RECORDANDO BANANEIRAS (I), por Aderson Machado

Praça do pavilhão de aulas do Colégio Agrícola Vidal de Negreiros (Imagem: YouTube)

Corria o ano de 1966 quando, ao ser aprovado no exame de admissão ao ginásio, aos treze anos de idade, deixava eu, com lágrimas nos olhos, o doce convívio do lar para ir estudar no então Colégio Agrícola Vidal de Negreiros, mais conhecido como a Escola de Bananeiras, situado na zona rural do município de Bananeiras/PB, distante um quilômetro da sede do município.

Confesso que não foi nada fácil a minha adaptação a essa nova realidade, na medida em que acabara de concluir o curso primário numa escola da zona rural. Além do mais, eu era bastante tímido e me sentia um tanto quanto imaturo, ou melhor, matuto mesmo, o que dificultou deveras o meu relacionamento inicial com os novos colegas, oriundos dos diversos rincões do nosso país.

Para ilustrar essa minha timidez, vale relatar aqui uma cena que aconteceu comigo logo no primeiro dia em que cheguei no Colégio. O meu irmão Mendonça, que já era veterano na Escola, me apresentava a um colega dele. Este se dirigiu a mim, como de praxe, e disse: “Prazer em conhecê-lo”. E eu: “Muito obrigado!”. Este fora apenas um dos deslizes cometidos por mim, até que me tornasse uma pessoa “civilizada”.

A propósito desse meu irmão, gostaria de acrescentar um outro fato até certo ponto hilariante, porque inusitado. Como o nome dele é José Mendonça da Costa, e o meu, Aderson Machado de Oliveira, tornava-se difícil convencer os nossos colegas bem como os demais funcionários e professores, que éramos mesmo filhos do mesmo pai e da mesma mãe!

Na verdade, os que duvidavam – e com muita razão – do nosso parentesco, não tinham culpa pelo fato de meu pai – de saudosa memória – não ter tido o devido cuidado, na hora de nos registrar, de usar os mesmos sobrenomes! E. para complicar um pouco a coisa, a nossa aparência física não nos ajudava, porquanto eu era magro e de estatura baixa e o meu irmão era um pouco forte e alto. Daí o fato de os nossos colegas nos chamarem de o gordo e o magro…

A qualidade de ensino no Colégio Agrícola Vidal de Negreiros – CAVN – era bastante eficiente. Com efeito, quem não fosse aplicado e esforçado o suficiente não passaria de ano. E vale lembrar que o regulamento do Colégio era muito rigoroso. Assim, quem fosse reprovado duas vezes seguidas perderia a sua vaga para outro aluno. Ademais, o regime disciplinar não era menos rigoroso, o que fazia com que andássemos na “linha” para não sofrer algum tipo de punição.

A maioria dos alunos da Escola de Bananeiras estudava em regime de internato. Era o meu caso. Alunos de vários estados nordestinos, e até do Norte do país, formavam o corpo discente do Colégio de Bananeiras, isso em função da eficiência do ensino, conforme já mencionei.

Como acontece em todos os colégios que têm regime de internato, os alunos novatos eram vítimas das mais diversas gozações por parte dos veteranos, que, de imediato, apressavam=se em colocar em cada um de nós um apelido de acordo com as características físicas.

Infelizmente, não pude escapar desse incômodo, e, por conseguinte, tive que aturar, durante os cinco anos em que lá estudei, um epíteto que não soava nada bem aos meus ouvidos: “Vampiro!”.

A propósito, gostaria de citar alguns apelidos dos meus colegas de turma, simplesmente por achá-los um tanto quanto engraçados. Por exemplo, havia o Catemba (in memoriam), Caranguejo, Zig-Zig, Catabio, Cabeção e outros que tais. Escusado dizer que eu e esses meus colegas aceitavam, na maioria vezes de bom grado, ser chamados por esses nomes esquisitos.

Quanto a mim, eu era, vez por outra, meio destemperado. Por isso, certa feita, ao ser insultado por um aluno veterano que atendia pela alcunha de Galo Assado, em represália atirei-lhe uma pedra que o atingiu bem no meio de sua testa. Incontinenti, o sangue escorreu de sua face em profusão.

Confesso que fiquei apavorado com aquele episódio, e se não fora a intervenção imediata de meu irmão Mendonça, com certeza eu teria levado uma sonora sova, tendo em vista que o meu desafeto era mais “velho” e maior do que eu.

Além do mais, com a pronta intervenção do mano, fui poupado de uma suspensão de pelo menos quinze dias, posto que o regime disciplinar do Colégio era muito rigoroso. Mesmo assim, não escapei de levar uma severa advertência por parte do Inspetor de alunos, e então, a partir daí, eu passara a figurar na lista dos ‘réus primários’.

Como consequência, mais um ato de indisciplina e eu poderia sofrer uma punição mais rigorosa. De qualquer maneira, esse ato impensado foi uma lição de vida para mim, na medida em que procurei, a partir daí, ser mais comedido nas minhas atitudes, e me esforçar o máximo que pudesse para não me importar (nem me importunar) no caso de alguém me apelidar ou, por outra, fazer cruzes para mim, que era pior, de certa forma, do que me chamar pelo apelido!

Conforme já foi dito, o regime disciplinar do Colégio Agrícola de Bananeiras era deveras rigoroso, e, em função desse fato, não raro os alunos eram punidos com advertências (o meu caso), suspensão, e até expulsão!

Essa rigorosidade estendia=se, também, às comemorações do Dia da Independência, Sete de Setembro, que eram levadas muito a sério pelo Colégio, que tinha uma Banda Marcial muito afinada e seus alunos desfilavam de maneira impecável, qual Colégio Militar. Tudo isso era fruto de muito treinamento, que começava, pelo menos, faltando um mês para o início do desfile.

A propósito das comemorações do Dia da Independência, era feita uma triagem dos alunos, no sentido de excluir aqueles que poderiam comprometer a impecabilidade do desfile. Eu próprio, certa feita, fui sacado de um determinado desfile que o Colégio fez na capital paraibana, exatamente por ter cometido várias trapalhadas por ocasião dos ensaios.

Só para dar um exemplo, basta dizer que quando o instrutor ordenava: “Direita, Volver!”, eu, displicentemente, me virava para a esquerda! Aí fui considerado um “joio” no meio do “trigo”, e, portanto, dispensado de fazer parte do desfile cívico.

No Colégio de Bananeiras, eu comi o pão-que-o-diabo-amassou. Veja só: além da incompatibilidade que existia entre mim e certos colegas, não raras vezes tivemos problemas sérios com relação à alimentação. Com efeito, chegamos até comer feijão contaminado de gorgulho!

Em que pese o educandário dispor de verba de custeio e nos proporcionar fardamento, calçados, roupa engomada e tudo mais, com o passar dos anos essas regalias foram gradativamente desaparecendo, isso em função de insuficiência de verbas. A partir de um determinado tempo, o Colégio só nos oferecia a dormida, a alimentação e o ensino, que, por sinal, nunca perdera a sua qualidade, apesar de toda a crise financeira.

Como se tratava de uma escola técnica, nós tínhamos muitas disciplinas no nosso currículo. Sem exagero nenhum, eram quinze disciplinas, em média. E, dentre essas disciplinas, tínhamos Educação Física, que para nós representava um verdadeiro martírio, em função de os professores serem exigentes ao extremo, bem como pelo horário das aulas.

Pois bem, três vezes por semana éramos despertados pelo guarda do dormitório, quando desfrutávamos do nosso melhor sono, para colocar um calção e enfrentar um frio que girava em torno de quinze graus centígrados, em média. Esse frio, contudo, só era contido quando estávamos no auge dos exercícios físicos. Em contrapartida, terminada a aula, enfrentávamos, sem temor, o banho de chuveiro, com a água quase gelada, e o resto do dia transcorria suave e tranquilo. Assim, ficávamos com bastante energia e disposição para assistir às aulas ao longo do dia.

Falar em Bananeiras, na Escola, nos alunos com suas idiossincrasias, nos seus apelidos etc., tudo isso me transmite uma aura de nostalgia e me faz, por via de consequência, voltar no túnel do tempo, recordando esses bons e maus momentos que lá passei. Na verdade, são tempos idos e vividos, que de repente gostaria de revivê-los, até por que, à época, era adolescente, meio ingênuo e, porque não dizer, sonhador.

De qualquer maneira, os cinco anos durante os quais estudei em Bananeiras, praticamente valeram por cinquenta, em face da lição de vida que lá aprendi, o que para mim foi deveras decisivo para a minha formação profissional. Afinal de contas, o Colégio Agrícola de Bananeiras se destacou em preparar um sem-número de bons profissionais, que se projetaram em todas as áreas de atividades, o que fez com que o educandário ficasse reconhecido nacionalmente.

Vale lembrar, enfim, que o Colégio Agrícola Vidal de Negreiros hoje faz parte do Campus IV da Universidade Federal da Paraíba. Dessa forma, além do curso técnico, existe curso superior. Essa transformação aconteceu na década de 1980.

Só não sei dizer se a qualidade de ensino e a motivação dos alunos são as mesmas dos meus tempos de Colégio Agrícola Vidal de Negreiros…

  • • Aderson Machado é Engenheiro Civil e Bacharel em Letras
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