DESABAFOS DE UMA CIDADÃ, por Babyne Gouvêa

A cidadã que vive em mim ainda tem esperanças de encontrar um Brasil de brasileiros respeitando os seus pares. Sou uma mulher que sonha em viver em um Brasil menos desigual, um Brasil cujo símbolo máximo não sejam dedos apontados para nós em forma de arma, um Brasil onde o projeto do governante seja o de salvar vidas e não o de incitar o ódio, o medo, o delírio, o preconceito, a intolerância, a mentira e tantos outros sentimentos avessos a um Estado Democrático de Direito.

Sou de um tempo em que a decência e o dever de cidadania faziam parte incondicional do caráter do homem. Tento externar a minha perplexidade diante da mudança de valores na nossa sociedade, onde a esperteza vence a dignidade. Eu me pergunto que gente é essa que vemos nos governos? Que gente é essa que passou por universidades e se comporta como desumanos? Houve uma inversão de princípios, passados às novas gerações, que levianamente se comportam como se não vivessem numa comunidade civilizada.

Em nenhum momento o presidente assumiu a liderança de ações que pudessem reduzir o impacto inevitável causado pela doença Covid, na população e nas consequências econômicas. Negou a ciência, a lógica e estimulou o caos da ignorância, colaborando para a perda de mais de 260 mil vidas, além de contribuir para o país se tornar uma ameaça à humanidade.

Por outro lado, temos a violência fazendo parte do nosso cotidiano, sendo vista como algo ‘natural’ e o salve-se quem puder tomando proporções indomáveis, totalmente sem controle. E como é triste ver gente cultivando o sentimento de ódio e aversão ao semelhante, numa perversão sem precedentes, sendo estimulada à compra de armas por iniciativas do seu comandante.

Não, a esse caos não podemos assistir inertes; devemos, pelo menos, nos indignarmos. Vivemos um daqueles momentos da História em que pensar profundamente o presente é o único caminho para vencermos a passividade e caminharmos para construir um futuro socialmente justo e verdadeiramente democrático.

  • Babyne Gouvêa é Biblioteconomista

SE A DOR TEIMAR, por Bethania Rolim da Nóbrega

Frases e pensamentos de tristeza – Frases Famosas .com.br

As vezes a dor é enxerida e fica fazendo hora extra no coração da gente. Por isso, se ela insistir, diga isso pra ela!

SE A DOR TEIMAR

Sei que a dor chega
E quando chegar
Não abro mais a porta
Não faço sala
Nem chamo pra sentar

Não deixo que entre e fique
Fazendo morada
Ela que se saia
Se banque
Se pique
Se vire
Se lixe pra lá
Favor pegar o beco
Esse mesmo
Sem saída

Pra ela
Ainda é pouco
Quero mais
É que se vá
E mesmo assim
Se ela insistir
Faço dela
Uma linda poesia

QUEM MATOU CIDA SARINHO?

Cida Sarinho morreu ontem (12) em hospital de João Pessoa (Foto copiada do ParlamentoPB)

Cida Sarinho partiu muito cedo e eu não consigo acreditar que haja uma razão para isso, que a sua morte foi apenas por um vírus, esse que provavelmente nasce da hipocrisia que ela combatia, das desrazões humanas que maltratam o que nos é mais essencial e nos constitui, os recursos naturais.

Eu sei que ela e milhares de pessoas poderiam ainda estar vivas se não tivéssemos um governo que, desde as primeiras mortes, governa para o sucesso do vírus. Talvez alguém me acuse de politizar esta perda irreparável, mas, inclusive por respeito a ela, não cometerei o equívoco de separar o inseparável.

O atendimento à saúde, à educação e a promoção da vida, principalmente para as comunidades mais carentes, o público jovem, os idosos e as mulheres, foram, durante toda a sua vida profissional, objeto de muita dedicação técnica, política e afetiva.

Uma Assistente Social de verdade desaprende rápido a separar essas três coisas, pois descobre, também rapidamente, que a técnica não basta, que a política não basta e que é com a massa dos afetos que ela, mesmo sabendo que jamais conseguirá de forma plena, tentará tapar todos os buracos, curar todas as feridas e promover vida, dignidade e alegria no coração das pessoas mais carentes.

Quem não conheceu Cida Sarinho e quiser ter notícias dela, vá até a Favela do S, até o Gervásio Maia, no Baixo Roger e tantas outras comunidades da periferia de João Pessoa. Em qualquer desses lugares procure por uma mulher que transformou a vida de dezenas de adolescentes e que também perdeu outras dezenas para a violência, a miséria e as drogas (na realidade brasileira, a (o) Assistente Social que não aprende a perder não consegue jogar nem descobre a importância de um gol, mesmo quando o placar fecha em 10 a 1).

Procure mulheres violentadas pela própria história, que conseguiram, através do trabalho de Cida Sarinho, conquistar dignidade e autoestima, encontre também outras tantas que não conseguiram, mas que reconheciam Cida nas ruas, vinham abraçá-la e muitas vezes, mais uma vez, chorar de alegria ou de tristeza nos seus ombros.

Pois foi essa mulher, que viveu intensamente tantas vidas, que nunca perdeu a chance de investir seus próprios recursos para sanar uma necessidade mais radical ou para pagar um lanche para adolescentes famintos, essa mulher que lutava diariamente pela igualdade de direitos e de oportunidades, que transformava a sua indignação em atitude e força de trabalho, essa mulher intensa em tudo e em tudo que exercia apaixonada, que morreu do que sempre combateu: a incompetência na gestão dos recursos e das políticas públicas.

Não posso garantir que Cida Sarinho estaria viva se, há um ano, tivéssemos iniciado um esforço de combate ao Covid, coordenado pelo governo federal, que potencializasse os recursos regionais de forma racional, proativa, multidisciplinar e com respaldo técnico e científico. No entanto, certamente estaríamos poupando milhares de vidas e livrando da dor e da perda milhares de famílias. Talvez esta dor não estivesse agora na casa de Iago, Caíque e Jéssica, na casa de Osvaldo e de Rosa, na casa de Méa, de Déa, de Helena, de Mariinha, de tantos de nós. Muito provavelmente Cida, sim, estaria viva.

O que todos sabemos é que o presidente, desde a primeira oportunidade, em meados de fevereiro de 2020, negligencia, ignora, escamoteia, tergiversa e ironiza o poder letal do Covid 19 e, como um subverme institucional, fragiliza o Ministério da Saúde e subtrai o poder de reação natural e de articulação das instituições públicas de saúde de todo o país.

Se tivéssemos um Presidente, as chances de Cida e das milhares de pessoas que morreram até agora teriam sido muito maiores. Este raciocínio também é válido para as que serão infectadas amanhã, para as que amanhã morrerão e, inclusive, para as pessoas que discordam de mim agora e morrerão em breve do mal que defendem. Os brasileiros não têm, mas o vírus tem um presidente pra chamar de seu. Muitos vermes também têm.

Cida e mais 2.151 pessoas morreram, neste dia 12 de março de 2021, pela ação do Covid 19 e pela incompetência insana e genocida do verme mor que preside o nosso país. Se ele fizesse o que tinha e tem que ser feito, se ao menos não atrapalhasse quem quer fazer, muitos milhares de vidas estariam sendo poupadas, mas se não fossem tantas e apenas uma vida fosse salva, todo o esforço já teria sido válido.

Um governante não tem direito de errar, mas é humano e erra. O que não se pode perdoar ou admitir é a insistência no erro, mesmo com as pessoas caindo mortas ao seu lado, sob sua ironia e insensatez. Um governante é para a sua comunidade, para o bem dela e só o bem da população justifica o poder que ele concentra. Não vivemos em uma monarquia da idade média, não estamos a serviço do rei. Se há um déspota no poder a democracia está vilipendiada, o povo está sob o poder de um governo criminoso.

Luz e paz para Cida Sarinho, justiça para todas as pessoas que morreram e que morrerão por consequência da mediocridade na política e na gestão pública brasileira.

Texto de Gilson Renato

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A DESTRUIÇÃO DO NOSSO MAIOR PATRIMÔNIO, por José Mário Espínola

Quatro pessoas morrem à espera de leitos de UTI em Ribeirão Pires -  Notícias - R7 São Paulo

Em todo o país, UTIs lotadas e milhares de infectados em estado grave à espera de um leito (Imagem: R7)

Hoje a Família Alvinegra amanheceu com uma notícia que deixou a todos nós muito tristes. Um bom amigo, nosso companheiro dos bons e maus momentos do Botafogo, que sempre estava presente em todos os jogos da Torcida do Ricão, perdeu para a Covid 19 o seu segundo filho em pouco mais que uma semana. Ambos adultos saudáveis e ainda gozando da plena juventude.

É muito difícil conformar-se e superar semelhante perda. Considero uma inversão da ordem natural: pai enterrar filho. Torcemos para que o amigo botafoguense e sua família tenham forças para superar essa dor. O terrível acontecimento nos leva a perguntar, contudo, por que chegamos a isso. Como chegamos? Poderia ter sido diferente? É muito difícil responder. Mas alguns fatos nos fazem pensar que, sim, poderia ser diferente.

***

Na década de 1970, mais exatamente em 1975, o Brasil vivenciou uma experiência inusitada. Diante da epidemia de meningite C, foi necessária uma operação gigantesca e inédita: vacinar toda a população brasileira num curto espaço de tempo, para vencer a velocidade de expansão da doença.

Na época estávamos em plena ditadura militar. O presidente era o general Ernesto Geisel e o ministro da Saúde, o mineiro Paulo de Almeida Machado. Num prazo exíguo, o ministro aparelhou como pôde o Programa Nacional de Imunização (PNI) e realizou a primeira grande campanha nacional de vacinação em massa num curto período de tempo. Foi um sucesso.

Segundo historiadores, depois dessa campanha o PNI foi praticamente abandonado pelo ministro Almeida Machado, não realizando mais campanhas nacionais, ficando a vacinação limitada a ações isoladas na rotina dos postos de saúde.

Nos governos seguintes, o ministério da Saúde incrementou o PNI, que se aperfeiçoou e tornou-se modelo para o mundo, especialmente na área de imunização em massa. E atingiu o seu ápice na administração José Sarney com o ministro Seigo Tsusuki, que realizou a primeira Campanha Nacional de Imunização contra a hepatite B. Logo depois enfrentou um surto de meningite meningocócica B.

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Foi com esse elevado conceito, nacional e internacional, que o presidente eleito Jair Messias (?) Bolsonaro encontrou o Programa Nacional de Imunização do Ministério da Saúde. O programa era capaz de realizar campanhas de vacinação quase que relâmpagos, atingindo facilmente níveis de imunização superiores aos 90% em muito pouco tempo.

Para titular da pasta, Bolsonaro nomeou o deputado federal Henrique Mandetta. Ortopedista pediátrico de formação, o ministro Mandetta soube montar uma equipe respeitável, especialmente na área da epidemiologia. Passou o ano de 2019 administrando discretamente, como parece ser o seu estilo, respeitando as características de cada um dos seus auxiliares. Organizou todos os programas de sua pasta, inclusive o PNI.

Demonstrando capacidade de trabalhar em equipe, ao assumir em janeiro o ministro Mandetta jamais imaginaria como essa equipe seria útil para o país, um ano depois.

Em dezembro de 2019, surgiram na cidade de Wuhan, na China, os primeiros casos de uma síndrome respiratória aguda gravíssima, extremamente contagiosa e letal, causada pelo coronavírus, e que foi batizada de covid 19.

Logo, logo Wuhan se tornaria o epicentro dessa doença viral grave como a humanidade moderna nunca tinha vivenciado, desde a epidemia mundial de gripe espanhola, na década de 1920 do século passado.

Depois de se espalhar pela Europa, foi no mês de fevereiro de 2020, durante o carnaval, que surgiram os primeiros casos de covid 19 no Brasil. A 11 de março foi decretada a pandemia global pela Organização Mundial de Saúde. No dia seguinte surgiu o primeiro óbito no nosso país.A partir daí, o Brasil passou a assistir a evolução da doença, dia-a-dia, exposta pelo próprio ministro Mandetta com a sua equipe.

Embora o povo brasileiro a princípio tenha ficado aflito, passou a sentir-se mais tranquilo pela segurança que essa equipe passava para nós, em seus informes diários, sob a liderança do ministro Mandetta. Mas, até parece que o capeta, insatisfeito por que a situação parecia sob controle, estava rondando o nosso país, buscando uma maneira de fazer piorar as coisas. E encontrou um ponto fraco na nossa defesa: logo na pessoa do presidente Bolsonaro!

Até então, o presidente só olhava de longe sem atrapalhar, embora negasse a gravidade evidente da epidemia. Porém, mal aconselhado pelos seus filhos e outras figuras de pensamento deformado que cultiva em torno de si, o presidente engravidou pelos ouvidos. Eles botaram na cabeça presidencial que o ministro da Saúde estava “aparecendo demais”.

E na qualidade de pessoa medíocre que é o nosso presidente, qualquer um que apresente nível um pouco elevado de inteligência, por menor que seja, causa-lhe inveja. E instigado por sua turma, forçou a demissão do ministro Mandetta, por puro despeito.

Para infelicidade geral da nação, junto com o ex-ministro saíram todos aqueles especialistas competentes que compunham a sua equipe: epidemiologistas, infectologistas, sanitaristas. A essa altura, as mortes começaram a se multiplicar.

O que a nação estarrecida assistiu foi uma sequência de filmes de horror. Primeiro, com a nomeação de um ministro que demonstrou apatia para com a importância do cargo. Como ele se recusou a adotar os protocolos pouco científicos que o presidente queria impor, também foi demitido. E as mortes aumentando…

Para o seu lugar, o presidente encontrou o ministro ideal, segundo o seu padrão: um general da ativa, apresentado como médico veterinário e militar especializado em logística. E que não administra de fato a pasta, fazendo apenas tudo o que o presidente manda.

A princípio o fato de ele ser da área de saúde, mais ainda com especialização em logística, gerou uma esperança de que pudesse ser um bom ministro, que pudesse administrar melhor a grave crise sanitária que estava se agravando. As mortes se multiplicando…

Surgiu o advento da possibilidade muito breve de vacinação, o que significava esperança de dias melhores, econômicos e sociais. De normalidade plena.

Ainda em meados do segundo semestre de 2020 veio a boa notícia: a vacina começava a se tornar uma realidade possível já para os próximos meses. E de vacinação entendíamos nós, que tínhamos um dos melhores sistemas de imunização do planeta. Éramos capazes de vacinar a nossa população em muito pouco tempo. Para isso era preciso apenas que tivéssemos doses suficientes de vacinas. Mas esse sonho logo se desvaneceu.

Com a perspectiva da iminente concretização da vacina, todos os países começaram a se mobilizar, fazer planejamento para ter vacinas suficientes para imunizar as suas respectivas populações contra a doença terrível, trazendo o planeta de volta à normalidade. Menos o Brasil.

Para azar nosso, parece até que o cão é quem estava (está?) no comando. Pois o nosso Grande Líder Bolsonaro não acredita em vacinas! Aliás: ele não acredita em ciência. Pelo menos é o que podemos depreender do seu comportamento explicitamente negacionista, sempre dando mau exemplo de desrespeito às medidas sanitárias preconizadas pela entidades mundiais de saúde. O general-ministro, claro, passou a também não acreditar na ciência. E as mortes aumentando…

Assim, apesar de termos um especialista da logística à frente do ministério mais importante para o Brasil no grave momento que estamos vivendo, esse estrategista NÃO PROVIDENCIOU vacinas para imunizar o nosso povo. Negava, com essa omissão, a possibilidade de um retorno mais rápido à normalidade da nação. Que conta cada vez mais mortos.

E quando as vacinas chegaram, encontraram um ministério da Saúde com o seu PNI sucateado, desmantelado, tendo perdido a capacidade de promover vacinações em massa, como era até um passado recente.

A principal consequência é o atraso criminoso da vacinação da população, esperança de dias melhores, de diminuição da mortalidade, de redução do número de casos com a consequente melhora na capacidade de absorção pelo sistema de saúde, oferecendo melhores chances de sobrevivência para aqueles que forem acometidos.

Mas isso está longe de acontecer, pois Jair Bolsonaro, O Mito, havia destruído o nosso patrimônio sanitário maior: o Programa Nacional de Imunização. Justamente no momento em que o número de mortos acelera na direção de um recorde sinistro: 300 mil mortos!

Triste realidade.

ESSES MOÇOS…, por José Mário Espínola

Lupicinio-Rodrigues

Lupicínio Rodrigues (foto copiada do site Vida Nova)

Esses moços, pobres moços… Assistindo ao noticiário veio-me à mente a belíssima canção, composta pelo cantor e compositor Lupicínio Rodrigues, que faleceu em 27 de agosto de 1974, com apenas 60 anos de idade.

Conta a história que ele compôs essa música no ano de 1947, com o objetivo de convencer seu amigo Hamilton Chaves a não se casar, pois tinha APENAS 22 anos de idade. Lupicínio queria alertá-lo para as surpresas da vida, e aos 33 anos achava-se um bom conselheiro.

Desconheço se o seu amigo aceitou ou não o conselho. O fato é que, ao assistir às noticias da pandemia, me foi inevitável a conotação com a música e com a intenção de Lupicínio: o alerta para que alguém evite cometer atitudes irresponsáveis pelas quais depois venha a se arrepender.

Pois não deixa de ser alarmante, para mim, o crescimento exponencial do número de casos da doença covid 19. E quando nós olhamos mais detidamente o perfil epidemiológico, ficamos assombrados com a evolução acontecida nos últimos três meses.

Até novembro do ano passado, morria bem menos gente por covid 19. E dentre os que morriam era muito maior o número de pacientes idosos, acima dos sessenta anos em diante. Estes significavam pouco mais de dois terços dos óbitos e os pacientes falecidos abaixo dessa idade eram menos de um terço. Esse também era o perfil dos pacientes internados pela doença.

Hoje, a estatística mostra uma inversão: quase dois terços de pacientes relativamente jovens (pelo menos não-idosos) ocupam os leitos hospitalares e morrem, contra menos de um terço de idosos.

O que pode ter acontecido de tão forte nesse período que possa ter influenciado a mudança de um perfil epidemiológico?

A resposta básica me parece ser apenas uma: a sabedoria de Lupicínio! A mudança no comportamento dos jovens.

Desde o início da epidemia, os idosos foram aconselhados a se isolarem o máximo possível. E obedeceram. Os menos-idosos e os mais jovens, por sua vez, de forma coletiva nunca obedeceram à recomendação de se isolarem e usarem máscaras corretamente.

Como a princípio morriam menos, parece que lhes subiu à cabeça a sensação de serem super-heróis. Dificilmente usaram máscaras ou se isolaram. Logo vinha lá de cima o mau exemplo do presidente da República, Jair Messias(?) Bolsonaro, que sempre negou a doença e a ciência, e nunca apoiou ou ordenou o isolamento rigoroso, o bloqueio total, como fizeram líderes de países que tiveram melhor evolução que o Brasil.

Nesse ínterim, o isolamento dos idosos contribuiu para inverter a curva epidemiológica, que no início de novembro já estava quase totalmente achatada. A epidemia, então, parecia estar controlada e a caminho do fim. Viva!

Mas eis que o cão atentou as autoridades estaduais e municipais, que foram pressionadas pelos segmentos econômicos, estes liderados pelo presidente da República, que dá o mau exemplo promovendo aglomerações sem usar máscaras. Assim, afrouxaram o controle sanitário.

Para agravar, veio a campanha eleitoral e o que se viu foi um “liberou geral” totalmente irresponsável. Repito sempre: as autoridades municipais e estaduais jamais poderiam ter permitido concentrações, naquela campanha. E, bem antes da campanha eleitoral, no início da pandemia, o presidente da República deveria ter tido uma atitude responsável, tomado as rédeas do país e assumido o papel do verdadeiro líder que ele nunca foi. E decretado o isolamento social de forma rigorosa.

Na sequência da mobilização eleitoral vieram as comemorações das festas natalinas, as comemorações de fim de ano, os “chás de macumba,” como diz (com toda a propriedade!) o Dr. Lauro Wanderley. Depois chegou o veraneio, culminando com o carnaval.

São medonhas as concentrações organizadas por empresários criminosos, as festas diabólicas chamadas de “paredões”, que contam com a tolerância cúmplice das autoridades civis. A consequência é o agravamento quase descontrolado da pandemia no Brasil.

Como sou componente da categoria de idosos, voltam à minha mente as sábias palavras de Lupicínio Rodrigues:

“Esses moços, pobres moços…/
… não passavam, aquilo que eu já passei…/
…Saibam que deixam o céu por ser escuro/
E vão ao inferno à procura de luz…”

Infelizmente, no momento que estamos vivendo, a letra da bela música me faz lembrar as luzes estroboscópicas e o som infernal dos “paredões” que os jovens irresponsáveis estão protagonizando.

Triste Brasil, que se veste de luto aceitando passiva e covardemente as mortes dos seus entes queridos. Triste juventude, que não escuta mais as vozes da experiência…

***

ESSES MOÇOS
Lupicínio Rodrigues

Esses moços, pobres moços
Ah! Se soubessem o que eu sei
Não amavam, não passavam
Aquilo que já passei
Por meus olhos, por meus sonhos
Por meu sangue, tudo enfim
É que peço
A esses moços
Que acreditem em mim

Se eles julgam que há um lindo futuro
Só o amor nesta vida conduz
Saibam que deixam o céu por ser escuro
E vão ao inferno à procura de luz
Eu também tive nos meus belos dias
Essa mania e muito me custou
Pois só as mágoas que trago hoje em dia
E estas rugas o amor me deixou

Esses moços, pobres moços
Ah! Se soubessem o que eu sei
Não amavam, não passavam
Aquilo que já passei
Por meus olhos, por meus sonhos
Por meu sangue, tudo enfim
É que peço
A esses moços
Que acreditem em mim

ALCUNHA IMPLACÁVEL, por Babyne Gouvêa

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Imagem meramente ilustrativa (Foto: br.freepik.com)

Ele saía todos os domingos, bem cedo, para assistir à missa na capela próxima à sua casa. Nos primeiros sinais do amanhecer, ele se levantava para se vestir num ritmo lento, os seus muitos anos não permitiam movimentos céleres. Tinha o hábito de chegar cedo à capela para assegurar um banco na primeira fila que lhe permitia uma melhor visão do sacerdote.

Não fazia a primeira refeição do dia porque comungava, e a religião católica exigia um jejum de três horas antes de praticar esse rito. Vestia sempre um terno de linho branco com uma flor na lapela, sapatos pretos, chapéu de feltro e uma bengala que lhe dava apoio ao andar.

A caminhada, embora curta para qualquer pedestre, para ele ganhava proporções quilométricas, pela lerdeza de sua locomoção. Com a coordenação motora comprometida, costumava arrastar os sapatos fazendo um ruído bem característico de sola gasta, atraindo a atenção da meninada que no horário de sua passagem já se encontrava fora da cama.

Estava estabelecida a zombaria a ele dirigida. Sem nenhuma noção de respeito aos mais velhos, a criançada apelava para a criatividade em nomes depreciativos jogados na direção do idoso, pois no passado havia sido padeiro e percorria as ruas do bairro empurrando o carrinho e anunciando as suas especialidades:

– PÃO DE BICO! PÃO SUIÇO! PÃO DOCE!

Com o tempo e a impaciência da velhice, anunciava todos de uma só vez:

– PÃO DE BICO, SUIÇO E DOCE!

A soma dos dois últimos pães soava assim, para a molecada, que gritava escondida:

– PÃO DE BICO SUICIDOU-SE!

Isso lhe irritava profundamente! Não suportava a galhofa, e muitas vezes não respondia com educação. Mas, para a sua irritação, o apelido pegou.

Agora já aposentado, ele não dava sinais de reação, seguia o seu itinerário de forma inabalável, muitas vezes procurando equilíbrio na mureta em torno da capela.

Dando sinais ofegantes, ele chegava ao destino dominical, sentava puxando primeiro uma perna da calça e depois a segunda perna, para acomodar de forma confortável o volume do seu corpo. Tirava do bolso da calça o lenço de cambraia branca com as suas iniciais e levava ao rosto e ao pescoço para enxugar o excesso de transpiração que o percurso lhe causava.

Começava a cerimônia eucarística e o seu semblante era de êxtase, tamanho o contentamento de ter conseguido chegar a tempo e de ter conseguido superar as tentativas infantis de lhe atrasar o roteiro. Encerrada a missa, ele fazia o trajeto de volta sob um sol causticante, obrigando-o a fazer diversas paradas para secar com o seu lencinho a sudorese excessiva escorrendo por todo o corpo.

No retorno à casa, fazendo o mesmo circuito, mais uma vez se tornava alvo do escárnio infantil, até que, depois de muitos domingos consecutivos, ao ouvir um certo cognome sendo ecoado em bom som – PÃO DE BICOOO – ele resolveu reagir – É A TUA MÃE!

Recolheu-se, então, em casa. Para sempre.

  • Babyne Gouvêa é biblioteconomista

ANTES DO PERFUME, por Ana Lia Almeida

Manifestação Ni Una a Menos no vão-livre do Museu de Arte de São Paulo (Masp), na Avenida Paulista, em 8 de março de 2017 (Rovena Rosa/Agência Brasil)

As perfumarias anunciam, com suas promoções, o Dia da Mulher. Que bom! É o dia em que muitos se esquecem de que somos vendidas o tempo todo como produtos e se esforçam em vender produtos para nós.

Estão lá, na novela e no programa do domingo, as moças bonitas que levantam a audiência com seus corpos nus. Estão também na propaganda da cerveja, tentando nos exigir que bebamos à vontade sem ter nenhuma barriguinha. Já as com cara de certinha estão vendendo cuscuz e máquinas de lavar roupa, ótimas donas de casa. Todas absolutamente transformadas em coisas, assujeitadas.

Os produtores e consumidores destas mulheres negam a história do Oito de Março. Há cento e cinqüenta e três anos, operárias americanas da indústria têxtil organizaram uma paralisação exigindo redução da jornada de trabalho de dezesseis para dez horas. Resultado: morreram carbonizadas por seus patrões, que simplesmente fecharam a fábrica e atearam fogo, em represália aos protestos.

Em reconhecimento à luta contra a opressão que estas mulheres vivenciavam, e que nós ainda vivenciamos em todas as esferas da vida além da do trabalho, foi criado o Dia Internacional da Mulher. Não é um dia bonitinho, feito para se ganhar um perfume. É uma data de muita luta, ainda que essa perspectiva às vezes pareça distante.

Isso porque a condição de ser feminista não é tão natural quanto a condição de ser mulher. Exige a percepção das relações desiguais e injustas travadas entre homens e mulheres, e a vontade de construir outra história. Sou feminista porque desde criança lembro de me indignar com a divisão das tarefas domésticas. Porque sou solidária com as mulheres violentadas pelos homens de sua família. Porque tenho uma filha a quem ensinarei a ser feminista também. Sou feminista porque quero um mundo melhor e tenho “a estranha mania de ter fé na vida”.

Antes das flores, do perfume ou do presente qualquer que você receba ou dê neste 8 de Março, pense no significado político deste dia. Pense nas suas relações dentro de casa, em que medida você anda lavando os pratos e decidindo os rumos da sua família. Pense no seu trabalho, como as mulheres são tratadas e que cargos ocupam. Pense no esforço quase sobre-humano de ser mãe, e como as funções que esse papel acarreta podem ser compartilhadas.

Só então passe o seu melhor perfume, companheira, e vá para a rua protestar por um mundo com igualdade de gênero.

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Publicado originalmente em março de 2010 no jornal Contraponto 

VACINAÇÃO DOS FAMOSOS, por Euripedes Mendonça

O líder espiritual tibetano Dalai Lama recebeu a vacina contra a covid-19 em Dharamsala, Índia, no dia 6 de março de 2021

Dalai Lama vacinado na Índia: exemplo e incentivo à imunização (foto copiada de bbc.com)

Após os 14 casos nacionais de denúncias de aplicação de “vacinas de vento”, passou este autor a observar detidamente as imagens (fotografias e vídeos) veiculados nas mídias sociais. Começo com quatro personalidades.

O líder espiritual Dalai Lama foi imunizado ontem (6), em um Centro de Vacinação da Índia. A foto surpreende positivamente pela técnica e paramentação da vacinadora, quase a mesma dos profissionais das UTIs/Covid. Portava gorro, máscara, avental e luvas.

No Brasil, destaco a vacinação de dois “reis”. O da música, Roberto Carlos, ocorreu no dia 1º deste mês, sendo de longe o mais paramentado de todos os famosos. Portava luva, boné, óculos, além da máscara.

Pelas imagens do vídeo, a vacinadora estava menos paramentada que o Rei, pois usava apenas um gorro e aparentemente “não aspira” e termina com a colocação padrão de uma mecha de algodão pressionado sobre o local da punção.

O vídeo não mostra o destino da mecha e se foi colocado depois um adesivo (tipo dos disponibilizados nos laboratórios de Análises Clinicas quando de punção venosa).

No último dia 2, a vez do Pelé, o Rei do futebol. Usava máscara. A foto demonstra a que vacinadora portava luvas e pulseira (adorno este não recomendado pela Norma Regulamentadora 32 do Ministério do Trabalho e Emprego e pela Anvisa).

Na Paraíba, destaco a vacinação, também em primeira dose, no dia 16 de fevereiro passado, do Dr. Tertuliano Brito. Nada mais nada menos que o cirurgião-dentista mais atuante na região nordestina no campo do cooperativismo de crédito e odontológico.

A observação do vídeo demonstra o famoso Dr. Tertuliano de máscara. A vacinadora portava um colete, máscara, aliança e relógio (adornos não recomendados pela NR 32 do MTE) e aparentemente também “não aspira”.

Também este autor tomou a sua primeira dose, mas, por não ser famoso, não há registro de imagem. Para finalizar, uma curiosidade e uma recomendação: ocorreu um empate técnico no tocante ao “braço oferecido para vacina”. Dalai e Pelé, o direito; Roberto Carlos e Tertuliano, o esquerdo.

Paramentação uniforme é fundamental

Sugiro que quando chegar a sua vez, tome a vacina, observe e torça para que até lá ocorra uma uniformização nacional da técnica de paramentação das vacinadoras(quase 100% do gênero feminino), conferindo mais tranquilidade para os vacinados.

Não esqueça de colocar a mecha de algodão em um saco plástico e descarte-o em local apropriado.

Todos contra o coronavírus. Deus na proteção de todos.

  • Euripedes Sebastião Mendonça de Souza é Médico