Costuma ser entediante aguardar a vez em consultório médico, mesmo lendo um livro ou navegando pelo celular, como muitos fazem. Dependendo da especialidade, algumas pessoas cochilam na sala de espera, outras comentam BBB, o preço da gasolina ou a chuva que alagou a rua pobre. Um número bem reduzido se mantém em silêncio, apenas observando o que os outros fazem para matar o tempo.
Helena resolveu fazer diferente, certa vez. Fechou o livro e fez uma enquete com os demais presentes, com a seguinte pergunta: “Quem está ansioso à espera do médico?” Claro que para motivá-los relevou o seu caso, exagerou ao máximo e gesticulou como se estivesse num palco; de repente, a terapia em grupo estava formada. Sobreveio um rosário de desabafos descontraídos ou carregados de dor.
Um paciente com problemas de sono relatou que a “insônia às vezes assusta, mas pode ser também uma experiência interessante porque serve pra gente atualizar pendências, botar erros e acertos na balança, refletir sobre a vida, enfim”. Após o depoimento daquele rapaz de meia idade, entre olhos marejados ou risadas contidas outros ajudaram a espantar o tédio.
Frustrante é quando o relator ou relatora da hora ouve seu nome dito alto e bom som por alguém do balcão de atendimento da clínica. Mas, no caso, Helena não deixou que a história interrompida interrompesse a prática que iniciara como passatempo. Convidou a senhora da poltrona da frente a compartilhar os motivos de ali se encontrar. Motivos relevantes. Queda, fratura, cirurgia, dores, analgésicos fortes e fisioterapia por meses. “Aconteceu comigo o que mais temia – perdi a liberdade de locomoção. Assistência tenho até demais, graças!”, revelou.
Helena retomou a palavra para introduzir na conversa suas lembranças de criança, contando que quando menina pequena bastava ter um resfriado para ser imediatamente alvo de atenções, mimos e ver atendidos pedidos que normalmente seriam rejeitados no ato ou simplesmente esquecidos. Na sequência, emendou comentários sobre a sua aflição por não ter tempo para ler tudo o que gostaria, pois leitura era a sua grande paixão, “ao ponto de me sentir levitando enquanto devoro um bom livro”.
Nesse momento, a motivadora percebeu que as pessoas pareciam ter ficado subitamente desinteressadas ou encabuladas em continuar naquele exercício de ouvir e falar sobre problemas pessoais, por vezes bastante íntimos, como o que a própria Helena acabara de expor. Ainda bem que a percepção ocorreu no exato momento em que a secretária do médico chamou, abreviando-lhe o constrangimento.
“Dona Helena, Consultório 4”. Pronto. “Dá licença, pessoal. Chegou a minha vez”.