DIVÃ LITERÁRIO, por Babyne Gouvêa

‘Gabriela’, por Sônia Braga (Reprodução do YouTube)

Três senhoras resolvem fazer terapia em grupo, sendo observadas às escondidas por seus respectivos criadores. Nesse cenário, o Dr. Sigmund Freud conduz a assistência às suas pacientes num aprazível consultório, situado às margens da Baía de Todos os Santos.

Sessões nas tardes das terças-feiras foram reservadas àquelas senhoras – Aurélia, Capitu e Gabriela. Elas se apresentaram ao terapeuta como ícones e musas do Romantismo, Realismo e Modernismo que marcam a obra de três dos mais consagrados escritores brasileiros de todos os tempos.

Primeira Sessão

Iniciada a sessão, o Dr. Freud fez uma breve introdução ao processo terapêutico e passou a palavra à Aurélia, que afirmou ser esposa de Fernando Seixas, que o seu casamento foi um negócio, proposto por ela e por ele aceito, sujeitando-se ao poder do dinheiro. Adiantou que está tudo registrado no livro ‘Senhora’, de José de Alencar.

A próxima a se pronunciar foi Capitu, de espírito livre e independente, esposa de Bento Santiago, marido ciumento e desconfiado. Deu ênfase ao espaço comercial do casamento, como se fosse mais um negócio a ser realizado. Salientou que tudo está bem explicado em ‘Dom Casmurro’, de Machado de Assis.

Na sua vez de falar, Gabriela, sertaneja que respirava liberdade, enalteceu o seu marido árabe Nacib, que a levou para o seu bar, casando em seguida com ela. Lembrou que estava tudo muito bem descrito em ‘Gabriela Cravo e Canela’, de Jorge Amado.

Segunda Sessão

Recepcionando as suas pacientes rapidamente, Dr. Freud deixou-as à vontade para associações livres.

Mantida a sequência da primeira sessão, Aurélia confessou que o seu casamento foi uma questão de vingança. Seu único objetivo, apesar de amar Seixas, era humilhá-lo e submetê-lo a seus caprichos, usando o dinheiro para tanto, motivo pelo qual ele a havia deixado.

Capitu, por sua vez, revelou que o seu casamento era cheio de desconfiança, com insinuações de uma possível traição entre ela e o melhor amigo do seu marido, provavelmente por ter comportamento que contrariava os costumes dos seus contemporâneos.

Já Gabriela admitiu os seus desejos e vontades. Disse que foi flagrada na cama com outro e, como consequência, Nacib anulou o casamento, mas que a mantinha como cozinheira do seu bar e amante como antes, conformando-se com a situação e aceitando a sua liberdade.

Terceira Sessão

Dr. Freud resolveu inovar nessa sessão, introduzindo um método dinâmico para quebrar a monotonia do tratamento. Esclareceu não poder ser o facilitador, por contradizer a sua formação de psicanalista, mas ficaria acompanhando a performance das clientes. As pacientes concordaram em desvendar melhor o perfil das suas personagens nesse novo recurso terapêutico, exaltando a firmeza de suas personalidades.

Aurélia, jogando a almofada ao chão, chama as amigas para darem início à dinâmica. Fala se define como feminista. Mostra que, apesar de sofrer as consequências de seu próprio plano de vingança, age como tal para se posicionar como dona de si e contra a hipocrisia da sociedade da sua época.

Capitu, em seguida, diz que não se deixou abalar pela insegurança de Bentinho, mantendo sua personalidade forte e não cedendo às pressões de uma sociedade machista que a rotulava como ‘solícita demais’ para uma moça de família.

Falando por último, como sempre, Gabriela diz personificar as transformações de uma sociedade patriarcal, arcaica e autoritária em pleno Nordeste brasileiro.

Dr. Freud aprova a atuação das pacientes e dá encerrada a sessão.

Última Sessão

O terapeuta sugere às senhoras uma pausa nas sessões, já que tinham sido introduzidos temas literários, inéditos ao seu método psicanalítico; pediu licença, então, para um tempo de estudo diante do inusitado no seu trabalho.

Propôs, em seguida, todos seguirem para o Pelourinho, onde Jorge Amado e sua esposa Zélia Gattai estariam à espera deles, na Fundação.

Nesse ambiente, esteve reunida a cúpula da literatura brasileira, com um convidado especial – o músico Dorival Caymmi – recepcionando todos com a ‘Modinha para Gabriela’, na voz de Gal Costa. Especialmente elas – Aurélia, Capitu e Gabriela -, todos sentiram-se lisonjeados e representados com tão bela homenagem.

É BOM ESCLARECER
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Uma resposta para DIVÃ LITERÁRIO, por Babyne Gouvêa

  1. Texto inteligente e criativo. E muito bem escrito.