Operação Desumanidade: delegados da PF não participam e MPF vê boicote

A segunda fase da Operação Desumanidade, realizada na terça-feira (28) em Patos e região, não contou com a participação de delegados da Polícia Federal. A PF cedeu apenas agentes para ajudar procuradores da República, membros do Ministério Público da Paraíba e auditores da Controladoria-Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas do Estado (TCE) a cumprirem mandados de prisão, condução coercitiva, buscas e apreensões expedidos pela Justiça Federal.

A ausência dos delegados federais na ação de ontem ampliou ou no mínimo causou um tremendo racha entre o Ministério Público Federal (MPF) e a PF, acusada por procuradores da República de sabotar a Operação. Por sua vez, delegados dizem que o MPF assumiu sozinho as investigações porque sempre quis ter “um braço armado pra chamar de seu”, referindo-se à equipe dos agentes policiais que trabalhou sob ordens diretas dos procuradores.

A troca de acusações entre um lado e outro tem sido intensa nos últimos dois dias nas redes sociais que delegados e procuradores frequentam. Mas toda a insatisfação do MPF diante da denunciada ‘sabotagem’ da PF está exposta com todas as letras em mensagem eletrônica que circulou ontem entre procuradores da República de todo o país.

O texto ao qual o blog teve acesso não tem assinatura, mas presume-se que seja de um procurador com lotação e exercício na Paraíba. No que se supõe ter sido transmitido por i-meio, o autor revela que a PF viria colocando empecilhos ao trabalho desde a primeira fase da Desumanidade, ao ponto de o superintende regional da instituição na Paraíba ter se negado a grampear telefones dos investigados, além de ter pedido a um desembargador que declarasse a nulidade das investigações.

Eis o texto no qual a PF é acusada de sabotar a Desumanidade

Como já dito em outra oportunidade, na 1ª fase da chamada operação Desumanidade, tentamos realizar a investigação com a PF, que impôs uma série de empecilhos o que nos levou a realizar interceptação direta (utilizando o próprio equipamento da PF e depois do GAECO). Foram 5 períodos de interceptação, um na 1ª instância e 4 na 2ª (o PGR me designou para atuar junto com o colega Duciran Farena, Procurador Regional da República). No momento da deflagração, no cumprimento de mandados, atuaram promotores, procuradores, auditores da CGU e PRF’s fizeram a segurança. Durante essa primeira fase sofremos diversas tentativas de sabotagem do SR, que chegou ao ponto de pedir a nulidade da investigação ao desembargador, alegando que só delegado pode fazer interceptação (junto ao juiz de primeiro grau tentaram apenas via conversa).

Alguns colegas afirmaram que fariam diferente. Respeito, mas uma coisa é em tese, outra é na prática. O fato é que se não tivéssemos feito daquela forma, naquele momento, não teríamos obtido o resultado que se obteve. De qualquer forma, vários, também, afirmaram a necessidade de trazer a PF para a investigação e evitar o distanciamento. Assim o fiz nesta segunda fase. o delegado local realizou diligências dentro de um Registro Especial em favor da nossa investigação – não impedi que ele instaurasse IPL, foi opção dele e respeite. De posse das nossas diligências e das da PF, eu e Duciran obtivemos 3 mandados de prisão, 14 conduções coercitivas e 2 busca.

No dia 14/06, eu e o procurador-chefe substituto da PR-PB (Marcos Queiroga) deslocamo-nos até a Superintendência, ocasião em que os mandados foram entregues, cópia da investigação foi entregue, tendo sido acertado a execução por parte da Polícia Federal, com levantamento de endereços não levantados ainda, realização de oitivas por delegados (entreguei quesitos) e tudo quanto a polícia é habituada a fazer. Naquela ocasião, questionou-se qual o tipo de procedimento que a Polícia Federal teria instaurado em Patos para realizar as diligências. Informou-se que o Delegado teria optado por instaurar o Registro Especial. Houve na reunião um certo desconforto pela não existência de inquérito, o que nos parece desarrazoado, pois há investigação instaurada no MPF e havia o Registro Especial na DPF-Patos, e seria apenas uma forma de criar dificuldades. Para evitá-las, entregamos cópia de diligências para instauração de inquérito.

Após a reunião (14/06), o DRCOR – Delegado Regional de Combate ao Crime Organizado (quem organiza operações na PF) informou a data de 28 de junho para a deflagração (e-mail do dia 17), porém no dia 22, em novo e-mail, o DRCOR informou que nenhum delegado participaria da operação e que a Polícia apenas disponibilizaria agentes. Isso se deu numa quarta-feira, sendo a quinta dia de expediente reduzido e a sexta dia sem expediente por causa das festividades juninas; tendo sido a operação marcada para terça, dia 28.
Nitidamente, buscou-se dificultar a realização da operação, em nítida falta de lealdade, considerando que já havia o deslocamento do Procurador-Regional, bem como de auditores da CGU e TCE. Oficiado no dia 27 (ontem) o Superintende Substituto alegou como motivo a ausência de inquérito instaurado, como se não bastasse a investigação do MPF, o Registro Especial e, muito mais do que isso, a ordem judicial, os mandados judiciais, além das cópias que foram entregues para instauração de IPL – chegou-se a afirmar que, como a investigação era conduzida pelo MPF, necessário seria decisão judicial de compartilhamento de provas. Já para evitar coisas como tais, tínhamos pedido que a decisão constasse que caberia ao MPF a coordenação das atividades. Mas também alegou, a PF, de maneira difícil de se compreender que, cabendo a coordenação ao MPF, não seriam necessários delegados, nem caberia a PF levantar locais etc, pois bastaria disponibilizar agentes.

Durante o fim de semana nos preparamos para o pior: realizar a operação sem os delegados do dia para a noite. Nesse contexto foram determinantes a atuação do coordenador da 7ª CCR, Mario Bonsaglia, que, no domingo à noite, ligou-me dizendo que daria todo o apoio e pediu que o PR-Chefe, Rodolfo, ajudasse-me na convocação de colegas. Mario ainda contactou o Gab do PGR informando que precisaríamos urgente de designação de colegas para o caso, dispondo-se inclusive para resolver diárias. O PGR Rodrigo resolveu rapidamente a designação no dia de ontem, com a intermediação de Pelella.

Já tendo oficiado o SR que se negou, tendo o apoio da PGR para fazermos apenas com os agentes, buscamos aproveitar a situação para fixamos posição. Fizemos o pedido que segue anexo, para que o TRF declarasse os poderes do MPF para requisitar qualquer atividade a qualquer categoria de policial. A decisão foi acatada (anexa), mas apenas por volta das 21:00 de ontem, estando a operação marcada para hoje. Naquele momento eu já tinha à disposição 2 colegas em João Pessoa, Marcos Queiroga e José Godoy e 3 em Patos, Duciran, Tiago Misael e Sérgio Rodrigo.

Tendo cientificado o SR substituto da decisão apenas as 22:00, realizei reunião prévia com os agentes. Algumas dezenas já estavam Patos aguardando ordens do MPF. Informei sobre a situação e a decisão. A unanimidade deles disse: não precisamos de atravessadores, será mais efetivo nós sob o comando de vocês. Acertou-se a desnecessidade de membros irem nas conduções coercitivas e prisões. O regional e um pr foram a casa do prefeito com auditores e outro na prefeitura com auditores.

Os agentes disseram que seria mais efetiva a operação do que muitas, sendo feita dessa forma. Assim foi feito e, realmente, houve pragmatismo e efetividade. Todas as oitivas foram feitas e as buscas também. O único problema não se deveu aos agentes: os três que seriam presos fugiram na noite anterior (são pai, filho e tio) e familiares informaram que eles disseram que souberam que seriam presos no dia de hoje e fugiram ontem a noite. Interessante o que estamos fazendo para tentar encontrá-los: http://www.mpf.mp.br/pb/sala-de-imprensa/noticias-pb/operacao-desumanidade-mpf-pede-e-trf5-autoriza-publicacao-de-imagens-de-empresarios-foragidos.

Muitos agentes comemoraram o dia de hoje, clamaram para que se tornasse regra, afirmaram que se sentiram relevantes, que houve alegria em trabalhar, que se sentiram em outra realidade etc. Não sei o nível do impacto dessa operação no funcionamento da persecução penal, mas acredito que foi algo relevante, pois houve realmente uma polícia trabalhando para o MP, mesmo que isso tenha surgido a partir de uma tentativa de sabotagem.

No GT Modernização da investigação criminal tenho proposto a regulamentação da condução das investigações da seguinte forma:
(…)
Art. 4º A investigação preliminar poderá ser:
I – Conduzida diretamente e por meios próprios pelo titular da ação penal, podendo criar órgãos específicos para realizar apurações preliminares de ilícitos penais de maior complexidade;
II – Conduzida diretamente pelo titular da ação penal com a participação de outros órgãos apuradores, administrativos ou policiais, que realizarão, os atos requisitados pelo titular da ação penal em favor de sua investigação; e
III – Realizada por órgãos apuradores sob a supervisão/coordenação do titular da ação penal, os quais poderão realizar atos de apuração independentemente de autorização prévia do titular da ação penal.
§ 1º Nos casos do inciso II, os atos de investigação requisitados pelo titular da ação penal serão realizados com prioridade, sendo desnecessária a instauração de procedimento no órgão de auxílio, devendo o resultado do ato de investigação ser encaminhado diretamente ao órgão requisitante.
§ 2º Nos casos do inciso III, o titular da ação penal poderá determinar a realização de ato de investigação por parte do órgão condutor/apurador, o qual dará prioridade de execução a tais determinações; o órgão apurador sempre exporá suas linhas de investigação para consideração do titular da ação penal nos termos da/o diretriz/princípio da aproximação.
(…)

Mesmo que o projeto seja um sonho para o nosso país, hoje senti-me, de algum modo, nos termos do inciso II acima. Já tendo me sentido um pouco nos termos do inciso I na 1ª fase. Espero que com a nossa postura possamos atuar em qualquer uma das formas de condução sem que haja questionamentos e desgastes, para isso o apoio institucional é primordial, por isso reitero agradecimentos ao Mario, ao PGR Rodrigo, PR-Chefe Rodolfo, ao colega Duciran pela confiança, aos coelgas Marcos, Jose Godoy e Marcelo Godoy que comunicou o Mario, os colegas Tiago e Sérgio.

É BOM ESCLARECER
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3 Respostas para Operação Desumanidade: delegados da PF não participam e MPF vê boicote

  1. DECIO NEVES escreveu:

    Caro Jornalista
    Rubens Nóbrega,
    Pela presente nota esclarecemos pontos noticiados na matéria ‘Operação Desumanidade: delegados da PF não participam e MPF vê boicote’*, no seu prestigiado Blog Rubão, hospedado no portal do combativo Jornal da Paraiba:.

    1- Como titular da ação penal o Ministério público não faz solicitações à polícia. Determina. Eis que, em decorrência desta determinação coube ao Superintendente Regional da PF (SR) atender incontinenti a solicitação de Agentes Federais pelo MPF/PB para cumprimento de Mandados Judiciais, atribuição esta executada pela PF em razão de mandamento constitucional que a nomeia polícia judiciária, reservando-lhe exclusividade no exercício da função no âmbito da União.

    2- Importante ressaltar que, na avaliação desta representação de policiais federais, em momento algum houve crise ou mal estar institucional, uma vez que todas as solicitações do Ministério Público Federal na Paraíba foram executadas pelos integrantes da PF, sem qualquer prejuízo ao fiel cumprimento dos Mandados Judiciais.

    3- Em defesa do nome da instituição na qual militamos, queremos rechaçar veementemente a existência de qualquer tipo de ‘sabotagem’ ou algo que se lhe assemelhe. O grave momento que vivencia a nação brasileira exige posturas republicanas e principalmente união na busca de objetivos comuns. Indispensável é ressaltar que nenhum integrante, isoladamente, representa a instituição polícia federal. Daí podermos negar categoricamente sabotagem institucional, como aventado pela matéria.

    *https://rubensnobrega.com.br/2016/06/29/operacao-desumanidade-delegados-da-pf-nao-participam-e-mpf-ve-boicote/

  2. Flávio Moreno escreveu:

    A PF não SABOTA O MPF. Trata-se de conflito entre delegados da PF e a instituição MPF.
    Nós Agentes Federais apoiamos a cooperação entre MPF e PF.
    Sempre quando MPF precisar pode requisitar os Agentes Federais. É assim em todo mundo, Policiais trabalham em cooperação direta com Ministério Público, sem atravessadores. Foi até bom a classe de burocratas nas polícias não participar, ela não existe no mundo, é um impecilho para a modernização da segurança, pois querem concentrar o monopólio do comando das investigações deixando 5,9 milhões delas pendentes em inquéritos. Ou seja, a impunidade reina com esse modelo do Brasil Império, já que em alguns crimes nem 1% são solucionados.

  3. marcio escreveu:

    Quem sabota e teme o MPF são apenas os inúteis delegados.

    Os policiais de verdade (Agentes, escrivães e papiloscopistas) respeitam e querem um Ministério Público presente.