AVES POÉTICAS, por Babyne Gouvêa

Uma obra inspirada na natureza - Mundo Sustentável | André Trigueiro

Tom Jobim, nosso Maestro Soberano (Foto: Veja)

Num domingo de verão, um onírico encontro de aves ocorreu no Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Lá estavam celebridades do Romantismo, do Parnasianismo, e do Modernismo, representando a passarada nos atinentes movimentos literários brasileiros.

Naquela área próspera e encantadora, entre as orquídeas, palmeiras imperiais, vitórias-régias, e outras variantes da flora local, teve início o evento com as apresentações oportunas, e em seguida os contentamentos e as lamentações das aves foram sendo expostos e realçados. O Sabiá do Romantismo, com a maior parte da plumagem parda e o ventre de uma coloração vermelho-amarronzado e bico amarelo-escuro, foi apreciado pelo seu representante – Gonçalves Dias -, deixando o pássaro envaidecido, e assim exigiu que fosse declamada a parte do poema Canção do Exílio, que o cita:

“Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.”

O Sabiá ficou agradecido e exultante em ter sido um dos protagonistas citados em tão relevante acontecimento. A ave do Parnasianismo, retratando o sentimento de um pássaro que depois de retirado da natureza não se adaptou à vida sem liberdade e, insatisfeito, se inscreveu fazendo um aparte pedindo ao seu intérprete – Olavo Bilac -, para enfatizar a sua mágoa em ter sido encarcerada. Foi prontamente atendida, e trecho do poema O Pássaro Cativo foi lido, atendendo o seu desejo:

“É que, criança, os pássaros não falam.
Só gorjeando a sua dor exalam,
Sem que os homens os possam entender;

Por que me prendes? Solta-me, covarde! Deus me deu por gaiola a imensidade: Não me roubes a minha liberdade…
Quero voar! voar!…”

Desejo atendido da segunda protagonista, deu-se continuidade ao inédito simpósio, com o pronunciamento da andorinha que, com a sua beleza, elegância e agilidade em seu voo e, simbolizando o Modernismo, destacou o seu orgulho por ter sido cotejada pelo seu esclarecedor – Manuel Bandeira. E a exemplo dos demais, solicitou que se tornasse público o que tinha lhe deixado em êxtase, e foi prontamente atendida:

“Andorinha lá fora está dizendo:
-Passei o dia à toa, à toa.

Andorinha, andorinha, minha canção é mais triste:
-Passei a vida à toa, à toa.”

Após a apresentação da terceira protagonista, inesperadamente surgiu a figura excêntrica e intrusa de Galileu Galilei, alegando ser de suma importância a sua ingerência. Pediu licença para participar do colóquio, defendendo as águias e depreciando os pássaros pretos. Audacioso e sem permitir ser interrompido, colocou a sua opinião, em nome dos filósofos:

“Acredito que os filósofos voam como as águias e não como pássaros pretos. É bem verdade que as águias, por serem raras, oferecem pouca chance de serem vistas e muito menos de serem ouvidas, e os pássaros pretos, que voam em bando, param em todos os cantos enchendo o céu de gritos e rumores, tirando o sossego do mundo.”

Esse pronunciamento provocou um início de alvoroço, numa mistura de reverência ao polímata italiano e menosprezo ao que ele avaliou. Mas, esse momento foi passageiro, e de forma providencial adentrou ao evento o arrendatário da área onde estava havendo a reunião – Antônio Carlos Jobim -,que abafou a voz de todos, proclamando:

“A música é o canto do passarinho melhorado, computadorizado, arranjado.”

Continuou o discurso atualizando e distribuindo conhecimentos sobre a importância das aves, a todos que estavam no ambiente, fazendo um alerta para a questão da sustentabilidade ambiental, constantes nos trechos de Borzeguim: 

“deixa o mato crescer em paz…escuta o vento cantando no arvoredo…e gavião grande é bicho sem fronteira…”

O encontro ganhou brilho e entusiasmo de todos, e os debates que sucederiam às colocações, foram secundarizados, e de forma conjunta os presentes cantaram a música Passarim, com o seu desfecho sendo realçado e repetido efusivamente, demarcando o final do colóquio:

“Passarim quis pousar não deu
Voou, voou, voou, voou, voou”

O clamor literário deixou os espíritos gratos, alçando voos à imaginação.

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