Finalmente, tenho em mãos o autógrafo de Magdala Cavalcanti de Melo numa das folhas de rosto de “Chico do Pilar – O legado de um homem”, o livro sobre as origens e os feitos de uma figura admirável.
A assinatura toma a data de 17 de setembro de 2023, o que permite a contagem de tempo desde a oferta até o recebimento. A prestimosidade do editor Iam Pontes fez com que me chegasse o exemplar que me fora reservado na Livraria do Luiz pela generosidade da autora. Isso, com o auxílio luxuoso do querido Paulo Emmanuel, o filho que tomo por empréstimo do companheiro Gonzaga Rodrigues.
A suspeita da dengue, confirmada em exame posterior, impediu-me a presença no lançamento. Em seguida, a convalescença empurrou a entrega mais para adiante e, com o reforço de uns lapsos de memória e da locomoção mais difícil, pois não dirijo há cinco anos, o tempo foi passando. Mas, felizmente, tenho comigo a dedicatória envaidecedora no livro com o selo da MVC/Forma, sinônimo de competência editorial. Da Gráfica A UNIÃO não seria de se esperar menos do que a impressão e o acabamento primorosos.
Magdala fala de Chico do Pilar – prefeito por duas vezes e deputado estadual – com o olhar e o desvelo esperados, porquanto trata do pai a quem ela e os irmãos idolatram. Mas é espantoso observar que não é menor, ainda hoje, a admiração de muitos, entre os pilarenses, pelo amigo de todas as horas.
Lembro das caras fechadas das irmãs Rosa e Guajarina, primas do poderoso chefe político local, o usineiro Agnaldo Veloso Borges, de quem eram primas, em razão de haver meu pai rejeitado um candidato a prefeito por este então indicado. Lá em casa, votava-se em quem viesse dos lados e agrados da Fazenda Independência. Ainda criança, lamentei a proibição à performance de Rosa quando da execução ao piano de antigas marchinhas, parede e meia com nossa casa. Minha mãe proibiu-me as visitas enquanto duraram os ressentimentos.
Fiz parte, porém, da plateia de meninos para o quebra-pau da TV Ringue Torre e os jogos do Santa Cruz contra o Sport exibidos pelo televisor dos pais de Magdala, na sede da Fazenda. A sintonia em preto e branco era a da TV Jornal do Commercio do Recife, com direito a chuviscos. Não mais lembro de quem partiam os convites endereçados, prioritariamente, ao amigo Wolney, aluno, como eu, de escolas primárias situadas no Recife. Estávamos em casa nos períodos de férias quando restabelecíamos contato com irmãos de Magdala. Convivi, ocasionalmente, na fase da juventude, com Rogério e Aristeu. Um jipe sem capota do primeiro deles nos conduzia até os braços de umas tantas morenas, ao cabo do pastoril profano de Itabaiana. Hoje, aquela rua é tão honesta e decente quanto assim eram as lapinhas abençoadas pelo Padre Gomes, no Pilar da nossa infância.
Li, de um fôlego só, o saboroso relato de Magdala acerca da vida e dos predicados do pai. Leitura fácil e prazerosa, sobretudo, pelos que tiveram a sorte de conviver com aquela boa gente. Seu Francisquinho, assim tratado entre nós, tinha o acolhimento do seu povo em razão da boa têmpera, dos bons préstimos e do propósito de bem servir. Bem lembro disso: dentista prático, ele socorria, graciosamente, legiões de pilarenses sem levar em conta suas preferenciais partidárias.
Quantos nomes (muitos já me escapavam) o texto de Magdala me trouxe de volta à memória… O canoeiro Petório foi um deles. Seu medo de enfrentar o Paraíba, numa das grandes e perigosas enchentes, fez o jovem Francisco cruzar a nado as águas revoltas para levar à Estação de Trem a cartinha destinada à noiva Oza, a moça da cidade de Aliança, Pernambuco, com quem se casaria em primeiras núpcias. Assim contava aquele povo e assim Magdala confirma a seus leitores. A convivência estreita e pacífica entre os personagens desses dois ramos familiares rende um belo conto. Mas, antes de tudo, bem ressalta a grandeza espiritual da Dona Carminha, a bela senhora de cujo ventre Magdala e seus irmãos vieram ao mundo.
Repleto de fotos e documentos, “Chico do Pilar – O legado de um homem” reproduz os fatos, tal como ocorreram. Foi o resgate de um débito bancário contraído pelo amigo de quem era fiador – e não o carteado no Cabo Branco, talvez, seu único defeito – o que fez Seu Francisquinho e família perderem a bela casa de pedras róseas instalada na esquina da Maximiniano Figueiredo com a Camilo de Holanda e, de resto, também, na memória afetiva de gerações de pessoenses. O coração o matou no último dia de agosto de 1964. A você, Magdala, grato pelo autógrafo e pelo livro tão grato à memória da nossa gente.
O LEGADO DE UM HOMEM, por Frutuoso Chaves
SERÁ O COMEÇO DO FIM DAS TAREFAS? por José Mário Espínola
“Vovô, onde é que eu posso recortar estas figuras?”
Dito assim, até poucos anos atrás essa seria uma pergunta fácil de ser respondida. Amanda tinha como tarefa apresentar recortes de figuras e palavras começadas pela letra “h”.
Ora, até há pouco bastava à aluna pesquisar e recortar das revistas e jornais daqui de casa. Simples, né? Não é mais. Pois na era da internet e dos celulares, as revistas e os jornais estão rareando, se tornando avis rara, peças de museu. Está cada vez mais difícil encontrar jornais ou revistas impressos. Caras não vale, pois pràticamente não tem palavras inteligentes, limita-se a exibir figuras.
Com a “notícia” vulgarizada nas tais redes sociais, parece que o jornalismo sério, aquele que se pode ler e conferir, está prestes a desaparecer. Pois ninguém compra mais os noticiosos físicos, de papel.
Ah, o jornal de papel… Saudades do cheirinho desagradável de tinta impressa, cheio de notícias e informações importantes para mim, que a esposa reclamava quando eu esquecia sobre a cama.
Comecei a ampliar as minhas fronteiras além da Paraíba aos sete ou oito anos lendo jornais do nosso Estado e do Rio de Janeiro, que meu pai comprava. Nos anos 1950, ele lia o Última Hora. A partir dos anos 1960, até se desinteressar por tudo na vida em meados dos anos 1980, ele comprava diàriamente o Jornal do Brasil. E também assinava a gaúcha Revista do Globo e a alemã Deutsche Welle.
O JB acompanhou o meu desenvolvimento cultural até chegar à idade adulta. Em 1969, passei a ler O Pasquim, excelente hebdomadário (como eles próprios se intitulavam) que misturava boa dose de humor com política de resistência cultural à ditadura militar de que o Brasil havia sido acometido, desde o golpe de 1º de abril de 1964.
Durante o curso superior passei a ler a Folha de São Paulo, que tornou-se o baluarte dessa resistência político-cultural.
Tomei conhecimento da Folha durante o Projeto Rondon, no Pantanal do Mato Grosso. Eu alternava com o saudoso colega Grimberg Botelho a tarefa de ir comprar um exemplar na cidade de Corumbá, próxima a Ladário, onde estávamos sediados.
Continuei a ler esse jornal quando fizemos residência médica em São Paulo, e depois continuei a lê-lo em João Pessoa.
Recordo-me de chegar ao plantão na UTI do hospital São Vicente de Paula para render o Dr. Lauro Wanderley Filho e encontrar um exemplar da Folha de São Paulo todo despetalado e espalhado pelo chão do quarto dos médicos: Laurinho nunca lia bem-comportado o seu jornal, deixando para o plantonista seguinte o trabalho de juntar as páginas.
A Folha de São Paulo ainda resiste como jornal escrito. Já os nossos jornais, que fizeram e registraram a história do nosso Estado, foram extintos, passaram a freqüentar um longo obituário: O Norte, fundado por Assis Chateaubriand, dos Diários Associados, que durante muitos anos dominou a imprensa paraibana, e gerou muitos e bons jornalistas. O Diário da Borborema, que era publicado em Campina Grande. O Correio da Paraíba, fundado por Teotônio Neto. O Momento, do bravo Jório Machado, já falecido. O inovador semanário A Carta, do lendário Josélio Gondim, com excelentes entrevistas de capa, como a memorável entrevista com Hosana, a Dama do Cabaré. O Jornal da Paraíba, fundado pelo recém-falecido José Carlos, do Grupo São Braz. E mais recentemente perdemos o Contraponto, de João Manuel de Carvalho.
A lista continua, só interrompida pela brava e heróica resistente A União. !No pásaran!, parece dizer o nosso jornal, porta-voz oficial do Governo do Estado da Paraíba.
A União sempre foi uma verdadeira universidade de jornalismo. Composto de pelo menos seis cadernos, acrescido de uma excelente revista nas edições dos domingos, A União é um jornal noticioso físico muito bem editado e, principalmente, um excelente veículo da cultura paraibana.
O seu viés governista é compreensível e a gente releva, pois é a voz do dono. O que importa é o acervo composto pelas colunas assinadas por excelentes articulistas, a exemplo de Gonzaga Rodrigues e Sitônio Pinto. E as boas reportagens locais e regionais.
Nos domingos, A União traz o Correio das Artes, sempre com reportagens ricas em arte, cultura e literatura. A sua edição é acrescida de uma excelente revista no último domingo de cada mês. Pois foi justamente A União quem me salvou, ou melhor: quem salvou, desta vez, a tarefa de Amanda.
Fica no ar a pergunta: será este o começo do fim deste tipo de tarefa escolar? Como será que os nossos pequenos estudantes irão realizar os seus deveres de casa? É claro que não vai recortar o tablet ou o smartphone. Só o tempo dirá.