CONFLITO DE GÊNERO, por Frutuoso Chaves

Imagem meramente ilustrativa copiada do Diário Digital

Quase morreu de susto. Desviou os olhos da leitura que lhe prendia, até então, todas as atenções para se deparar com aquilo: aquele molambo de gente, aquele ser aniquilado, aquela alma penada.

Interrompeu o que lia ao ouvir uns passos arrastados. Quem poderia ser? E de que modo lhe invadira a casa, àquela hora? O ponteiro mais curto e o dos minutos assinalavam, um sobre o outro, meia noite no relógio de parede.

Foi então que percebeu o descuido: esquecera de pedir a cópia da chave a quem teve ao lado e, mais do que isso, à mesa e na cama, durante 15 anos. “Que estupidez”, lastimou-se.

Não puseram crias no mundo, fato que, naquele instante, significava um mal a menos. O fim de um amor e o início de uma agonia não devem, afinal de contas, ter partilha, a não ser a dois, entre agentes do mesmo erro.

Sentiu ânsias de vômito diante daquela cena, daquele pranto sem controle, daquele desespero sem consolo. Anteriormente, sentia dó. E adiava o propósito da separação.

Agora, não. Era nojo o que sentia. Percebeu que não seria a força incontrolável de um bem querer o que então impedia o término do relacionamento doentio e sem sentido. Até porque os conflitos sempre aconteceram a dois, com insultos mutuamente ampliados e agravados, dia após dia.

Nunca esteve só nas intermináveis brigas. Assim, não podia compreender aquele choro, aquela resistência de ferro ao afastamento pronto e definitivo.

Foi então que atinou que já esteve, anos atrás, em semelhante posição. Lutava, à sua vez, pelo amor não devidamente correspondido.

Agarrava-se, na ocasião, ao propósito de não trair a promessa feita ao pé do altar: a da união na pobreza e na riqueza, até a separação pela morte.

Trair tamanho compromisso lhe parecia um pecado maior do que o da traição carnal, o cometido em cama alheia. Sim, bem que soube disso. E, é claro, nunca esqueceu do que, por seu turno, também fizera.

Percebeu que a resistência que já foi sua e a daquele farrapo humano que agora lhe violava a casa e o sossego tinham a mesma substância. Resultavam da inadmissão ao fracasso de um projeto de vida, o mais íntimo e pessoal que alguém possa ter.

Seja como for, era chegado o fim. A vizinhança também percebeu isso quando o som de dois tiros varou aquele início de madrugada.

(Mais do que um conto, uma brincadeira endereçada ao amigo Silvio Osias, quando tratávamos, tempo atrás, da linguagem neutra em gênero, coisa pela qual a meninada começava a tomar gosto. Afinal, quem foi para a cadeia, o marido ou a mulher?).

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BRAVO, AMIGO LETO! por Francisco Barreto

Wellington Farias com a netinha Helena

Há um tempo na vida em que o afeto passa a ser o critério dela. De suas verdades em que o tempo, apenas, nos subordina a ser-mos alma e andarilhos de coração aberto em busca de um tempo de renascer e de prelúdios que evocam os sentimento mais nobres de uma dimensão amorosa sobre a vida e a morte. Os mortais caminhantes não sabem muito de seus caminhos, ao andar os fazem. Recorro ao grande poeta andaluz Antonio Machado.

Os amigos que deslizam no meu pensar são fontes que jorram a alegria de viver.

Na condição de ermitão que sou, despojado de qualquer penitencia, usufruo da vida e do seu termino, submergindo a um só tempo na paz, e no resgate das horas de remotas e lindas felicidades passadas que insistem em continuar vivas. Amores lindos e não findos.

E nesse vaguear, uma coisa após a outra no dizer cartesiano, sou um dependente que abraço da minha memória afetiva. A minha memória, se debruça sempre sobre as minhas enevoadas e inacabadas paixões i. E nela transitam igualmente os amigos e camaradas de priscas e recentes eras.

Hoje, e sempre o faço, e me digo presente à sombra de preciosas e fraternais amizades que vicejam como um belo e ardente flamboyant. Flamboyant com o seu agudo vermelho que resplandece sem patinar… no rouge carmim.

Aqui e agora, me preparei para vir ao seu encontro Welington Farias.

Aqui, estou Feliz e venho lhe abraçar e a sua família. Aporta-me prazer a reeditar a imagem de Helena, sua netinha.

À sua demanda, atendo o seu ato de benevolência, estou aqui lhe abraçando, e não declinaria desta sua evocação que me faz palmilhar um profundo prazer. Me concedeste uma extraordinária busca no tempo, e no espaço, e que me e se espraio respirando emoção, olhando, e sentindo as belas sinuosidades da sua terra querida.

Você Leto, me inspira emotivos sentimentos que derivam da sua simplicidade, de sua coragem, de seus predicados e virtualidades, inteligência, sensibilidade, e mais que isto, cultuar o exemplo de sua consciência critica sem lampejo a qualquer submissão.

Simples e digno lhe vejo como uma das flores de meus afetivos jardins.

Os seus dizeres enquanto “espião da alma popular” nos agraciou com a sua difícil e formidável trajetória. Como Neruda e seu cavalo voce, também deslizou nas suas paragens à la “recherche” de sua cristalizada e viva infância.

Está na memória dos humildes de sua terra. O seu passejar, o seu bornal e a sua cavalgada até o Engenho Canadá varando as veredas de Guabiraba, Baixa Verde, Martiniano, Poções, Belo Horizonte, e muito mais. Lembram-me do lamaçal que você entrecortava, e então apiedado você descia do seu dedicado Tarpã, o seu cavalo, que o conduzia com as suas firmes e generosas mãos abraçando seu bornal de utopias e saudades.

Tarpã que você assim o denominou, indo muito longe até a mitologia da Canção dos Nibelungos poema que narra como Siegfried matou um “cavalo furioso” um Tarpã dos Bosques. Homenageou seu cavalinho invocando a ancestralidade dos extintos equinos selvagens Equus ferus)) conhecido como cavalos de sangue quente das estepes euroasiáticas.

O seu companheiro cavalo Pampo com sinuosas e estrias brancas, galopando ofegante não esquecerá de seus gestos de delicadeza onde ele estiver. Trôpego, e agradecido lhe era pelos seus gestos de cumplicidade moldados na sua grandeza.

Não lhe nunca esquecerão os jovens que você os conduzia pelos ensinamentos e mãos no violão clássico onde reinava Villa Lobos, Segóvia, Baden e tantos outros. Aranjuez, certamente lhes chegava pela sua aguçada sensibilidade.

Que belos ensinamentos ! Ediificante surpresa quando me deparei com um dos seus alunos no jardim das Lararanjeiras dedilhando o gigante Villa Lobos e seu Ponteio da Bachiana No 7 em seu Primeiro Movimento. Surpreso fiquei contemplando a sua admirável façanha ao ser o Mestre de tantos jovens pobres de Serraria.

Leto, meus amigos, como um genial e gentil artista esculpiu na alma e no coração dos deserdados jovens: o cultivo da erudição musical de Heitor Villa Lobos. Por suas mãos, levou os humildes e jovens a migrar de seus calejados e ressequidos dedos a dedilharem acordes da nobres e infinitas musicas eruditas e clássicos populares..

Voce foi formidável. Voce ensinou aos pobres meninos irem muito além dos golpes das enxada e foice existia a grandeza das partituras musicais. Os jovens , pobres jovens, deslizaram nas suas utopias, que pela suas generosas mãos e paciência os levou e os libertou da escuridão. Sem ambições, como um legitimo humilde franciscano conseguiu o quase impossível iluminou a sua desditada terra com grandeza da cultura, da arte e do saber.

Leto é senhor de um estoicismo luminar. Lembro a grandeza do titã Prometheus que desafiou Zeus e que concedeu aos seres humanos o poder de pensar e raciocinar e lhes transmitiu os mais variados ofícios e aptidões. As chamas do Olimpo deu a luz aos homens.

Belo exemplo que chega até nós varando a penumbra da simplicidade e da sua resoluta incognoscibilidade.

Quantos de nós mortais e imortais conhecemos os meandros da grandeza e da generosidade do homenageado ! Quantos desta memorável Academia pela força dos gestos se dedicou a ter alguma proximidade com jovens e crianças lhes abrindo o olhar para a cultura, as artes, e o saber humano ?

Wellington Farias faz parte das incontáveis legiões de entes humanos que em todas épocas foram dedicados aos gestos mais sublimes da condição e da dignidade humana.

Welington não foi apenas um predecessor musicista. Se debruçou durante anos um leitor empedernido de todos os gêneros de literatura e, mais tornou-se um jornalista com refinado e preciso estilo critico ao se debruçar sobre pautas sociais, políticas e culturais na imprensa escrita, radiofônica e mais recentemente no universo virtual.

Foi e sempre será um jornalista profissional louvado pelos seus contemporâneos que sempre lhe destinaram distinguidas reverências pela simplicidade e a coragem com que enfrentou todos os embates de modo destemido.

Sempre no front das missões jornalísticas nunca hesitou fazer de peito aberto entrevistas com distinguidos ícones da política brasileira e local, do mundo cultural e artístico.

Com fervor e espírito arrebatado, encarou seu papel na imprensa derramando as suas emoções e opiniões com a verdade e a coragem de um pequeno grande homem.

Com a sua arguta e buliçosa inteligência, no rastro de sua consciência de seus limites culturais e intelectuais de um menino de interior, sempre se submeteu a exitosas conquistas, e por consequência, do alto de sua humildade e destemor é respeitado por seu desempenho como homem de imprensa.

Seus limites interioranos todos foram superados quando demonstrou que a prática é o critério da verdade. Isto lhe credita enorme respeito. Welington foi enormemente penalizado pela geografia de sua origem, mas seguiu ao pé da letra o ensinamento de Goethe : “Se limitar para Crescer.”

Soube se limitar para crescer. Ademais, sempre teve postura ética e moral, não deixando se seduzir pelas embriagantes e ilusórias luzes e benesses do poder. Comportamento raro no meio profissional em que milita.

Lembro-me de Tristão de Athaíde o grande mestre quando um disse nos escreveu “ é pavoroso para um homem da imprensa abordar pautas que denigrem a imagem da dignidade e da condição humano. Sofremos todos !”

Pobre e obscura Serraria, que nunca lhe destinou a menor das honrarias ao seu ilustre e (di)Leto filho. Parafraseando Bertolt Brecht, diria: “Há homens que lutam toda a vida e estes são imprescindíveis”.

Leto é um desses. Pobres e medíocres são os serrarienses que nunca o distinguiram. Logo ele que sempre teve uma desmedida paixão pela sua imerecida terra.

Hoje, vivo e audaz, encara com rara coragem enfrenta o duro desafio que a vida lhe impõe. Ao lado de sua preciosa família e de seus amigos, com os pés e as mãos numa luta sem tréguas se mantem incólume mentalmente sem renunciar a sua já e amplamente reconhecida coragem e vontade férrea de louvar a vida. Ele é exemplo formidável de ser humano que encanta a todos que o estimam e o conhecem.

E, se um dia sua queridinha neta Helena, desejar escrever ou falar do seu formidável Avô o diga que ele teve todos os seus dias, inicio e termino, dedicados à sua família, à sua terra,à sua conduta ética e moral, e que nós seus amigos sempre o tivemos no lado do peito esquerdo.

Bravo, amigo Leto!

(Saudação ao jornalista Wellington Farias por ocasião de homenagem que lhe foi prestada pela Confraria Sol das Letras na Academia Paraibana de Letras, em 28 de setembro de 2023)

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EU, PARCELA E O ECLIPSE, por Frutuoso Chaves

Imagem meramente ilustrativa copiada de colegioweb.com.br

Um danado o barbeiro Parcela. Sem formação acadêmica, aprendeu por si próprio tudo aquilo com que impressionava aquele povo. Tinha, porém, um defeito: o da absurda intolerância aos broncos. Esfregava a estupidez na cara dos estúpidos sem dó nem piedade.

– Para que diabo estudar trigonometria? O que vou fazer com isso? – perguntou Zezinho, dono da nota vermelha que então revia no boletim escolar enquanto aguardava o corte de cabelo num sábado de fila grande. “Vai deixar de ser burro”, respondeu Parcela para o riso da freguesia. E, de pronto, defendeu o aprendizado da matéria com a pergunta ao jovem cliente: “Se a questão for sobre a altura da torre da Igreja você vai pedir ao professor andaime e trena?”.

Ele sempre recorria a problemas diários, a situações corriqueiras, para explicação de tudo. E, nessas ocasiões, atento à reação da plateia, beirava o orgasmo. Como gostava de se exibir… Pediu, então, ao rapazote:

“Tome essa torre como lado de um triângulo. O segundo lado será o comprimento da sombra dela no chão. Verifique o ângulo de inclinação do sol. Se ele nascer às 5 da manhã, estará a 45 graus por volta das 8 e meia. Faça a coisa nesse horário. Você terá um triângulo retângulo e os valores para o cálculo trigonométrico. Você vai querer a tangente, ou seja, a razão entre o lado oposto ao ângulo de 45 graus, que é a nossa torre, e o lado adjacente a este mesmo ângulo, o da sombra cujo comprimento você já terá medido. Tangente de 45 vale 1. Pronto, estará resolvido o problema”. Juro como houve aplausos.

Olival, um terraplanista juramentado, cortou relações com Parcela, por quem também foi chamado de burro. Quantas inimizades nosso barbeiro não faria nos dias de hoje? “Sabe quem foi Eratóstenes?”, perguntou ele a um Olival que, até então, nunca havia ligado o nome à pessoa.

E lá veio a explicação. Eratóstenes, nascido no ano de 276 antes de Cristo, mediu a circunferência da terra com margem espantosa de acerto. Esse camarada fez o seguinte: enfiou uma estaca, verticalmente, em Cirene, sua cidade, em 21 de junho, Solstício de Verão no Hemisfério Norte, com o sol a pino, mas sem produzir sombras. O mesmo não ocorria, porém, a 800 quilômetros, em Alexandria, na mesma ocasião e com estaca semelhante em verticalidade e tamanho. Ali, em relação à primeira, a segunda estaca tinha uma inclinação de sete graus. Eratóstenes intuiu que a Terra era redonda e calculou a profundidade em que ambas as estacas se tocariam ao cabo de duas retas até o centro do planeta. Eureka! Obteve o raio terrestre, valor imprescindível ao cálculo da circunferência planetária.

A encrenca começou quando Olival, duvidando dessa história, perguntou por qual telefone Eratóstenes informou-se da inclinação da estaca enfiada, concomitantemente, nos solos de Cirene e Alexandria. “Pelo da tua mãe”, foi a resposta curta e grossa. Parcela, quando contrariado, sempre botava a mãe dos outros no meio da conversa. No caso em pauta, perdeu o amigo e o bigode longo, belo, encorpado, por este doravante entregue aos cuidados de Manoelzinho, o barbeiro concorrente.

A cada eclipse eu me lembro de Parcela. Era um dos seus temas preferidos. Caso ainda vivesse, a ele eu não contaria que, decepcionado, nada vi além de um Sol ofuscante na tarde do sábado. Posso ser burro, mas não sou doido.

Eu quase me esquecia. Eratóstenes deu à circunferência terrestre o valor de 40 mil quilômetros. A ciência moderna corrige isso para 40.075. Errinho insignificante, não é não?

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ASSEDIADO, por Frutuoso Chaves

Imagem meramente ilustrativa copiada do YouTube

Marisa está com saudade de mim. Disse-me isso com todas as letras. Fosse eu comentar com meus insignificantes botões as mensagens insistentes que recebo duas vezes por semana, no mínimo, poderia ouvir deles algo indevido. “Quem diria, não é? Setentão e abalando corações” – coisa desse tipo.

E eis que, agora mesmo, me bate a dúvida: falo ou não falo? Minha indecisão decorre do temor de não ser levado a sério, de ser tomado por mentiroso. “Meu filho, nunca perca o senso do ridículo. Seja tudo menos pabuloso”, ouvi isso, certa vez, de Seu Juca, meu pai, no dia em que pegou o primogênito a contar vantagem numa pescaria de curimatãs. Se, em matéria de peixe, fui por ele severamente repreendido, imagine se o assunto for a perseguição da Marisa.

Explica-se, então, o medo da censura pelo qual sou tomado até os dias de hoje. O carão do velho no menino que um dia eu fui me marcou profundamente. Até por que foi muito bem merecido.

Desde então, não me envergonho ao confessar que nunca fui bom de pescaria. Contudo, não é menos verdade que já fui bafejado pela sorte grande. Quer ver? Deixemos, então, a área da pesca e vamos para a dos transportes. “É muita areia para o seu caminhãozinho”, os amigos assim me advertiam quando eu comecei a perseguir dona Miriam. Agora, adivinhem com quem estou casado há 45 anos e quem pariu meus três filhos.

Tanto quanto meu pai eu também, felizmente, costumava ouvir meu avô Frutuoso, de quem herdei o nome. “Quem não arrisca não petisca”, aconselhava ele a toda hora. Grato, meu velho.

Falo, ou não falo? Sei lá… Eu não quero ser comparado a Edinho, o filho do agente fiscal. Moço já feito, foi para o carnaval no Recife e voltou de olho roxo. Aos meninos da minha época ele contou sobre a briga em que se meteu com um grupo de turistas americanos durante o baile de salão, quando o sol já iluminava a Quarta-Feira de Cinzas. Bateu nuns três, mas no quarto se deu mal. Era Roy Rogers.

Tenho, porém, da minha parte, a consciência tranquila. As pabulagens que eu contava morreram, logo cedo, no tempo dos curimatãs. Então, vou falar, sim. Quem não quiser acreditar não acredite. O problema não é meu.

Luiza também anda a me ligar. Não chega a dizer que está com saudade, mas pede, quase todo santo dia, que eu repita as visitas que já lhe fiz. Tem mais: acabo de receber um telefonema da moça da Vila Romana. “Seu Frutuoso, não veio mais por aqui? Temos ofertas excelentes”.

Eu bem desconfiei quando, tempo atrás, adquiri com a Marisa uma batedeira de massa pesada, dessas que servem ao preparo de pizza e pão. Paguei à vista, porém, mesmo assim, me exigiram CPF, endereço e e-mail. Dê o tipo de informação e perca o sossego. Marisa e Luiza, para ficarmos nessas duas, põem um batalhão no seu encalço. Com Luiza eu não lembro de encontro nenhum. Desconfio de que alguém que eu há muito conheço de cama e mesa pegou meu cartão e correu para lá.

O fato, meu companheiro, é que nunca se deve subestimar as mulheres. De repente, elas podem ser cúmplices na realização de coisas impensáveis, desde que isso ou aquilo lhes seja de mútuo interesse. Chegam ao ponto de permitir mensagens quase diárias aos maridos. “Saudade de você, Frutuoso”, foram os termos exatos da Marisa. E haja a outra, a Luiza, a me cobrar visitas. Não tenho a menor dúvida: ambas assim o fazem com a daqui a atiçá-las.

Todavia, não deixo de admirar a posição a que chegou a dupla que tão insistentemente me aborda. A audácia, o senso empreendedor, o pulso firme na condução dos negócios há décadas fazem delas, em escala nacional, duas grandes expressões do mercado varejista.

Não posso dizer o mesmo de quem, para a satisfação do mais famoso serviço de televendas, solicitou, em agosto passado, via e-mail, que eu traçasse o perfil de Seu Juca, a fim de me orientar sobre a escolha do presente que ele gostaria de receber no Dia dos Pais que já então se aproximava.

Fosse tal solicitação feita de viva voz, eu pediria ao moço um tiquinho de paciência. Para os que, como eu, passaram dos 70, a consulta a cada pai poderá ser feita presencialmente. Basta esperar um pouco.

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QUERIDO RUBENS, por Frutuoso Chaves

Tio Sam, ícone norte-americano

Escrevo estas mal traçadas linhas a fim de contar, aflito, que bloqueei Hélder Moura no Messenger, no Zap, no Instagram e no Facebook.

Ele mesmo, nosso Helder, o jornalista talentoso, o escritor admirável, o amigo de todas as horas, o camarada inscrito nas hostes dos imortais, porquanto membro festejado da Academia Paraibana de Letras.

Hélder é daqueles que a gente aponta, sem esconder a vaidade, quando citado numa roda de conversa: “É meu amigo bem chegado”. Exatamente como faço em relação a você, meu caro Rubens, ou a Chico César, a quem dei o primeiro emprego em jornal e me abandonou, afortunadamente, em busca dos palcos do mundo. Se avexem não. É coisa de macaca de auditório.

Bloqueei Hélder, mas tudo por conta do Agent Mark. Sabe não? É o cara de meia idade, bonito, engravatado, sorridente e bem penteado que fala em nome do DHHS, o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos.

Pois não é que recebi recado no Messenger com a cara e o número de um Hélder felicíssimo pelo prêmio de 300 mil dólares a si conferido por um tio em comum, o velho Sam, criatura das mais cristãs, das mais solícitas e dadivosas!

Dólares, caro colega, para um Hélder que não precisa dessa ajuda concedida, via Agent Mark, a título de amparo aos velhinhos do planeta, aos carentes de juventude, saúde e dinheiro.

Segundo a mensagem, eu tenho meu nome e tenho foto na lista dos assim premiados pelo DHHS. Se Helder, quem nem idoso é, abiscoita US$ 300 mil, imagina, então, o quanto caberia a mim que já tenho saudade dos 70 redondos e há muito me recinto da falta de saúde e grana.

Ligo para Hélder, sem haver atendido ao pedido para abrir o link da premiação que me fora remetido, dele ouvindo: “Você é um dos cinquenta que já me telefonaram com esse aviso. Me raquearam o Face, o Instagram, o Zap, o diabo a quatro”.

Pobre Hélder, tive que bloqueá-lo, pesaroso, até que ele recupere essas contas. Espalho o fato porque ele assim também o faz, a título de alerta aos amigos.

Tempos bicudos estes nos quais vivemos, meu amigo. Não sei se acontece também a você, mas eu estou cansado de excluir pedidos de adição ao Facebook formulados por deusas louras, várias delas envergando, com galhardia, a farda da Marinha de Guerra dos Estados Unidos.

Semana passada, deletei um coronel daquelas bandas. Deste não me apiedo, mas tenho pena de Dayse, Kelly, Mary e Suzan. Que olhos, que bocas… Perdão, queridas. Mas a desconfiança crônica, orgânica mesmo, me leva a rejeitá-las.

E, aqui para nós, preciso confessar. Tenho, há muito tempo, uma certa repulsa a esses guerreiros e guerreiras. Que as moças disso não saibam, mas, nos meus idos de faroeste, das cadeiras do Plaza e do Cine Rex, eu já torcia pelos índios nas brigas com a Cavalaria.

Posteriormente, me veio a leitura daquela frase lapidar proferida pelo velho Porfirio Diaz, muito depois de haver perdido o Texas: “Pobre México. Tão longe de Deus e tão próximo dos Estados Unidos”.

Dali, mesmo, eu somente gosto da gente de paz, dos gênios da literatura, da música, das artes cênicas, enfim, das coisas que edificam, tocam a alma, envolvem, comovem e, por conta disso, fazem bem à humanidade. E, com minha gratidão pela escuta e paciência, fico por aqui.

Abraço, do Frutuoso

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Historiador analisa novo ciclo político na Paraíba

Poderia ser ‘De Ricardo Coutinho a João Azevedo’, mas é ‘História de um novo ciclo político na Paraíba (2009-2018)’ o título do novo livro do historiador e escritor Flávio Lúcio Vieira, que traz “a trajetória dos protagonistas envolvidos nas disputas eleitorais e na construção das alianças partidárias” naquele período.

Disponível na Amazon, maior empresa do mundo do mercado online de livros, a história desse novo ciclo de lutas pelo poder é contada por um dos mais atuantes analistas da cena política paraibana nos últimos 15 anos. Professor doutor e pesquisador de História da UFPB, Flávio Lúcio destaca-se pela opinião qualificada que expôs em jornais locais e artigos que publica no Pensamento Múltiplo, seu blog na Internet.

Flávio Lúcio Vieira

A sinopse do livro ressalta que a obra registra do “vai-e-vem das alianças” aos embates pessoais e decisões “dos principais sujeitos políticos envolvidos nessas disputas”. Remete aos conflitos que levaram ao rompimento entre o atual governador e seu antecessor imediato, com o natural envolvimento dos respectivos entornos e coadjuvantes nos processos de eleição e reeleição de ambos, de 2010 a 2018.

Segundo o jornalista Rubens Nóbrega, que faz a apresentação de ‘História de um novo ciclo político na Paraíba (2009-2018)’, “quem lê Flávio Lúcio, gostando ou não do que ele escreve, admira”. Considera, para tanto, que do autor não há como desconhecer a “extrema percuciência de suas avaliações e projeções dos fatos, momentos, pressupostos e consequências do ato político na eterna cena aberta (e muitas vezes patética) da política paraibana”.

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PRESENTE E FUTURO DA TRANSPOSIÇÃO, por Francisco Jácome Sarmento

Infográfico da palestra do Professor Sarmento no Seminário do Fórum Celso Furtado

O Fórum Celso Furtado da Paraíba promoveu semana passada, no Centro Cultural Ariano Suassuna, em João Pessoa, o seminário intitulado “O Futuro da Transposição das Águas do Rio São Francisco. A água chegou. E agora? Como alcançar o esperado desenvolvimento sustentável? ”.

Foram convidados instituições da esfera federal e estadual, da Paraíba, do Rio Grande do Norte, de Pernambuco e do Ceará, estados beneficiados pelo projeto da Transposição de águas do Velho Chico. Secretários de Estado, diretores de órgãos públicos, técnicos ligados ao setor de Recursos Hídricos discutiram tanto o estágio atual em que se encontra a preparação para receber e bem utilizar as águas a serem transpostas como as propostas de uso e alocação aos diversos usuários públicos e privados com interesse na segurança hídrica propiciada pelo projeto.

O projeto da Transposição consiste em dois canais de captação de águas sanfranciscanas que totalizam uma capacidade de transporte de 127 m³/s, vazão que, para se ter uma ideia, se alocada para o abastecimento de pessoas com um sistema hidráulico eficiente, seria suficiente para abastecer 13 vezes toda a população atual da Paraíba.

Sarmento: ainda “não caiu a ficha” da população

O porte físico dessas obras foi dimensionado a partir da concepção de cenários de desenvolvimento futuro dos quatro estados receptores das águas. À época, foram elaborados tanto cenários tendenciais quanto alternativos. Assim, para cada setor usuário de águas, como o saneamento, a indústria, a agricultura irrigada, a pecuária, a aquicultura e o turismo, foram estudadas as taxas evolutivas históricas (cenários tendenciais) bem como foram prospectados quais os impactos que ações governamentais positivas poderiam ter sobre os cenários tendenciais, incrementando suas taxas de crescimento, gerando assim cenários mais otimistas, ditos alternativos.

Uma vez determinadas as vazões necessárias ao atendimento dos cenários tendenciais e alternativos, partiu-se então para se avaliar a segurança hídrica de cada estado, nas situações de dispor ou não do projeto de Transposição. A conclusão inequívoca foi a de que, mesmo no cenário tendencial mais pessimista (ou seja, no qual ocorreria estagnação do desenvolvimento regional), a situação de não se dispor do projeto implantado produziria um verdadeiro apagão
hídrico na região.

Essa constatação técnica lastreou a vontade política do Presidente Lula, responsável por tirar o projeto do papel, em priorizar essa interligação hidráulica entre o rio da Integração Nacional e o Nordeste Setentrional. Atualmente, o BNDES formata uma Parceria Público Privado (PPP) com vistas a colocar em disputa licitatória pela iniciativa privada a gestão do sistema de Transposição.

O objetivo é deixar a cargo de uma empresa privada a venda da água bruta aos estados e a consumidores privados (e.g. grandes irrigantes, indústrias etc.), tendo-se, no primeiro caso, a garantia do pagamento com parte do FPE (Fundo de Participação do Estado) consignada para esse fim, como forma de atrair concorrentes para o certame. A segunda mesa redonda do evento discutiu o tema, encabeçado pela representante do BNDES.

Algumas conclusões importantes ganharam ênfase ao final do seminário. Em primeiro lugar, a realidade comum aos quatro estados beneficiados pelo projeto é a de que, em nenhum deles, se deu, ao longo da última década, um planejamento voltado a articular ações multissetoriais para criar a ambiência socioeconômica necessária ao aproveitamento sistemático das águas transpostas. Depreende-se daí que, pelo menos a curto prazo, não se cumpre o papel instrumental da Transposição, a saber, uma solução de engenharia fomentadora do desenvolvimento regional no que esse depende de segurança hídrica.

Outro ponto merecedor de destaque é recorrente no serviço público brasileiro. Falo em relação à substituição das equipes técnicas, banalizada quando das mudanças de governo, com prejuízos à eficiência da máquina estatal, ineficiência essa tanto mais onerosa para o contribuinte, quanto mais complexa for a ação governamental demandada. No caso da água da Transposição, para a maioria da população, certamente, ainda “não caiu a ficha”.

A conta de dispor e de usar água bombeada do Velho Chico, expressa na forma de uma tarifa de demanda (paga de qualquer maneira, usando-se ou não a água “importada”) e de outra, referente ao consumo (proporcional ao volume solicitado pelos estados a cada ano), respectivamente, será paga pelo contribuinte, ou seja, pelos usuários do sistema de saneamento (Cagepa/PB, Cagece/CE, Caern/RN, Compesa/PE e, em alguns casos, pelos usuários dos serviços prestados pelas companhias municipais).

Se os responsáveis pela gestão dos recursos hídricos locais e “importados”, leia-se, os estados beneficiados pelo projeto, ainda sequer compreenderam a magnitude da economia que pode advir da operacionalização do conceito de Sinergia Hídrica, o preço desse desconhecimento sobrará, como sempre, para a população.

A Sinergia Hídrica, principal pilastra da concepção da Transposição, parte do conhecimento de que o volume anual de água que, em média, chega a uma barragem pelo rio onde ela se encontra se reparte em três parcelas: uma que é retirada para atendimento das demandas; outra que, nos anos de cheia, termina por verter, sempre que essa cheia é maior do que a capacidade máxima de armazenamento da barragem, e, por fim, a parcela que as elevadas taxas de evaporação subtraem continuamente dos espelhos de água nordestinos.

É intuitivo perceber que, se houver uma maneira de diminuir a parcela de água que evapora, assim como a parcela de água que verte nos anos de cheia, sobrará mais água para atender mais consumidores. Com a descoberta e o aperfeiçoamento do conceito de Sinergia Hídrica, tornou‑se possível calcular, para cada reservatório de grande porte receptor das águas da Transposição, qual seria a vazão ideal para nele ser lançada, i.e., a vazão que minimizaria as perdas de água por evaporação e por vertimento.

Concluída agora a obra, urge por em prática, nas esferas governamentais federal e estadual, o conceito de Sinergia Hídrica. Com isso, a Transposição passa a ser muito mais do que um mero reforço de infraestrutura para aumento de oferta de água, o que era um flanco muito atacado pelas forças contrárias ao projeto; poderia ser uma obra indutora da boa gestão hídrica nos estados do Nordeste Setentrional, com efetivo poder transformador da cultura estabelecida
em torno do seu valor.

Mais ainda, poderia possibilitar a efetivação, em macroescala (estados), do sentido do texto legal da Política Nacional de Recursos Hídricos em fazer com que os usuários de água no país dessem o valor devido a esse insumo precioso à vida e à produção que aquela viabiliza.

  • Francisco Jácome Sarmento é Professor Doutor da UFPB em Engenharia Civil e Ambiental, foi consultor e membro da equipe de Coordenação Técnica do Projeto de Integração do São Francisco junto ao Ministério de Integração Nacional de 2003 a 2009, período em que também chefiou a Assessoria Técnica da Vice-Presidência da República designada para viabilizar as obras da transposição das águas do Velho Chico para o Nordeste Setentrional
  • Artigo publicado simultaneamente com o Diário de Vanguarda
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O SABOR DO PERIGO, por Frutuoso Chaves

Churrasco grego (Imagem copiada do Reclame Aqui)

Para começo de conversa, um conselho de amigo. Não tente reproduzir em casa o tempero das ruas. Creia-me, não conseguirá. Digo mais: você nem chegará ao pão na chapa de boteco, aquele das seis da manhã com café pingado, se o preparo acontecer no santo recesso do lar.

Desista. Certos condimentos somente alcançam a plenitude quando feitos de mistérios e riscos, ingredientes geralmente faltosos às panelas domésticas em cozinhas assépticas como salas cirúrgicas.

Um velho amigo definiu à perfeição o sarapatel que lhe ia à boca numa barraca de higiene duvidosa, antes do nascer do sol: “Tem o sabor da emoção”. Com as licenças da juventude, ele havia saído morto de fome daquilo que a minha e a avó de vocês, entre a esconjuração e o sinal da cruz, tratariam por casa de tolerância.

Por falar nisso, aquele sobrado da rua de comércio então vibrante à luz solar, mas um templo noturno da boemia, ganhou seu respeito quando a proprietária insatisfeita com o calote institucionalizado afixou o cartaz na parede: “Proibido o ingresso de cachorro, menor de idade, jornalista e político”.

Como tantas ruas antigas, aqui e lá fora, aquela, de fato, tinha duas caras e duas almas, umas para o sol e outras para a lua. Os de passadas gerações, provadores de seus quitutes, bem o sabem.

Agora, responda, antes que percamos o rumo da conversa: o frango assado em casa tem o mesmo sabor do galeto das esquinas? Duvi-dê-odó, com o perdão dessa outra expressão das avós. E o cachorro-quente doméstico? E o pernil caseiro compara-se ao fatiado num pão francês chapado e oferecido pela garçonete depois da meia-noite e de uns cinco chopes?

Pois é, minhas e meus camaradas. Faltam aos pratos domésticos o molho e o segredo dos bares, lanchonetes e tendas do comércio ambulante. Coxinhas, pastéis, bolinhos de bacalhau, casquinhas de caranguejo, batata frita, ovos cozidos (até eles) têm o santuário das ruas. Sei de muita gente para a qual nem a hotelaria de cinco estrelas consegue reproduzir a contento os pratos e aperitivos típicos das barracas e botequins de pequena grandeza com chapa e fogão ocultos, misteriosos, mal percebidos.

A convocação para reforçar a equipe da Sucursal d’O Globo, no Recife, antes e depois da visita de João Paulo II, obrigou-me a viver de restaurante por duas semanas. Ao cabo da primeira eu já não mais suportava o que me vinha à mesa, apesar do bom e amplo serviço a la carte do então conceituado Pedro I. Fui salvo pelo colega Inaldo Sampaio que me apresentou ao Chambaril de Dona Maria, uma palhoça em terreno baldio próximo da Faculdade de Direito aonde se chegava por um buraco enorme aberto no muro. A superlotação do lugar bem falava daquela mão de fada.

Tempo depois, ao visitar duas antigas vizinhas da minha mãe, moças viajadas com experiências de Ásia e Europa, fui surpreendido com suas boas referências àquele prato. Desculpadas a pose e a afetação que não conseguiam conter quando no trato dessas viagens, espantaram-me ao dar ao ossobuco pernambucano o tempero de um restaurante da Lombardia. Pronto, foi o que me faltava para perceber que as palhoças também podem ter o apego dos esnobes.

Ah, o caldo de camarão da recifense Rua do Riachuelo… Não mais do que um balcãozinho de fórmica embaixo do lance de escada no térreo de um sobrado aos pedaços. No caixa, a mulher com sete meses de barriga. No fogão de uma só boca, às voltas com o caldeirão, o marido recém-demitido em razão do fechamento do Banco do Estado de Pernambuco por obra e graça de Miguel Arraes.

A raiva e o propósito do tiro no governador já haviam sido substituídos pela satisfação daquele moço com a fila enorme na calçada. Funcionava assim: você entrava, comprava dela uma ficha, buscava a cachaça contida em um filtro de barro tendo à mão um copinho de plástico feito para café e, finalmente, o caldo servido por ele em semelhante copo, divinamente saboroso. De quebra, a azeitona num palito e, graciosamente, também, uma fatia de limão. O toque ácido seria o símbolo da superação e da resistência. Afinal, o casal fizera uma limonada do fruto que colhera da sorte madrasta.

Acho que assim tem sido com muitos dos que hoje vivem de pães assados, sarapatéis, caldinhos e petiscos diversos. A vida severina que deles subtraiu o estudo, o bom emprego e a boa sina não impediu que de melhor forma se houvessem com seus fogões e chapas, muitas delas lavadas não se sabe com quais cuidados nem com que frequência. Os sabores incomparáveis que nos oferecem talvez advenham disso: do suor, do esforço e do propósito de servir, no mais das vezes, aos perdidos nas noites.

Seria uma irresponsabilidade afirmar que todos não primam pela limpeza nem pelo bom acondicionamento daquilo fritam, assam ou aferventam. Ninguém, em seu bom senso, é capaz de tamanho disparate. Há deles muito bem asseados, do mesmo modo como há restaurante bem estabelecido na mira ocasional da Vigilância Sanitária. Quem disso não sabe?

Mas o jovem que um dia eu fui ainda teima, eventualmente, em dar ouvidos à avaliação de um velho companheiro de batente para quem a melhor feijoada seria aquela com ambulância à porta. Eventualmente, repito, pois de uns tempos para cá me tem falado mais alto o septuagenário que agora foge das intoxicações como o diabo da cruz. Ainda bem.

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