LÍNGUA DE MACHO (I)

Image for post

(Gif copiado de medium.com)

Seria o povo do falar português, ao lado do francófono, hispânico ou italiano, único da raça humana letrada capaz de qualificar pessoas e coisas com adjetivos em dois gêneros. Tem um porém, contudo.

Na ‘última flor do Lácio, inculta e bela’, quando nos dedicamos a adjetivar e recorremos aos nossos dicionários mais requisitados, deparamo-nos com extraordinária prevalência de adjetivos masculinos.

Quer ver uma coisa? Experimente pesquisar no Houaiss, Aurélio ou Michaelis. Com verbetes duas cabeças (‘bacana’, por exemplo) é mole. Mas, se precisar de uma ‘safada’, não vai encontrar. Só tem ‘safado’.

Isso mesmo. Adjetivos os mais safados, os menos edificantes, seriam privilégio masculino. Graças à predominância do macho sobre a fêmea – nos melhores dicionários do ramo – quando o opróbrio é a meta.

Temos, portanto, uma língua de machismo imbatível. Por razões históricas e culturais, claro. Conforme apanhado que fiz para reescrever artigo sobre o assunto que julgava esquecido entre os meus guardados.

Não deu pra fazer uma ‘apanhada’, naturalmente. Salvo, evidente, se a implicância fosse com substantivos, mundo que uma ‘apanhada’ pode frequentar com a alegria de uma criança brincando de pega-pega.

Outra. Se o colunista fosse mulher, seria ‘assistida’, enquanto escreve, por dicionário online. Mas se você for agora, agorinha mesmo, buscar ‘assistida’ em qualquer impresso ou na web, não vai achar. Já se procurar ‘assistido’, é ligeirinho.

E se o amigo ou amiga duvidar, sugiro fazer um joguinho caça-adjetivos no computador ou celular. Veja ‘apaixonada’ e logo em seguida, ‘apaixonado’. Como adjetivo, só vai dar masculino. Mais uma. Confronte ‘mentirosa’ com ‘mentiroso’. 

No caso da expressão adjetival da mentira, aparece apenas o masculino no planeta adjetivo dos dicionários! Por último, pra fechar, pergunto se alguém aí, motivado por esta leitura, deu vontade de espiar ‘homem’ e ‘mulher’ no dicionário.

Vamos ver como é? Vamos, vamos sim. Mas amanhã, na segunda e última parte desse exercício de cultura inútil com alguma utilidade, espero, para uns poucos interessados nesse inusitado predomínio na língua pátria.

Que poderia ser língua mátria, mas… Fazer o quê, se o próprio adjetivo é masculino?

É BOM ESCLARECER
O Blog do Rubão publica anúncios Google, mas não controla esses anúncios nem esses anúncios controlam o Blog do Rubão.

2 Respostas para LÍNGUA DE MACHO (I)

  1. Ivaldo Gomes escreveu:

    Pra você ver como esse mundo é patriarcal e machista. Até na língua e até nos buscadores.

  2. Aderson Machado escreveu:

    Belo artigo. Não tinha reparado nisso.
    Parabéns!