrações democráticas, que, no entanto, não conseguiram obter sucesso para melhorar as terríveis condições que a população enfrentava, por diversos fatores: dívida de guerra extorsiva; desemprego incontrolável; inflação astronômica provocada pela quebra da bolsa mundial; caos social; ausência de segurança pública, porque o país estava todo dividido, com bandos armados espalhando o terror, principalmente os Camisa-parda nazistas. Estes eram arruaceiros e viviam em eterno conflito com os comunistas, sob influência da União Soviética, que os armava.

Esse foi o meio de cultura no qual cresceram bactérias humanas, como o cabo austríaco Adolf Hitler. Aproveitando-se da fragilidade política e social, Hitler disseminou o medo entre os alemães, em sua maioria pessoas simples, e no meio da nobreza falida e da elite alemã, que haviam perdido os privilégios, principalmente os prussianos. Todos buscavam um culpado para a situação em que se encontravam. A sua fala despertou a atenção desses segmentos da sociedade alemã. Hitler iniciou apontando os judeus e os comunistas como os culpados maiores pela derrota na guerra e pelas mazelas que o povo sofria. Disseminando notícias falsas, incutiu o ódio da população contra essa etnia. Com isso ele foi ascendendo politicamente, conquistando vagas no parlamento para o seu Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães, os nazistas, fundado em 1920.

Em 1933, Hitler foi eleito por via democrática, mas o seu partido não alcançou o número mínimo de cadeiras para fazer o chanceler, que era o seu objetivo. Ele teve que fazer uma coligação com outro partido, para alcançar o quórum necessário. Sabe com quem? O Partido Comunista Alemão! O Kaiser Hindenburg, que presidia a Alemanha, embora muito contrariado, teve que nomear Hitler para a chancelaria, pois era o que dizia a Constituição alemã. Assim, no dia 30 de janeiro de 1933, Hitler tornou-se Chanceler, o homem mais poderoso da Alemanha.

Dominando o Executivo, e tendo feito a maioria no Parlamento, quatro semanas depois Hitler deu um golpe. Aproveitando-se de um incêndio no prédio do Reichstag, que era o parlamento alemão, causado por um louco holandês, os comparsas de Hitler, orientados pelo ministro da Propaganda, Josef Goebells, disseminam a história de que se tratava de uma tentativa de golpe pelos comunistas, causando medo ao povo alemão. A população estava profundamente insegura. E as elites conservadoras de burocratas, políticos e militares temiam uma tomada de poder pelos comunistas.

Com a população amedrontada, Hindemburg foi convencido por Hitler a assinar um decreto que eliminava a liberdade de expressão, de opinião, de reunião e de imprensa. O sigilo do correio também era abolido, dando-lhe amplos poderes. Então Hitler fechou os partidos Comunista e Socialista, prendendo e torturando seus integrantes. Com o tempo interferiu no judiciário, aposentando os juízes e prendendo alguns. Substituiu-os por magistrados fiéis.

Perseguiu de todas as formas: judeus, católicos, intelectuais, homossexuais, ciganos, portadores de deficiência física ou mental. Recebeu o apoio dos evangélicos, da elite militar, dos prussianos, e da sociedade conservadora. Hoje, sabemos o que resultou dessa escalada, envolvendo o mundo em uma grande guerra de conquistas, com a morte de muitos milhões de pessoas, boa parte delas civis.

Essas informações podem ser confirmadas em livros sobre o nazismo, como, por exemplo: Ascensão e Queda do Terceiro Reich, de William Shirer (talvez o mais completo), e Memórias da Segunda Guerra Mundial, de Winston Churchill.

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Aproveitando-se de uma onda de extrema-direita que vem varrendo o mundo há mais de uma década, e da sociedade brasileira fragilizada pela administração de Dilma Roussef, e a administração pífia, leniente e corrupta de Michel Temer, um tenente que havia sido expulso do exército nos anos 1980, quando foi classificado de medíocre, incompetente e perigoso pelo presidente Ernesto Geisel, surgiu no panorama político com um discurso raivoso ultraconservador, muito semelhante ao do cabo austríaco Adolf Hitler, que encontrou eco na sociedade conservadora do Brasil.

Esse cidadão nunca trabalhou em sua vida. Ingressou na política como vereador do Rio de Janeiro. Fez pacto com grupos armados egressos da polícia estadual, conseguindo se eleger ao longo de 28 anos, dessa vez como deputado  federal. Apoiado numa nova forma de fazer política, as famigeradas redes sociais, ele aproveitou-se do momento de fragilidade da nação, disseminou o medo contra as esquerdas, adicionou o messianismo à sua pregação de ódio, e obteve assim o apoio de uma parcela muito organizada e respeitada, os evangélicos.

Nesse ínterim, o principal expoente do partido popular, o PT, foi excluído da eleição de 2018. Este partido deveria ter reconhecido o profundo sentimento antipetista que se instalou na população e apoiado outro candidato, que derrotaria Jair Bolsonaro. Mas, como o PT nunca teve autocrítica, lançou um candidato, que teria muitas chances de se eleger. Foi quando surgiu a facada, desferida por um louco (semelhante ao holandês que tocou fogo no Reichstag), que mexeu com o sentimento de piedade do brasileiro, a pieguice. E Bolsonaro foi eleito democraticamente presidente do nosso país. Como Hitler na Alemanha e Mussolini na Itália.

Ele já está afirmando que, logo que reassumir, irá iniciar o golpe branco. Começará deformando o STF, aprovando no Congresso reforma que lhe permita se livrar de todos os magistrados que possam vir a contrariar os seus planos, reduzir a idade de aposentadoria, além de ampliar o número de ministros, que serão nomeados por ele. Como ele conseguiu eleger a bancada mais conservadora de todos os tempos, se empossado ele conseguirá realizar o seu plano. Depois é só seguir a cartilha desses ditadores extremistas, já com a população subjugada.

Ele se espelha em exemplos internacionais: Hugo Chávez, na Venezuela; Viktor Orban, na Hungria; Vladmir Putin, na Rússia, e Kim Jong-Un, na Coréia do Norte. Um time seleto. Todos foram eleitos pelo voto em seus respectivos países.

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Volto à pergunta de Bom Amigo. Durante muito tempo eu também fui intensivista. Na UTI, nós aprendemos a realizar todos os esforços para salvar uma vida. Na tentativa, fazemos tudo o que é possível e necessário, correndo riscos, tais como, por exemplo, provocar fratura de costelas na massagem cardíaca. O importante é resgatar o paciente. Depois, tratamos as sequelas. Por analogia, devemos adotar o mesmo procedimento para salvar o Brasil.

No momento, a vida da frágil democracia brasileira corre elevado risco de morrer. Acho que esse é o mesmo pensamento que levou a apoiarem o adversário do atual presidente pessoas insuspeitas como Fernando Henrique Cardoso, Geraldo Alckmin, Armínio Fraga, Simone Tebet, vários ex-ministros do STF, toda a elite cultural, diversos empresários. Eles enxergam que é a única forma de impedir que o nosso “cabo austríaco” dê um golpe contra a nossa democracia que, repito, se encontra num momento de fragilidade.

Nesta eleição, escolhi o mal menor para o Brasil. Votei e votarei contra Bolsonaro. Assim, a democracia estará garantida.

PRETEXTOS, por José Mário Espínola

Uma vantagem possível em favor da democracia: a preço de hoje, a grande imprensa brasileira não parece inclinada a apoiar um golpe

No dia 1º de abril de 1964, o Brasil amanheceu debaixo de um golpe. Os militares brasileiros, estimulados pelos Estados Unidos e com o apoio explícito da elite, de parte da imprensa e das classes empresariais, depuseram o presidente João Goulart. Este havia sido eleito em 1960 e estava governando o país democraticamente há três anos antes, desde a renúncia do então presidente Jânio Quadros, com apenas oito meses de governo. Em seu governo, Jango procurou promover reformas estruturais que beneficiassem os menos favorecidas. Isso provocou a ira das classes dominantes, embora fossem a minoria da população.

Durante duas décadas de ditadura, os militares apresentaram aspectos positivos e negativos. Durante os governos militares, por exemplo, foi criado o Plano Nacional de Imunização, que se tornou um modelo para o mundo, até os dias de hoje, tendo a duras penas sobrevivido aos recentes ataques do atual governo. Se, por um lado, os governos militares rasgaram milhares de quilômetros de estradas promovendo a integração nacional, por outro destruíram a via férrea, com imenso prejuízo para o agronegócio, por exemplo, o que hoje mais do que nunca é lamentado, pois pesa diretamente nos preços dos alimentos.

A troca realizada pelo governo militar, dos trilhos pelo asfalto, atendeu a exigências do capital estrangeiro, pois beneficiou diretamente a indústria mundial do petróleo. E prejudicou a nação brasileira. O programa nacional de rodovias foi um dos que produziram suspeitas de corrupção dentro dos governos militares. É o caso da rodovia Transamazônica, jamais concluída, apesar dos bilhões despejados nela.

No plano interno, os governos militares impuseram censura a toda e qualquer manifestação de insatisfação, que era reprimida com vigor. Foi instituída a delação como instrumento de controle da população. Criou-se a figura do dedo-duro para aqueles cidadãos covardes e inescrupulosos, que não tinham valor próprio para progredir na vida, em sua profissão. Para auferir sucesso de carreira, bastava dirigir-se à guarnição militar e delatar alguém, fosse colega, superior ou mesmo parente próximo. Incontáveis são os casos conhecidos.

Qualquer atitude que pudesse caracterizar discordância, ideológica ou não, da população brasileira, era reprimida com um rigor que chegava às raias da eliminação. A partir de 1968, foi institucionalizada a tortura e o assassinato de adversários como política de Estado. Uma parcela pouco expressiva de brasileiros tomou a atitude, hoje considerada equivocada, do enfrentamento armado. Equivocada porque revelou pouco ou nenhum resultado prático, não reduzindo em nada a ferocidade com que o governo militar enfrentava os adversários. Pior ainda, serviu para que ele justificasse a repressão criminosa contra aqueles que se opunham ao arbítrio.

Em finais da década de 70, a linha ultradura da ditadura militar iniciou seu processo de declínio, no governo do general Ernesto Geisel. Surpreendentemente, essa queda continuou no governo seguinte, justo no governo do general João Batista Figueiredo, que tinha sido o chefe do Serviço Nacional de Informação, o famigerado SNI, catedral do dedurismo nacional.

Pois foi com Figueiredo que aconteceu a Anistia Nacional. Pressionado pelas ruas, pela repulsa dos cidadãos brasileiros, que já não tinham mais pão nem circo, pelo fracasso econômico, pelo desgaste dos militares perante a opinião pública, e, finalmente, por insatisfação da própria base parlamentar e empresarial do regime concentrada no Centrão da vez, que na versão da época igualmente acompanhava quem desse mais dinheiro e oferecesse mais lucros, finalmente a ditadura militar iniciou a sua retirada do panorama político.

Engana-se, porém, quem diz que ficou por aí. A Lei da Anistia havia beneficiado os dois lados, ou seja, tanto os torturados quanto os torturadores, tanto os perseguidos quanto os perseguidores. Com isso, os órgãos de exceção não foram desmantelados e continuaram a existir mesmo no regime de transição de José Sarney e nos governos democráticos que se seguiram. Continuaram a perseguir brasileiros que tiveram atuação na resistência à ditadura militar, como foi o caso do professor Rubens Pinto Lyra.

Agora, animados com a perspectiva do retorno do Brasil à ideologia da extrema-direita, os instrumentos da repressão, que, pensava-se, não mais existiam no regime democrático que a nação vive, estavam apenas mumificados e estão sendo azeitados para ficarem em ponto de bala (êpa!) caso o atual presidente continue a governar. Ou caso ele consiga, antes, dar um golpe “pra chamar de seu”.

Com o aparelhamento ideológico de órgãos como Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Controladoria-Geral da União e outros da República, nota-se que a parte podre da democracia brasileira está se revitalizando para retomar o poder.

PRECEDENTE EMBLEMÁTICO

A história é rica em episódios que se transformaram em pretexto de pessoas com tendências despóticas para justificar atitudes nefastas. São geralmente indivíduos egoístas, invejosos, personalidades fortes. Para alcançar o êxito das suas intenções, muitas vezes inconfessáveis, essas pessoas criam argumentos que, acreditam, justificam suas ações. Vamos ao exemplo mais notável e lembrado.

No final da década de 1930, Adolf Hitler, o cabo austríaco que se tornou ditador da Alemanha, estava decidido a conquistar a Polônia. Ele não confessava, mas a sua real intenção era chegar vizinho ao território russo, pois o que os nazistas queriam mesmo era conquistar a Rússia e tornar seus cidadãos escravos do povo alemão. Isto está escrito no livro ‘Minha Luta’ (Mein Kampf), escrito por Hitler quando estava preso em 1924, após a tentativa de golpe em Munique.

A estratégia era dominar a Polônia e daí viabilizar a invasão da Rússia. Líder de um dos maiores exércitos do mundo, e com certeza o mais moderno, Hitler esbarrava na falta de um real motivo que convencesse as potências ocidentais, lideradas pela Inglaterra. Para conseguir vencer a resistência desses países, ele arquitetou um atentado contra seus próprios soldados. Na madrugada de 1º de setembro de 1939, elementos do Exército alemão, estacionados junto à fronteira com a Polônia, invadiram o território polonês e, vestidos de soldados poloneses, atacaram uma guarnição alemã, causando mortes.

Era o pretexto que Hitler precisava para justificar ao Ocidente a invasão daquele país, deflagrando o pior conflito que o mundo já viu desde os primórdios da civilização.

SINAIS MUITO CLAROS

O presidente Jair Bolsonaro vem desde o primeiro dia de governo (?) expondo a sua intenção de continuar no poder, sabe-se lá por mais quanto tempo. E de qualquer forma, lícita ou não. Pelas vias constitucionais, terá muuuuita dificuldade, como apontam as pesquisas de opinião divulgadas até aqui. Por isso é que há muito tempo ele vem criando falsos motivos que justifiquem o seu A objetivo.

Em setembro de 2021, tentou dar um golpe de estado com a ajuda dos militares das três armas, coadjuvados pelos policiais militares estaduais. Generais da reserva bem que se deixaram seduzir pela ideia de voltar a governar o país de forma tirânica, sem limites constitucionais. Os comandantes da ativa, bem mais ajuizados, não se deixaram iludir pelo arremedo de comandante-em-chefe. Não soltaram seus blocos na rua no Dia da Pátria. A montanha pariu um rato!

Aquele que arrotava poder e liderança inquestionáveis, que bradava ameaças (“Basta!” ou “A paciência acabou!”), fazendo delirar os seus súditos… Aquele que ameaçou o Supremo Tribunal Federal… Bateu pino, recolheu-se à sua insignificância. Depois, choramingou implorando que alguém aplacasse a ira dos ministros do STF. Foi quando entrou em cena o ex-presidente Temer, que lhe ditou uma cartinha pedindo clemência ao ministro Moraes. Mas isso só durou alguns meses, pois, como sempre, tudo o que ele diz não se escreve.

Atualmente, diante da forte perspectiva de terminar os seus dias no ostracismo, de ser derrotado pelas vias constitucionais, nas urnas, ele engendrou novo plano para justificar ações a serem adotadas no futuro próximo. O plano é o seguinte: criar um pretexto para, em caso de derrota, não sair perdendo, manter o poder inconstitucionalmente. Para tanto, além de manter a sua claque obtusa motivada por absurdos diários, o presidente tomou como desafetos os ministros do STF Roberto Barroso e, principalmente Alexandre Moraes, que vai presidir as eleições deste ano, nas quais estará em disputa a cadeira de Presidente da República.

Como todos devem lembrar, desde os primeiros momentos de governo que Bolsonaro iniciou uma batalha para desacreditar a votação eletrônica. Elegendo o ministro Moraes como o seu desafeto, ele terá (assim acha) o pretexto para culpar o TSE pela sua provável derrota e tomar alguma atitude antidemocrática, no caso de derrota nas urnas. Será o cavalo de batalha para “invadir a ‘sua’ Polônia”.

Vamos ver quem o acompanhará, além dos tresloucados fiéis seguidores.

ESTICANDO A CORDA, por José Mário Espínola

Paralerepensar - Texto

(Imagem copiada de Paralerepensar)

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Terrorismo é o uso de violência, física ou psicológica, por meio de ataques localizados a elementos ou instalações de um governo ou da população governada, de modo a incutir medo, pânico e, assim, obter efeitos psicológicos que ultrapassem largamente o círculo das vítimas, incluindo o restante da população do território. É utilizado por uma grande gama de instituições como forma de alcançar seus objetivos, como organizações políticas, grupos separatistas e até por governos no poder.

A História é um registro implacável do comportamento da humanidade ao longo da nossa existência, desde os primórdios, quando os humanos viviam isolados, porém deixando registros gravados, até os tempos em que passaram a fazer registros do que viam. E do que pensavam.

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Quinze anos após o fim da Primeira Grande Guerra, a Alemanha vinha se equilibrando como podia. A economia patinava, amargando níveis inflacionários estratosféricos, na casa do milhão por cento, consequente a administrações incompetentes, agravada pela recente Depressão econômica mundial.

O desemprego crônico e crescente provocou um efeito maléfico sobre a população, piorando o nível de pobreza, com segmento significativo da sociedade passando fome. Esse quadro caótico influenciava no comportamento social do povo alemão. Oportunistas surgiram insuflando a população contra aqueles que elegeram como culpados pela crise: os esquerdistas do Partido Comunista e os judeus.

Criaram, assim, um ambiente social insuportável na Alemanha, que se tornou um caldo de cultura rico em ódio. E acabou gerando uma crise sem precedentes em sua história. O ódio passou a ser o estímulo maior para as pessoas comuns, influenciadas pela propaganda política de ambos os lados. Todos os dias aconteciam escaramuças, agressões e perseguições por motivos ideológicos.

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Em 1933, Adolf Hitler assumiu os desígnios da Alemanha e do povo alemão, após o seu partido, o Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães – NADP, ter alcançado a maioria do parlamento alemão, o Reichstag, em eleições democráticas.

Todavia, como o número de cadeiras não superou a metade do parlamento, Hitler teve que fazer uma coligação com um partido menor. E por ironia do destino os nazistas tiveram que se coligar com o Partido Comunista. Justamente com os comunistas, que eles execravam e combatiam como inimigo maior, só perdendo para os judeus, a quem eles odiavam.

O Partido Comunista, então, garantiu a maioria do NADP no Reichstag. E só assim Adolf Hitler, líder (führer), pode reclamar ao Kaiser Himdenburg, presidente da Alemanha, o cargo de Chanceler (chefe do governo). Foi nomeado na noite de 31 de janeiro de 1933.

Hitler liderou o seu partido nessa conquista após uma década de proselitismo baseado no ódio. Ódio aos partidos da esquerda ideológica, a quem atribuía a má-administração do país.

Ódio aos judeus, em quem jogava a culpa do desastre econômico, e a quem creditava o fato de ter aceitado um armistício desfavorável à Alemanha em 1918, quando ainda teriam forças para continuar guerreando.

Ódio também aos franceses e ao Tratado de Versalhes, que humilharam internacionalmente a Alemanha e seu povo, tomando do território alemão uma área rica em carvão mineral na fronteira com a França, que passou a administrar a produção de tão crucial fonte de energia. 

O Tratado de Versalhes também proibiu a Alemanha de ter exército para se defender. Proibiu força naval que tivesse navios de grande calado. Proibiu a formação de uma força aérea.

A intenção dos países aliados – França, Inglaterra e Estados Unidos – foi limitar o arsenal de guerra da Alemanha por um longo tempo. Este era um país aguerrido e belicoso que nos últimos séculos havia protagonizado guerras desastrosas com seus vizinhos, muitas delas sem justificativa para algo mais que um simples conflito diplomaticamente contornável.

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Ao longo de sua carreira em direção ao poder, Adolf Hitler conquistou a maioria do povo alemão. A princípio, boa parte pela adesão às suas ideias, quase todas de iniciativas bélicas: eliminação de judeus e esquerdistas; criação de forças armadas; retomada de territórios e conquista de países ao leste, visando subjugar o povo russo. A Rússia seria o celeiro da Alemanha, e seu povo seria escravo dos alemães.

A propaganda maciça sufocou o alemão médio, dando a impressão de que os nazistas eram imbatíveis, que tinham que se conformar com eles. Com o tempo, o ambiente social ficou sufocadamente nazista, e aqueles que não comungavam com as suas ideias aderiram por medo de serem retaliados.

Em sua pregação, Hitler conquistou também ou muito mais a elite alemã, tanto a nobreza como o alto empresariado. Aqueles, por enxergarem nele a oportunidade de retomar a importância perdida. Já os empresários do ‘alto clero’ vislumbraram nele a oportunidade de melhores negócios, com o fim do caos em que se encontrava o país. Para tanto, fizeram vista grossa para toda a arbitrariedade do governo contra os opositores, vítimas da ascensão nazista e o verdadeiro terrorismo de Estado que o regime criou.

Assim que Hitler e o NADP assumiram o poder passaram a fazer tudo o que haviam ameaçado ao longo de década e meia. Um dos seus primeiros atos tornou proscritos os partidos de esquerda, prendeu comunistas e judeus, internando-os em campos de concentração.

O apoio incondicional da elite empresarial alemã e o domínio do parlamento permitiram uma melhora da economia da Alemanha. Dominou a inflação, passando a gerar empregos, mesmo que à custa de insegurança trabalhista e social.

Amparado pelo parlamento, o nazismo também interveio e aparelhou o Poder Judiciário da Alemanha, afastando magistrados independentes, substituindo-os por aqueles afinados com o pensamento do führer. Com esse ato, Hitler extinguiu a democracia alemã, totalitarizando o seu poder. A partir daí, passou a esticar a corda: decidiu avançar aos poucos sobre as proibições estabelecidas no Tratado de Versalhes.

Seguindo o roteiro traçado por si próprio no livro ‘Minha Luta’, escrito na prisão com a ajuda de Rudolf Hess, ele primeiro organizou um exército clandestino, seguido do aparelhamento da aeronáutica e da marinha. Aos poucos, as forças armadas alemãs foram “oficializadas” e passaram por um processo de fortalecimento organizado por Hermann Göring por ordem do führer.

Como os Aliados fizeram vista grossa, em 1936 ele invadiu e retomou o Território da Renânia, então invadido pela França que queria maior substância no pagamento da dívida de guerra estipulada no Tratado de Versalhes. A Renânia é aquela região rica em minas de ferro e carvão até então administrada pelos franceses.

As potências mundiais haviam declarado zona desmilitarizada e pelo Pacto de Locarno a Alemanha estava proibida de manter tropas no território. Para invadir a Renânia, Hitler tomou a decisão contrariando seus generais, pois estes sabiam que não tinham exército suficientemente forte e capacitado para tal, caso a França reagisse.

Mas Hitler blefou, os franceses acreditaram e abandonaram o território sem reagir. Os Aliados signatários do Tratado de Versalhes reagiram com muito barulho, mas não tomaram nenhuma medida efetiva. Hitler, então, sentiu-se fortalecido para novas e semelhantes aventuras, além de esticar a corda ainda mais.

Em março de 1938, anexou a Áustria. Em março de 1939, anexou a Tchecoslováquia. E em setembro de 1939 invadiu a Polônia, com a cumplicidade da comunista (outra vez!) União Soviética, causando o maior desastre bélico que a humanidade já viu, com várias dezenas de milhões de mortos.

A história demonstra que essa Grande Guerra poderia ter sido evitada se as potências ocidentais tivessem sido vigilantes e atuantes em defesa da ordem mundial.

Hitler testou os instrumentos democráticos a partir do momento em que assumiu o poder. Com a leniência generalizada, rapidamente subjugou todas as instituições, eliminou a oposição, extinguiu a liberdade de opinião e instituiu a censura à imprensa.

O resto é o que se viu depois, com o fim da paz no mundo e a morte de milhões de pessoas, mortes que não aconteceriam se aqueles com algum juízo tivessem controlado o louco em tempo hábil.

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Subversão (do termo latino subversione) é uma revolta contra a ordem social, política e econômica estabelecida vigente. Pode manifestar-se tanto sob a forma de uma oposição aberta e declarada, como sob a forma de uma oposição sutil e prolongada.

Desde que assumiu a Presidência da República, Jair Bolsonaro vem fazendo ameaças diárias de interferir nos outros poderes, especialmente no Supremo Tribunal Federal. O assédio é grande e crescente, desde que o legislativo aparentou já ter sido comprado para lhe garantir que não haverão surpresas constitucionais.

Desde o início de seu governo, o presidente vem estimulando abertamente o motim entre as polícias militares estaduais. Essa foi a mensagem transmitida pela Polícia Militar de Pernambuco, na recente manifestação pacífica contra Bolsonaro.

Como que fazendo parte de um plano sinistro de poder totalitário, o presidente vem promovendo o aparelhamento político da Polícia Rodoviária Federal, da Polícia Federal e até mesmo das Forças Armadas. Desde o início do governo, ele vem testando a paciência de quem tem juízo.

Ele diz o que não pode num dia, no outro recua e desdiz o que havia dito. Porém, já é perceptível um padrão: a cada pronunciamento, eleva o tom da ameaça da vez anterior.

A tática adotada para impressionar o público, para demonstrar que tem capacidade para dominar o país, é bastante manjada. É a mesma técnica do adolescente do “sem querer querendo” para conseguir as coisas. Começa testando a autoridade dos pais, dizendo o que não deve e recuando, pedindo desculpas, e aos poucos vai se impondo no que não é permitido, até os pais perderem definitivamente o controle sobre ele.

Bolsonaro começou soltando balões de ensaio, que a princípio eram aparentes lapsos. Depois passou a fazer declarações em tom de brincadeira. Depois, declarações afirmativas. Dizia o que queria e analisava a repercussão do que disse. Como nunca houve resposta à altura, hoje ele profere ameaças de soltar o Exército contra quem a ele se opuser.

É o que se observa na atual crise que criou dentro das Forças Armadas, em sua escalada de anúncios de que POSSUI AS FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS. São muitas as evidências: manifestações políticas em frente a quartéis.

Manifestações políticas com a exibição de oficiais generais da reserva. Como o exército não se opôs, passou então a fazer manifestações políticas com a exibição de oficiais generais da ativa.

Passou a proferir declarações de que “é o MEU Exército”, dando a entender que a respeitável instituição militar não é uma instituição de Estado, senão de SEU governo. Deixando claro que as Forças Armadas farão o que ele mandar. Que elas são comprometidas exclusivamente com ele, o presidente da República. E desse jeito ele tem sido tolerado. Só que a tolerância atingiu níveis de irresponsabilidade.

Como desde que começou nunca foi desmentido, e as Forças Armadas nunca o corrigiram, declarando que não, elas não pertencem a esse ou aquele presidente, e que o seu compromisso é com a Constituição, ele chegou a níveis insuportáveis de retórica. Agora explicitamente anuncia ser o “dono” dessas entidades.

No episódio mais recente, Bolsonaro arquitetou mais uma forma de desmoralização do Exército: levou um general da ativa para participar de manifestação política de ampla repercussão nacional, o que feriu o código disciplinar da Arma. E depois avisou que o general não poderá ser punido, pois é gente sua.

É grave a crise que o presidente criou. A não-responsabilização desse militar será um grave e perigoso exemplo para a caserna. A mensagem que está sendo transmitida é que podem fazer o que quiserem, pois não haverá punição. Isso será a desmoralização do Alto Comando das Forças Armadas! Logo assistiremos a sargentos liderando motins nos quartéis, manifestações contra seus comandantes.

Pergunto: por que é que o presidente está querendo desmoralizar o Exército, ao interferir na punição disciplinar do general Pazuello, comprometendo a hierarquia nas Forças Armadas? Será que ele quer vingar-se por no passado ter sido punido pelo Código do Exército e ter sido praticamente expulso da corporação por ser inapto para a carreira militar? Ou será algo mais sinistro: para criar um Estado totalitário às custas do desvirtuamento das Forças Armadas, subjugando-as à sua vontade? É uma possibilidade. O que o Brasil ganhará com essa atitude? O que as Forças Armadas ganharão?

Em 1964, sargentos promoveram a insubordinação dentro das Forças Armadas. A principal consequência foi a derrubada do presidente João Goulart. Haverá clima no Brasil para um novo golpe?

DEMOCRACIA REMOTA, por Ana Lia Almeida

Mulher de chapéu e máscara segura cartaz dizendo 'basta' na Avenida Paulista

MIGUEL SCHINCARIOL/GETTY IMAGES

Não estou dizendo que não é pra ir votar. Daqui a pouco eu vou lá, sim, apertar no botão a minha pouca escolha entre o péssimo conhecido de sempre e a nova tragédia. Certamente estaria mais animada se votasse em São Paulo, em Porto Alegre, ou mesmo em Recife, mas aqui em João Pessoa a fedentina das cabines de votação se poderá sentir de longe, muito além das zonas eleitorais.

Ainda assim, jamais deixaria de votar, mesmo com medo da pandemia. Me impede a consciência das décadas em que meus pais não puderam fazê-lo, eles e seus amigos que pagaram com a própria vida por isso. A pouca escolha que nos resta nas urnas, afinal, é o outro lado da nossa pouca disposição em brigar pelo que nos cabe. Essa preguiça de lutar pelo que é nosso, essa covardia de aceitar as coisas mais absurdas como se fossem normais, essa cretinice de se apropriar individualmente daquilo que é comum a todo mundo.

Só quero dizer que estou farta dessa pouca democracia. Essa democracia remota, de apertar um botão de dois em dois anos e só. Farta dessa cidadania passiva, que, quando muito, faz um post no Instagram. Cansada de mandar ofícios e pedir licença, de saco cheio da paz.

Eu quero é gritar, de máscara, junto com o povo preto na frente do Carrefour. Gritar bem alto que mataram um homem e por isso não podem continuar fazendo compras como se nada tivesse acontecido. Atear fogo, mesmo, no poder desses machos ricos e brancos que passam por cima de tudo que não é deles. Quero revidar todas as muitas vezes em que somos atingidas pelo machismo, vingar as mortes das mulheres e todas as pessoas que sofreram por amar conforme sua própria vontade. Já chega, também, desse mundo em que o lucro vale mais do que as pessoas.

Por isso eu vou mesmo votar, daqui a pouco, de máscara, caneta e álcool em gel. Mas não me contento com isso.

DIALETICAMENTE COMPLEMENTARES, por Rubens Pinto Lyra

Karl Kautsky, à direita, com Eduard Bernstein em 1910 (Foto copiada do Diário Liberdade)

Kautsky, a despeito de tratado por Lênin e pelos comunistas como “o renegado”, foi considerado o maior teórico marxista do último quartel do século XIX e do primeiro do século XX, depois de Marx e Engels. Deste, aliás, foi executor testamentário e principal colaborador. Clique para ler mais

UMA DEMOCRACIA APEQUENADA, por Rubens Pinto Lyra

Jean Wyllys (Foto: André Dusek/Estadão)

Nossa democracia desceu a um patamar muito baixo desde a deposição da Presidente Dilma, golpe orquestrado por conluio da grande mídia com o mercado, respaldados por uma justiça seletiva a serviço dessas forças e partidos conservadores que hoje detêm a hegemonia política no Brasil.

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Da democracia à ‘democradura’?

por Rubens Pinto Lyra

(Charge publicada pelo Imel – Instituto de Imersão Latina)

Democracia e ditadura são conceitos antinômicos, um repele o outro. Mas isso não quer dizer que esses conceitos se concretizem de forma pura na realidade. No Brasil, o regime democrático já é de baixa intensidade, tendo em vista a investidura de um presidente ilegítimo como Michel Temer, a existência de monopólio midiático e a insegurança jurídica devida ao ativismo judicial, entre outros fatores.

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